Essa semana o Brasil assistiu a um fato inédito em sua história. Uma das maiores empresas do país, com faturamento anual de bilhões de reais, veio a público pedir desculpas ao povo brasileiro. Pilhada pela Operação Lava-Jato em múltiplos atos de corrupção ativa, a empreiteira Andrade Gutierrez publicou anúncio nos principais jornais do país com um 'sincero pedido de desculpas', reconhecendo que cometeu erros graves e se comprometendo a não repeti-los.
A empresa também prometeu devolver um bilhão de reais aos cofres públicos, o que certamente não representa todo o lucro sujo obtido com o festival de desmandos, incompetência e pilhagem que marcou os últimos anos do governo federal. Como o próprio documento reconhece, um pedido de desculpas, por si só, não basta, sendo necessário que esteja acompanhado de medidas efetivas de colaboração com as investigações em curso e da mudança de atitudes e práticas.
De qualquer forma, compelida pelo Ministério Público e pela Justiça Federal, a empresa assumiu seus erros, ao invés de negá-los, como é da pior tradição das elites empresariais e políticas. Ponto para ela, mas registro que não é o suficiente. No Brasil sobram culpas e faltam desculpas.
É necessário que as outras empreiteiras do petróleo e das obras da Copa também peçam desculpas e devolvam parte do butim.
É necessário que a mineradora Samarco peça desculpas pelas vidas humanas que vitimou e pela tragédia ambiental que provocou por sua negligência e ganância. A empresa tem gasto muito mais em propaganda que na indenização às vítimas e na recuperação dos passivos ambientais.
É necessário que a indústria do tabaco peça desculpas pelas dezenas de milhares de novas vítimas anualmente: câncer de pulmão, enfisema, infartos etc. Em vez disso, investem fortunas em marketing agressivo junto a crianças e adolescentes, produzindo cigarros com sabor de menta e posicionando-os nos pontos de venda junto a chocolates, pirulitos e guloseimas. Outras fortunas são gastas em lobbies parlamentares, jurídicos e administrativos para manter essa indústria da morte e do sofrimento.
É necessário que as empresas de telemarketing a serviço de bancos, operadoras de telefonia, cartões de crédito etc. peçam desculpas pelas dezenas de milhões de ligações indesejadas e não solicitadas que invadem a privacidade das pessoas, perturbando-os no seu horário de trabalho, de estudos ou de descanso.
É necessário que os marqueteiros eleitorais, muitos deles regiamente remunerados por esquemas de caixa dois, peçam desculpas pelas mentiras produzidas e massificadas durante a última campanha.
É necessário que os responsáveis pela contabilidade destrutiva peçam desculpas pela desorganização das contas públicas, pelas fraudes contábeis e orçamentárias, pela irresponsabilidade fiscal e pelos seus efeitos devastadores na economia nacional.
É necessário que as autoridades que nomearam os diretores corruptos que destruíram a Petrobras peçam desculpas pelo prejuízo causado aos acionistas, empregados, aposentados, pensionistas, fornecedores e a todos os brasileiros.
É necessário que peçam desculpas pela maior recessão econômica de nossa história e pela volta da inflação, maior inimiga dos assalariados.
É necessário que peçam desculpas pelos onze milhões de desempregados, pelas dezenas de milhares de empresas fechadas, pelos incontáveis sonhos destruídos.
É necessário que peçam desculpas pela desmoralização do Brasil perante o mundo e pela falta de respeito e de pudor no exercício de suas funções.
Duvido que o façam. Para pedir desculpas, é preciso engolir o orgulho, admitir as falhas e assumir as consequências. À maioria dos citados acima falta grandeza d'alma, espírito público e amor ao próximo. Sobram-lhes cupidez, soberba e apego ao poder. No primeiro livro da Divina Comédia, Dante Alighieri descreveu o futuro que lhes aguarda. Ficamos, por enquanto, com as desculpas da Andrade Gutierrez. É um começo.
Luiz Henrique Lima – auditor Substituto de Conselheiro do TCE-MT – Graduado em Ciências Econômicas, Especialização em Finanças Corporativas, Mestrado e Doutorado em Planejamento Ambiental, Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia.