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Produzindo nossos espelhos

Jandira Maria Pedrollo, arquiteta e urbanista, ex-diretora de Pesquisa e Informação do IPDU Cuiabá, ex-diretora de planejamento metropolitano da Agem e membro da AAU-MT, [email protected]
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A cada final de ano, aparecem imagens das praias mais badaladas do país, abarrotadas de plásticos e outras coisas totalmente desnecessárias, resultado dos festejos do início do novo ciclo.

Nas áreas urbanas brasileiras são geradas diariamente 220 mil de toneladas de lixo, desses, 92% são coletados. Do coletado 60% vai para aterros sanitários; e 40% descartados em aterros inadequados ou, terrenos baldios e corpos hídricos próximos das cidades, acarretando prejuízos ambientais e à saúde pública.

Nas últimas décadas, temos falado muito sobre o excesso de lixo produzido e despejado em todo planeta. Existe uma necessidade da deposição adequada para que esse resíduo possa ser reaproveitado ou reciclado, o que considero uma ação paliativa, haja vista a urgente necessidade de mudança de hábitos.

De que “mudança” me refiro? A princípio, sobre o conceito de vida e da nossa relação com o consumo. Temos que olhar para o que realmente nos interessa e com isso deixar de ser massa consumidora de mercadorias. Por que comprar tantas “coisas” que por vezes duram dias ou horas? Qual o sentido nisso?

Desde os anos 1990, a política dos 3R’s é ensinada nas escolas com o objetivo de estimular o consumo sustentável. O primeiro “R” é justamente reduzir, só depois vêm reutilizar e reciclar. Mas não adianta a escola trabalhar esses conceitos se as mídias (incluo as plataformas digitais) e a família agirem no sentido inverso.

Os pais talvez não se deram conta: as nossas crianças desde o berço são bombardeadas por mensagens que reforçam a necessidade de ter uma infinidade de produtos e serviços: para estar moda, ser aceito, ser feliz e/ou estar em “destaque”, afinal, consumir também é sinônimo de poder.

Enquanto isso, acompanhamos a produção diária de toneladas de lixo. Há um discurso falacioso afirmando que essa produção “não pode ser reprimida”, pois afetaria a economia do país, que vive de impostos cobrados sobre a circulação de bens, mercadorias e serviços, importações e exportações. Então, me pergunto, a que preço? O planeta aguentará essa lógica econômica?

Além do excessivo consumo de supérfluos degradantes ao ambiente, a grande maioria dos produtos que se acumulam nos lixões são “made in (…)”, ou seja, não foram produzidos no Brasil, portanto, não agregam empregos aos cidadãos brasileiros. É incompreensível que uma presilha de cabelo vinda de tão distante seja mais “em conta” que as fabricadas localmente.

Hoje, o Brasil ajuda outros países a “se livrar” de seus lixos ao mesmo tempo em que “exporta empregos”. Em suma, aumentamos a nossa pegada ambiental com o excessivo consumo; importamos o lixo reciclado travestido de brinquedos, bijuterias e outras manufaturas produzidas a quilômetros de distância sem promover empregos verdes aqui.

Nosso país dispõe de matéria-prima (resíduos sólidos) e tecnologia para reciclar e fabricar produtos diversos com a nossa própria força de trabalho, a exemplo a reciclagem de alumínio que é altamente rentável. Por que não criamos esses empregos aos cidadãos que se encontram desamparados e desesperados?

Sabe-se que o maior número de consumidores e com maior poder aquisitivo está nas grandes cidades brasileiras. Porém, nelas também está um contingente de miseráveis que poderia ser beneficiado com uma política econômica voltada ao social e ambiental.

Ganham empresários locais, maiores geradores de empregos, e também as cooperativas de catadores. No embalo aumentamos a vida útil dos aterros e contribuímos com a melhoria da qualidade de vida no campo e nas cidades.

O país se orgulha de ser um grande exportador de produtos do agronegócio, tem mercadorias bastante valiosas, mas importa quinquilharia. Já passou da hora de quebrarmos um ciclo vicioso que vem desde o descobrimento do Brasil, de trocar mercadorias nobres por espelhinhos, concorda?

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