Principal jornal do Amazonas, “A Crítica” publicou, em novembro, reportagem extremamente esclarecedora (e até perturbadora) sobre a utilização cada vez maior de veículos de Comunicação como instrumentos de campanha político-eleitoral. Casos específicos do rádio e da TV.
Segundo o levantamento, até este mês, estarão no comando de programas de rádio e televisão 25% dos 74 políticos com mandatos na Câmara de Manaus, na Assembléia, no Congresso e no Governo do Estado. Hoje, esses políticos são apresentadores de programas nesses dois veículos, principais meios de comunicação de massa.
Em Mato Grosso – especificamente em Cuiabá -, o principal meio de comunicação utilizado como palanque é a TV. Diariamente, em algumas das principais emissoras, o telespectador é brindado com programas “populares”, geralmente, em horário nobre (entre 11h e meio-dia). Para quem gosta, é um excelente acompanhamento na hora do almoço. Com o risco, claro, de ter uma indigestão.
Exceção feita à TV Centro América – que, como afiliada da Rede Globo, resiste ao formato e tenta seguir os famosos padrões globais de qualidade -, as demais emissoras não oferecem o mínimo de qualidade em matéria de programação nessa faixa de horário. A falta de opção para o telespectador é tanta, que, se por ventura ele evitar, digamos, a TV Brasil Oeste (Band/8), onde o deputado Sérgio Ricardo (PPS) faz campanha eleitoral explícita e abusa do clientelismo (é incrível como esse político acha solução para tudo e assume a paternidade de obras públicas com uma naturalidade incomum) e mudar para a TV Cidade (SBT/12), simplesmente trocou seis por meia-dúzia.
Se fugir do SBT, para evitar o populismo e a campanha eleitoral permanente e não menos explícita – com doses generosas de clientelismo – do vereador Walter Rabello (PMDB), o telespectador escolhe entre se render aos “padrões globais” que impedem sua afiliada de ter programação regional ou aos sermões dos manjados “bispos” da Igreja Universal do Reino de Deus. Essa igreja, por sinal, cuja teologia e atos, posições sociais e morais e métodos de trabalho são duramente criticados tanto por leigos quanto por religiosos de outras linhas, justamente por se envolver direta e abertamente em questões políticas.
Pode o telespectador optar pela Record (Canal 10), que nesse horário mantém em evidência o sangüinolento “Cadeia Neles”, apontado como responsável pela eleição de um deputado estadual (Clóvis Roberto, ex-PSDB e hoje no PPS, numa estranha uma troca de camisa) e um federal (Lino Rossi, que se notabilizou muito mais pela troca de partidos, de acordo com as suas conveniências, do que propriamente pela defesa do povo). Se preferir a TV Rondon (Rede TV!/5), num horário menos nobre (final da tarde), vai dar de cara com o jornalista Maksuês Leite (PDT), que tentou ser prefeito de Várzea Grande e, hoje, sonha com uma vaga na Assembléia Legislativa.
Nada contra os apresentadores, embora alguns deles achem que o fato de atuar no horário nobre e num veiculo poderoso lhes dá o direito de se apresentar aos olhos do público como uma espécie de panacéia; muito menos contra as emissoras que os acolheram, certamente com o objetivo, cada uma a seu modo, de fazer face à concorrência. O problema é que, a cada dia que passa, fica patente que esses programas não foram produzidos para discutir soluções políticas, nem tampouco para resolver os problemas do cotidiano. Na verdade, eles contribuem para que estes problemas continuem mais evidentes.
O alto índice de políticos presentes na mídia, na apresentação de algum tipo de programa, em sua maior parte na linha populista e clientelista, cita o professor-doutor Narciso Júlio Freire Lobo, da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal do Amazonas, torna extremamente frágil o próprio conceito de política quando entendido como meio de inclusão do povo no debate de idéias. Traduzindo: a mídia deixa de ser um espaço para as necessárias discussões coletivas e vira um meio individualizado de propagação de idéias, transformando-se num poderoso palanque político-eleitoral.
Em vez de solução para os problemas do povo, esses programas na TV produzem mandatos e sinecuras. Desconfie quando certas emissoras anunciam mudanças na sua grade de programação, prometendo ampla participação popular.
* Antonio de Souza, jornalista, é consultor de Comunicação da Oficina do Texto – Marketing e Assessoria de Imprensa, em Cuiabá.