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O foro dos privilegiados

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O Brasil assiste neste momento a um vigoroso embate entre parte importante da opinião pública e de segmentos da política nacional, já que os deputados e senadores querem aprovar, a todo custo, a PEC 37 (Projeto de Emenda à Constituição n. 37) que vai reforçar privilégios dos quais os maus políticos têm se valido para se "safar" de punições.

Os parlamentares desejam manter incólumes as suas condutas criminosas, se valer do chamado "foro por prerrogativa de função", entre outros "benefícios", e com a possibilidade de serem investigados (se pegos com a "boca na botija") somente por uma polícia que lhes seja subordinada. Querem distância de inquéritos conduzidos por promotores de justiça, do mesmo modo como o vampiro Edward Cullen (da saga Crepúsculo) foge da luz do sol.

Como se sabe, os parlamentares federais somente podem ser investigados pelo Supremo Tribunal Federal (que não tem tradição em punição) e os seus "colegas" das assembleias legislativas (e câmara do DF) são processados nos respectivos tribunais estaduais. No caso de Mato Grosso a regra vem prevista no art. 29 da Constituição Estadual.

O foro privilegiado é uma herança da colonização portuguesa, que inseriu em nosso sistema jurídico um dispositivo para evitar que "gente de bem" (ou seria de bens?) fosse processada pelo mesmo juiz ou tribunal que recebe as ações contra "pessoas do povo".

O mandato parlamentar e a proteção jurídica (imunidade) que o envolve deveria ser uma garantia de independência para a boa atuação em defesa do povo, mas ao longo do tempo se transformou em mais um escudo para evitar a atuação da justiça. O mandato parlamentar sido utilizado para encobrir a prática de crimes comuns (peculato, tráfico, homicídio e que tais) e evitar a punição dos delinquentes.

O foro por prerrogativa enfrenta sérias críticas com base na morosidade e ineficiência na condenação dos julgados. De acordo com pesquisa realizada pela AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), em vista do benefício de foro os tribunais superiores recebem mais processos contra autoridades do que são capazes de julgar. Apenas 4,6% das ações penais abertas no Supremo Tribunal Federal (STF) desde 1998 foram julgadas. No caso do Superior Tribunal de Justiça (STJ) o índice é ainda menor e fica em torno de 2,2%.

Em 15 anos, dos 130 processos recebidos pelo STF somente seis foram concluídos, todos terminando em absolvição dos réus e 13 prescreveram antes de ir a julgamento. A ainda não concluída Ação Penal 470 (mensalão) pode ser o único caso de aplicação severa da lei pelo STF, somada à punição do deputado Natan Donadon (PMDB/RO), que foi condenado pelo Supremo a 13 anos de "cadeia" por desviar R$ 8 milhões de reais da assembleia legislativa de Rondônia.

No STJ, das 483 ações penais ajuizadas contra autoridades nos últimos 15 anos, somente 16 foram julgadas. Houve 5 condenações e absolvição em 11, sendo que outros 71 processos prescreveram antes do julgamento.

Os processos listados no levantamento da AMB são investigações contra parlamentares, ministros e governadores, que têm direito ao foro privilegiado, previsto na Constituição Federal.

Em grande parte as polícias estaduais têm dificuldade de investigar porque são subordinadas a políticos, que às vezes até usam clandestinamente os serviços de maus agentes policiais para investigar (e grampear) adversários e desafetos. Permitir a livre investigação de crimes cometidos pelos políticos, nem pensar.

Devemos nos lembrar que nas eleições gerais de 2010, em Mato Grosso, a polícia civil de Campo Verde sofreu intervenção direta do Diretor Geral da Polícia Civil estadual, que não queria permitir a livre investigação de crimes cometidos por um certo deputado estadual conhecido pelo título de "rei dos ficha sujas", carinhosa "distinção" oferecida pela Revista Veja.

Deste modo, impedir que o Ministério Público investigue políticos, que é o desejo da PEC 37 (Projeto de Emenda Constitucional n. 37) é um retrocesso maior que a manutenção do "foro dos privilegiados", é um crime contra o futuro de nossos filhos.

Não se duvida que alguns promotores de justiça e procuradores da república pequem em suas atuações, ora por inexperiência, ora por má-fé (preconceitos), mas isso não justifica retirar do Ministério Público os poderes de investigação. Para os casos de exageros (e abusos de alguns) basta deixar nítida a competência do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) para punir os maus promotores e procuradores e extirpá-los do serviço público (demissão).

A sociedade precisa se movimentar e evitar a aprovação da PEC 37, que poderia resultar na completa extinção da atuação dos promotores e procuradores, que estariam autorizados somente a investigar e processar os "ladrões de penosas", deixando livres e impunes os biltres da política nacional.

Antonio Cavalcante Filho e Vilson Nery são ativistas do MCCE (Movimento de Combate à Corrupção eleitoral)

 

 

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