“O maior problema de toda arte
é produzir, por aparências,
a ilusão de uma realidade mais grandiosa”.
(Johann Wolfgang von Goethe)
Ao completar 75 anos, a Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso prestou homenagens aos ex-presidentes Salvador Pompeu de Barros Filho, Milton Armando Pompeu de Barros, Agnelo Bezerra Neto, Djalma Metello.Duarte Caldas, Amaral Augusto da Silva, Aníbal Pinheiro da Silva, Munir Feguri, Benedito Flaviano de Souza, José Simioni, Renato Gomes Nery, Rubens de Oliveira Santos Filho, Maria Helena Gargaglione Povoas e Ussiel Tavares da Silva Filho. Homens que, ao seu tempo, foram à luta e podem ser classificados dignos da vida. Personagens vivos de um ideal humano, a liberdade.
Como eles, outros personagens importantes da história da OAB merece todo o nosso respeito e consideração. Salvador Celso de Albuquerque, primeiro presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, no período de 1933 a 1935. Depois vieram Benjamin Duarte Monteiro, de 1935-1937; Ernesto Pereira Borges, de 1937-1939; Oscar Correa Pina, entre 1939-1955; Frederico Vaz Figueiredo, de 1955 a1957; Hélio Pimenta Ribeiro, entre 1957 e 1959; Gervásio Pereira Leite, de 1961 a 1963; e Alcedino Pedroso da Silva, de 1965 e 1967, todos já falecidos, mas que, com honra, souberam dignificar a classe dos advogados.
Como esses, Sebastião de Oliveira, o doutor Paraná, pai do também já falecido Dante Martins de Oliveira, a quem o Brasil muito deve pela luta recente da democratização nacional. “Doutor Paraná” presidiu esta Ordem entre 1971 e 1973. Depois dele, veio Agenor Ferreira Leão, que ficou até 79 e, ainda, Benedito Santana Silva Freire, o grande poeta, advogado, romancista, o nosso Silva Freite, imortal, que neste ano, em setembro, homenagearemos.
Nestes 75 anos, a Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso jamais se curvou. Graças à coragem e arrojo desses homens. É verdade que precisamos estar vigilantes para o alerta sobre a construção de uma realidade mais grandiosa. No entanto, também temos que ter, por outro lado, a mais absoluta clareza de que essas pessoas – muitas já falecidas, outras aqui presentes e vivas na história – foram titânicas na defesa dos interesses dessa classe, foram fortes na luta contra aqueles que insistem em sufocar o mais elementar de todos os princípios humanos, qual seja, a de se ter defesa constituída.
É verdade que por alguns anos o chumbo pesou. Muitos desses homens choraram pela necessidade de ter que dar um passo atrás para seguir dois à frente. Muitos dos homenageados derramaram no escuro dos porões da ditadura militar lágrimas de revolta e de dor. Afinal, nos anos negros que o Brasil viveu na era totalitária e ditatorial de Getúlio Vargas e depois na rotatividade do militarismo brutal e sufocante no poder, o povo padecia nas ruas, caminhava de cabeça baixa e tinha o grito de liberdade preso na garganta. Contudo, esta casa de 75 anos nunca deixou de ser democrática e de luta, de respeito. Esta Ordem, chamada de “Casa das Liberdades Democráticas”, soube dar a volta por cima e enfrentar com inteligência as baionetas.
De Salvador Celso Albuquerque a Ussiel Tavares da Silva, esta Ordem nunca parou no tempo, jamais se debruçou nos louros das vitórias. A cada dia, um novo desafio nos faz revigorar o desejo de lutar pela construção de uma sociedade cada vez mais justa e fraterna, em defesa dos ideais da democracia e da liberdade.
Verdade que hoje não há mais golpes de estado, não temos mais porões e nem DOI-CODI. Mas, certamente, a liberdade e a democracia, primores do sonho humano, são usadas de forma inadequada. Nesse ambiente de voto direto, de liberdade de expressão, estamos vendo nossa sociedade se embrenhar por caminhos escuros e aterrorizantes. A corrupção está banalizada, assim como a violência. O Estado, corroído pelos interesses espúrios, cede cada vez mais espaço para uma máquina monetária, onde o lucro é a alma do negócio. Pagamos impostos, muitos impostos, e não temos saúde adequada para o povo, não temos segurança e não temos educação.
Tenho que admitir: uma vergonha ver o ensino que se pratica atualmente nas universidades. Aqui em nosso Mato Grosso, um quadro mais estarrecedor: último colocado em aprovação no Exame de Ordem Unificado nos faz perder mais alguns fios de cabelos. É lamentável abrir jornais e ser obrigado a ler que o nosso Judiciário, o poder de todos os poderes, aquele que é mediador, o responsável pelo equilíbrio da sociedade, seja palco de tantas agressões ao Direito perfeito, com denúncias de malversação de dinheiro público, desvio, desleixo e por ai afora. Estamos atônitos.
A corrupção do Estado, que se enfraqueceu, deu lugar ao estado paralelo do crime organizado. Nosso homem público tem fraquejado no cumprimento de suas obrigações. Nossos legisladores, com algumas exceções, são verdadeiras “vacas de presídio” de um exercício de poder danificado pela necessidade de auto-afirmação e perpetuação. Político hoje, infelizmente, virou raça pelo prisma do pejorativo.
Mas não vamos abaixar a cabeça. A defesa das instituições democráticas faz parte do arcabouço de responsabilidade desta Ordem dos Advogados do Brasil. Não vamos ceder, não vamos esmorecer, não vamos jamais transigir dos nossos ideais. Estamos, como naqueles anos de chumbo e exceção, na resistência. Sabemos que, por vezes, os interesses da política de Ordem ameaçam nossa unidade. Contudo, temos a clareza de que não quedaremos. A história de Salvador Albuquerque a Ussiel Tavares, nos torna responsáveis por uma Ordem cada vez mais combativa, de lutas, aguerrida, sem temor, pela construção do Estado Democrático de Direito.
Francisco Faiad é presidente da Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso