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País de faz de conta

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O Brasil finge encontrar soluções para os problemas atacando as conseqüências; quase nunca as causas. É o que se verifica em inúmeros escândalos envolvendo a criminosa manipulação de recursos alocados em orçamentos públicos. No passado, foi amplamente explorado o caso dos “anões do orçamento”, fato que ensejou a criação de uma CPI. Foram execrados alguns culpados e até alguns inocentes (deputado Ibsen Pinheiro foi um destes). Agora, com o caso da “Operação Sanguessugas”, sobre venda de ambulâncias para prefeituras, novamente volta à baila a manipulação do Orçamento da União. De novo vamos atacar conseqüências, pois aqueles que podem decidir não querem resolver.

Pergunta: Qual é a solução? Resposta: Fazer com que as leis orçamentárias tenham caráter impositivo, salvo se frustrada a previsão de arrecadação (o que é raro). A solução é obrigar o Governo, independente de quem inseriu a emenda, a destinar todos os recursos durante o próprio exercício. Teríamos uma lei orçamentária mais planejada e investimentos mais garantidos. Sob pena de denúncia por crime responsabilidade. E, com coragem, punindo como cassação de mandato, demissão de servidores públicos etc. Medidas duras, mas que no curso dos anos nos levariam a relação mais previsível com o poder público.

Atualmente, leis orçamentárias têm caráter autorizativo, ou seja, o Governo (municipal, estadual ou federal) não é rigorosamente obrigado a cumprir os investimentos previstos no orçamento. A execução dessa parte dos orçamentos transforma-se em poder de barganha, em um cenário onde o Executivo manobra como quer o Judiciário e corrompe os integrantes do Legislativo. Aquele que julga e aquele que legisla e fiscaliza são obrigados a esmolar para o executor cumprir o que está na lei. – salvo no caso das despesas correntes. A manipulação começa tão logo a lei orçamentária é aprovada, com os cortes ou contigenciamentos, aplicados sobre os investimentos.

Em nível federal os parlamentares têm direito de inserir emendas no Orçamento da União. Os valores mudam ano a ano. Para 2007 deverá ser algo em torno de R$ 5 milhões por congressista. Cerca de R$ 3 bilhões, considerando ainda as emendas de bancada. Porém, inserir emenda no orçamento não é garantia de liberação. Afinal, ocorreu apenas autorização para aquele investimento.

A liberação do recurso implica em ação política, principalmente de lobistas e empresários que varejam Ministérios e o Congresso. As emendas parlamentares são colocadas nos orçamentos dos Ministérios, mas não é o respectivo titular da pasta quem determina a liberação. Normalmente essa “autorização” depende do ok da Casa Civil, a pasta política do Governo. Portanto, o critério é político, ou seja, verifica-se a forma como o parlamentar está se comportando dentro de plenário. Um investimento numa região, que depende de recurso da União, passa pela submissão do parlamentar ou tristemente pela corrupção.

O parlamentar pulveriza o seu limite de inserção de investimentos no orçamento em várias emendas autorizativas. Assim, consegue atender a diversas cidades ou regiões. Isso é legal, correto, pois cabe ao representante do povo ou dos Estados identificar gargalos onde a visão geral de investimento não atinge ou não consegue vislumbrar demanda. O crime, todavia, é a forma como uns são forçados agir para liberar os recursos ou como alguns preferem atuar para liberar os investimentos.

A ação legislativa e fiscalizativa do congressista acaba sendo subalternada pela de mero negociante de recursos para suas regiões. O Congresso, as Assembléias e Câmaras Legislativas acabam se transformando em balcões de negócios, pois aquilo que foi votado no ano anterior não vale para o seguinte.

Em resumo, nosso sistema orçamentário estimula a promiscuidade. Como alerta Cláudio Abramo, da Ong Transparência Brasil, a ocasião faz o ladrão. Precisamos acabar com essa situação. O difícil é que estamos falando de cultura. Como, por exemplo, compra pública por carta convite. Em todas as áreas é quase cultural empresas combinando preços, ou empresas disputando “licitação” com outras empresas criadas exclusivamente para perder as disputas. É dessa maneira que estamos construindo um país de faz de conta.

* Américo Corrêa é jornalista em Cuiabá

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