Desde o mês de junho os candidatos e partidos políticos vêm sendo alertados de que os detentores de vida pregressa constitucionalmente não recomendável (art. 14, §9º, CF/88) para administrar a res pública sofreriam a negação do ius honorum.
Trocando em miúdos. A vida pregressa (antecedentes, comportamentos, processos judiciais a que respondem) impediria o acesso ao registro das candidaturas.
Pagaram prá ver. Mas a ‘conta’ é ainda mais cara.
Expliquemos.
Diz o Código Eleitoral, uma lei antiga, que todo político devia saber de ‘cor e salteado’, lá no artigo 224, que nula é a eleição quando os votos imprestáveis atingirem mais da metade do sufrágio. O artigo 175, §3º do CE é mais radical, e merece transcrição: “Serão nulos, para todos os efeitos, os votos dados a candidatos inelegíveis ou não registrados.”
Ora, ora.
Vende-se uma ilusão ao distinto público e aos candidatos ficha limpa (companheiros de chapa), a de que o ‘ficha suja’, por ser puxador de votos auxilie os colegas a ‘fazer legenda’, mesmo que não consigam manter o seu registro de candidato. A lei diz que esses votos não valem.
O julgamento em questão, que emprestou inelegibilidade superveniente a José Riva, não é acobertado pelo artigo 10, parágrafo 11 da Lei 9.504. Esse dispositivo foi revogado. Tem existência, validade, mas não gera eficácia (efeitos) no mundo jurídico. Poderia até ser um caso Não se trata exatamente de conflito de leis no tempo.
É aplicável ao caso em tela a lição do Professor da USP e Ministro do Supremo Tribunal Federal Eros Grau para quem “a interpretação das leis é na verdade uma prudência, é o saber prático, a phronesis, a que se refere Aristóteles” (GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito. São Paulo: Malheiros Editores, 3a Ed, 2005, p. 35). Fazendo hermenêutica (interpretação teleológica) sob a ótica da LCC (Lei de Introdução ao Código Civil) temos que a Lei Complementar 135 (Ficha Limpa) prevalece sobre a Lei geral (Lei 9.504/97). É caso de lei posterior que derroga a anterior (art. 2º, §1º) e aplicação do princípio da especialidade (art. 2º, §2º) ou ‘lex specialis derrogat generalis’, ambos previstos no Decreto Lei 4657/42.
O artigo 1º, I, ‘d’ da Lei Complementar 64/90 (Lei das Inelegibilidades) dispõe que são inelegíveis “os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes; (Redação dada pela Lei Complementar nº 135, de 2010)”.
Isso obriga dizer que o candidato condenado por órgão colegiado fica fora da eleição na qual participa e permanece ‘na lona’ (ou no limbo) por oito anos. Isso se encaixa como uma luva no caso em apreço (José Riva), por mais que a assessoria (de imprensa e jurídica) grite em sentido diverso. É o jus espernandi, que a todos assiste, como ‘direito subjetivo’.
Pode até ser concedida uma liminar autorizativa no pedido de registro (decisão precária), mas o ‘gatilho’ obriga o TSE a julgar o recurso (contra essa cassação unânime) antes do final das eleições.
Alguém mais quer pagar pra ver?
*Vilson Nery e Antonio Cavalcante Filho são militantes do MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral) Comitê de Mato Grosso.