A Advocacia-Geral da União (AGU) apresentou manifestação ao Supremo Tribunal Federal pela inconstitucionalidade da lei do estado de Mato Grosso que restringe a pesca no estado por um período de cinco anos, batizada como Lei do Transporte Zero. A manifestação foi apresentada no âmbito de uma ação movida pelo partido MDB contra a legislação estadual, que proíbe o transporte, comércio e armazenamento de peixes dos rios estaduais pelo período de cinco anos, a partir do dia 1º de janeiro de 2024.
A AGU sustenta no processo que, ao propor restrições desproporcionais em prejuízo dos pescadores, a lei estadual afronta os princípios da dignidade da pessoa humana, da liberdade do exercício profissional e do exercício dos direitos culturais. Informações encaminhadas à AGU pelo Ministério da Pesca e Aquicultura para subsidiar a manifestação ao STF assinalam, por exemplo, que a proibição de pesca comercial no estado por um período de cinco anos pode acarretar impactos significativos nos aspectos socioeconômicos da região, especialmente à categoria dos pescadores artesanais.
A AGU também alerta na manifestação que a lei estadual afronta norma federal já existente sobre políticas públicas de pesca, invadindo a competência da União para legislar sobre aspectos gerais relativos ao tema. Segundo a Advocacia-Geral da União, a norma contraria a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Atividade Pesqueira (Lei federal 11.959/2009), sobretudo a determinação legal de que “o ordenamento pesqueiro deve considerar as peculiaridades e as necessidades dos pescadores artesanais, de subsistência e da aquicultura familiar, visando a garantir sua permanência e sua continuidade”.
Por fim, a AGU destaca que não foram demonstradas evidências científicas sobre eventual diminuição dos estoques pesqueiros no estado que pudessem justificar a imposição das medidas. “Como se percebe, a lei estadual impugnada, ao impor restrições desproporcionais aos direitos fundamentais dos pescadores, compromete o âmago de sua dignidade, e quiçá sua própria existência, o que constitui razão suficiente para o reconhecimento da sua inconstitucionalidade”, conclui a AGU na manifestação.
Conforme a lei, que visa combater a pesca predatória nos rios, segue permitida pesca de subsistência para povos indígenas, originários e quilombolas, bem como a captura de peixes às margens dos rios destinada ao consumo no local, subsistência ou a compra e venda de iscas vivas que se enquadrem na legislação. Também estão liberadas a modalidade pesque e solte, da pesca esportiva, que tem como regra a devolução do peixe ao rio, com exceção dos meses de vigência da piracema, em que todo tipo de pesca é proibido, e a modalidade pesque e pague, desde que o estabelecimento faça a emissão da nota fiscal dos peixes que serão transportados e armazenados pelo pescador.
Durante três anos, o Estado pagará auxílio de um salário-mínimo por mês para pescadores profissionais e artesanais inscritos no Registro Estadual de Pescadores Profissionais (Repesca) e no Registro Geral de Pesca (RGP) que comprovem residência fixa em Mato Grosso e que a pesca artesanal era sua profissão exclusiva e principal meio de subsistência até a lei entrar em vigor.
O auxílio não será pago nos meses de piracema, considerando que os beneficiários já são atendidos pela Lei Federal. O governo estadual declarou também que vai promover a inserção dos pescadores em programas de qualificação da Secretaria de Estado de Assistência Social e Cidadania para o turismo ecológico e pesqueiro, e de produção sustentável da aquicultura.
A lei ainda prevê a instituição de uma linha de financiamento, por meio da agência de fomento Desenvolve MT, destinada aos pescadores beneficiados com o auxílio financeiro do Transporte Zero.