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Manteiga derretida

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Menino de calças curtas, eu era mais escandaloso que chorão. Diante de injeção, mertiolate e as surras de minha mãe, eu abria o berreiro e o bairro todo tomava conhecimento que alguma coisa anormal estava acontecendo em minha casa.

Bem, verdade seja dita, eu apanhar de minha mãe não era nada anormal. Sempre fiz por merecer.

Não chorava quando era surrado por algum marmanjo maior e nem quando alguém me acertava uma canelada no futebol. Nem se sangrasse eu chorava.

Uma vez, meu avô me disse que se eu sentisse alguma dor, devia berrar mesmo. Pra dor passar mais depressa e eu penso que este foi um dos melhores ensinamentos que tive na vida. Agir feito porco na hora de virar torresmo e lingüiça.

Pena que seja ineficaz contra dor-de-cotovelo.

De verdade, chorei aos treze anos. Quando ele, meu avô, morreu. Os braços fortes de meu pai não foram suficientes para aplacar a minha dor. Inconscientemente, eu soube que ainda não havia aprendido tudo o que aquele velho crioulo tinha para me ensinar.

Adulto, virei uma manteiga derretida. Nem vejo mais as sessões da tarde. Por isso, prefiro ir ao cinema sozinho. Dependendo do filme, quando as luzes se acendem, ninguém nota meus olhos inchados.

Dores e felicidades alheias, ódio, raiva, conquistas e impotências, antigas canções de Milton Nascimento, motivos me sobram para manter desobstruídos os canais lacrimais.

O último foi uma reportagem sobre exploração de trabalho infantil, onde uma menininha de uns oito ou nove anos, feição resignada, falou que tudo o que ela mais queria na vida era brincar e ir à escola.

Ô vontade danada que me deu de sair por aí, estapeando focinhos e chutando traseiros, sô…!

Diorindo Lopes Júnior é jornalista e autor de Cesta de 3 e O Sol em Capricórnio

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