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Queremos votar

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Há 50 anos, precisamente em 19 de março de 1964, na cidade de São Paulo, acontecia a Marcha da Família com Deus Pela Liberdade. Estima-se que cerca de 200 mil pessoas marcharam da praça da República à praça da Sé. Pediam a intervenção dos militares para a destituição, pela força, do governo constitucional do presidente João Goulart.

A classe média temia a “ameaça comunista”. O mundo vivia o auge da Guerra Fria, em que os Estados Unidos da América liderava o bloco capitalista e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas liderava o bloco comunista. Pairava no ar a ameaça de uma terceira guerra mundial, agora com as grandes potências na posse de bombas nucleares.

Essa polarização capitalismo (EUA) – comunismo (URSS) atingiu todos os países. No Brasil, dizia-se que o governo constitucional do presidente João Goulart (Jango) era de tendência comunista, daí porque os militares, atendendo aos clamores da classe média, expostos na Marcha da Família com Deus Pela Liberdade, tomaram de assalto o governo legítimo de Jango.

A partir de 1º de abril de 1964 – por ironia o dia da mentira – os militares instituíram uma ditadura militar que durou de 1964 a 1985. Redemocratizado o país, não é que ocorreu, 50 anos depois, em um contexto interno e externo muito diverso, uma nova Marcha da Família com Deus Pela Liberdade, conforme amplamente noticiado pela imprensa nacional no decorrer destes dias.

Os modernos defensores de uma nova intervenção no governo foram para as ruas em São Paulo, no domingo, dia 22 de março de 2014. Sua ideia: os militares tomam o poder, acabam com a bagunça, promovem uma faxina moral e depois saem de cena. Parece que a ideia não seduziu muito, pois foi noticiado pelas mídias que menos de 500 pessoas participaram do ato.

Quanta insanidade! Fica a impressão que a elite burguesa deste país está a assinalar sua incompetência em não encontrar uma alternativa eleitoral viável para derrotar o bolsa família nas urnas e resolveu agora fazer “terrorismo” com a sociedade brasileira, tentando vender a ideia de que, por estar o meio político corrompido, somente os militares poderão nos salvar da corrupção.

É óbvio que o Brasil precisa livrar-se da corrupção, em seu sentido amplo, isto é, tanto no poder público quanto na vida privada. Também é fora de questão que nossas instituições
públicas estão corrompidas e que o povo brasileiro já está cansado de ser feito de otário pelos ocupantes dos altos cargos da República, mas ditadura militar será solução para esses problemas?

Os organizadores desta moderna Marcha da Família com Deus Pela Liberdade, que estão defendendo uma nova intervenção militar no governo e a tomada do poder político pelo uso da força dos canhões e dos tanques de guerra, não têm o direito de dizer que o povo brasileiro é incapaz de mudar a realidade política e social da pátria amada com o poder do voto.

Aliás, eles tampouco têm o direito de jogar no lixo nossas conquistas históricas.

A nosso ver, os brasileiros não querem um regime autoritário, que se imponha pela força e que torture e mate seus “inimigos”, desaparecendo com os corpos. Não querem um regime que tire do artista a voz e a palavra, calando-os a todos, e que expulse da pátria os intelectuais desafinados com a ideologia do establishment.

Argumenta-se que o Brasil caminha para se tornar a nova Venezuela da América Latina. Pois bem! Que se prove, então, as teorias conspiratórias. Porque, até onde se sabe, os governantes que vêm exercendo o poder em nosso país desde 1989 foram eleitos pelo povo e exerceram seus mandatos dentro do que preconiza a Constituição Federal de 1988.

Assim, ainda que se demore mais 30, 60 ou 90 anos para aprendermos selecionar melhor nossos representantes políticos, extirpando da vida pública os vigaristas e aproveitadores,
que sobrevivem politicamente do populismo e da demagogia, de uma coisa o povo brasileiro parece estar bem convicto: ditadura nunca mais, nem de esquerda nem de direita, queremos é votar.

Estamos, neste ponto, afinados com o discurso do estadista britânico Winston Churchil: "A democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos". Portanto, para os que pretendem alcançar o poder em nosso país, é melhor que encontrem um discurso mais criativo, pois golpe de estado, realmente…

É essa nossa modesta opinião sobre as novas ideias golpistas.

Jorge Damante Pereira – promotor de Justiça de Canarana

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