‘Periga’ me caçarem a cidadania brasileira se disser que não gosto do carnaval. O que é parte verdade. Mas, parte é mentira. Hoje, gosto menos, concordo. Não sei se é pela idade ou por ter atingido níveis de hormônios devidamente ajustados. Seja como for, já gostei muito. Muito mesmo.
Houve épocas, em que tudo girava em torno da folia. Guri ainda, lembro que fazíamos camisetas com tintas guache e outros congêneres. Tempo de matinês. Tempo em que vendiam bebidas alcoólicas para menores e que carnaval era entrar abraçado com as meninas na ciranda de marchinhas. Alalaô-ooô-ooô. Tempo bom.
Depois vieram os blocos de salão. As cinco noites incansáveis e insaciáveis. Da folia para o trabalho. Só o tempo de tirar o confete do cabelo e a serpentina de trás da orelha. A bebedeira era visível e indisfarçável. Mas era carnaval. Tudo se justificava. Tudo era perdoado. Tudo era… carnaval.
No carnaval dá para escolher a idade que quiser. Bom, sempre, é ter mais que dezoito. Exceto se a polícia pegar. No carnaval você é quem você bem entende. Seja lá quem for. Você pode vestir suas fantasias – literalmente – sem se preocupar com os outros.
Romances relâmpagos, bebedeiras homéricas, danças epilépticas, rituais grotescos, coreografias circenses, roupas indescritíveis. Pouco importava o outro. O que importava era eu. Os meus desejos. As minhas vontades. Nada me era proibido, pois, tudo era carnaval.
Era. Exatamente: Era! Sempre chega o dia em que a folia não é o suficiente, aquilo cansa. Tudo perde a graça. Os romances, as bebedeiras, as danças, tudo. Tudo não é mais como antes. Não sacia. Não basta. Não se pode sambar para sempre, este é o ponto.
Percebi, enfim, que não gostava tanto assim do carnaval. Fosse porque eu precisasse de algo a mais para justificar minha miserável existência ou, simplesmente, porque eu não agüentava mais aquelas repetitivas marchinhas. Pode escolher a desculpa que você preferir. Mas a verdade é única, geral e unisex: chega um determinado momento na vida – não importa a idade, pode ser aos 16 ou aos 46 – em que tudo o que a gente quer é um amor. Simples assim. Não queremos mais aquela sandice, aquela orgia, aquela insensatez, aquela camiseta molhada de suor e cerveja, aquele amontoado de corpos expostos – tudo bem, podemos até querer, mas sabemos que nada daquilo vai nos saciar.
Minha hora chegou quando eu tinha um pouco mais de vinte anos. Véspera de carnaval e eu não estava animando nenhum bloco. Nem, ao menos, estava inscrito em algum deles. Estava alegre e feliz como sempre. Só que, desta vez, não foi porque iria brincar o carnaval, mas, porque quem eu queria estava comigo. Era o que importava.
E, como em um passe de mágica, daquele ano em diante, nunca mais pulei o carnaval. E, sinceramente, torço para não mais pular. Quem sabe ainda brinque um pouco, quando for levar meus filhos para uma matinê onde, embora não vendam mais bebidas a menores, certamente haverá jovens se abraçando lado a lado no salão, ao som das imortais marchinhas, naquela nostálgica e imortal centrífuga-humana-gigante, repletos emoções e alegrias. Quem sabe?
Mauro Luiz Fortuna
Funcionário Público Municipal de Sinop