Já houve um tempo, me disseram, em que se pensava e depois se agia a favor do bem comum da maioria do povo, e não se discutia o quanto estava sendo desviado, pois acreditavam piamente que tudo era pelos interesses reais da Nação e ninguém ousaria desviar algo, vigiado por todos.
Hoje, entre o processo de discussão e a tomada de decisão quase nunca tangencia-se o bem público… É apenas um detalhe para se justificar todas as outras ações. Neste processo o principal peso na balança é dado pelos grupos econômicos instalados nas fechadas e seletas salas do poder, sem diálogo social sistemático, sendo utilizadas como subsidiárias dos interesses das salas privativas dos grupos empresariais.
No processo de construção das ações da Copa 2014 em Cuiabá, objetivou-se legitimar cada uma das ações (como a construção da ARENA VERDÃO e até das inapropriadas como a pretensão de realizar patrulha na fronteira com ‘Land Rovers" superestimadas), em nome de um legado que marcaria nossas vidas.
O tema principal em debate, aquele que ocuparia o foco das atenções como o maior legado da Copa é o modal de transporte a integrar os municípios de Cuiabá e Várzea Grande, que consiste em um bonde elétrico deslocando-se sobre 22 Km de trilhos a uma velocidade média de 25 Km/h, transportando no horário de pico 600 pessoas por composição.
Supondo que absolutamente tudo dê certo, e que Nosso Senhor Bom Jesus de Cuiabá esteja atento e continue olhando por nós, teremos em Junho de 2014 um modal de transporte que precisará desde ontem do seu detalhamento para a OPERAÇÃO na nossa Região Metropolitana (que só existe no papel), com uma INTEGRAÇÃO física, operacional e tarifária em todas as possibilidades de mobilidade urbana, que vão desde a calçada para o pedestre e pessoas com deficiência chegarem as estações do VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), passando pelas ciclovias, e principalmente pelo sistema de ônibus e vans alternativas, que deveriam ser complementares e não concorrentes. Talvez por esta ausência de planejamento estratégico é que a AGECOPA tenha sido extinta e a SECOPA se encontre acéfala até hoje, pois ninguém fica na direção.
Construir o novo não é fácil, usar o novo menos ainda. Necessita-se conquistar a população pela viabilidade econômica também, para o uso do VLT, ou pode-se transformar em um quixotesco elefante branco em que as futuras gerações farão referências a este período como fruto de uma ‘aventura bilionária".
Operacionalizar um sistema de transporte que sequer existe na atualidade, com regras definidas pela Região Metropolitana não será fácil, responder e bancar as questões dos subsídios ao transporte público não é tarefa bem quista entre os gestores de plantão, que terão de explicar porque o esforço arrecadador de todo Mato Grosso será usado para subsidiar a operação de transporte na Capital.
Existem pesquisas regionais apropriadas ao tema, da nossa UFMT, em que os principais fatores para o usuário do transporte coletivo decidir pelo modal de transporte (incluindo aí deixar o veículo particular em casa para pegar o VLT), são: tempo de viagem, comodidade, e valor da passagem. Ou então, o modal de transporte não será utilizado pela população. E imaginem só, algo que trafega a 25 Km/h, passando por 22 estações, muitas a menos de 600 metros uma da outra, com valor de passagem bem superior ao de ônibus, ou ao do seu deslocamento com veículo próprio, não seria um absurdo?
Mas pensando bem, se não temos projetos, se não temos licitação aberta, se não temos todo o dinheiro para contratar, se não temos tempo para iniciar e concluir mais obras viárias para a Copa 2014, então que renovemos nossas esperanças e sejamos triunfantes para construir um grande legado, então, que edifiquemos um mega Hospital e um Centro Educacional na nova Beira Rio (prolongamento), em região de influência direta da Arena Verdão, pra dizer ao mundo que temos sim um projeto regional e que o legado integra Cuiabá e Várzea Grande unidas pelo rio Cuiabá, despertando serviços públicos essenciais… Que venha com o Hospital a saúde que precisamos, que venha coma a Escola a educação libertadora e transformadora.
Perguntaram-me porque, desde maio de 2009, pouco avançamos na construção de legados… Pois, pela maneira como está sendo construído é intangível, aquilo não se pode tocar ou dispor, pois abstrato.
Ah, e quando me disseram que naquele tempo haviam forças nacionalistas que construíam o bem comum, enfatizou-se que estes eram os Estadistas. Qualidade ausente no poder decisório atual.
Archimedes Lima Neto – engenheiro, Prof. Mestre em Educação e Meio Ambiente, Ambientalista