sexta-feira, 26/julho/2024
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As tragédias brasileiras

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Durante os últimos doze dias os grandes meios de comunicação de massa deram uma enorme cobertura para a chacina ocorrida em uma escola do Rio de Janeiro, quando12 crianças, da quais dez meninas; todos adolescentes foram assassinadas. O Brasil inteiro ficou estarrecido ante violência tão brutal. Antes deste episódio também ocorreram outras chacinas, a da Candelária e a do Carandiru, em São Paulo que, posteriormente, acabou sendo implodido, talvez para apagar da memória coletiva essas formas de brutalidade.

São importantes os diversos gestos de solidariedade com as famílias dessas vítimas de violência e extrema crueldade. Todavia, esses são fatos pontuais, por mais trágicos que possam aparentar e fazem parte da escalada da violência que é, sem dúvida, um dos maiores desafios que a sociedade brasileira enfrenta e que muitas vezes nossos governantes parecem ignorar e só aparecem derramando suas lágrimas de crocodilo para manipular a opinião pública e para que o povo possa imaginar que os mesmos estão preocupados com o sofrimento coletivo.

O Site Terra, referindo-se a noticia veiculada pelo jornal o Estado de São Paulo, em 20 de janeiro de 2008, estampava que até final daquele ano o Brasil, segundo dados do DATASUS, que estaria comemorando 30 anos em breve, estaria atingindo a marca estarrecedora de UM MILHÃO DE ASSASSINATOS, no período entre 1978 a 2008. Outra noticia também ao longo desse período chamam a atenção para estatísticas que reforçam a gravidade desta tragédia e menciona que entre 1996 e 2006 o Brasil registrou 465 mil homicídios.

Para refrescar a nossa memória coletiva, entre 1998, último ano do primeiro mandato de FHC até 2010, no final do Governo Lula, ocorreram 628.312 assassinatos no Brasil, sendo que entre 1998 quando foram registrados 41.950 e 2010, quando foram registrados 55.300 assassinatos, segundo as estimativas, já que os dados estatísticos ainda não estão devidamente "fechados", pode-se perceber que os número de homicídios em nosso país cresceu em 31,8%, taxa muito superior ao crescimento demográfico do período.

Esse crescimento da violência representada pelo número e índices de homicídios por 100 mil habitantes podem ser comprovados também pelos dados do IBGE relativos ao período de 1992 a 2007. A taxa de mortalidade por assassinato entre homens passou de 35,6 por 100 mil habitantes em 1992 para 47,7 em 2007, enquanto a de mulheres passou de 3,2 assassinatos por 100 mil habitantes para 3,9. Como podemos perceber as mulheres têm uma participação muito reduzida nas estatísticas de assassinatos, apesar de sofrerem vários outros tipos de violência, inclusive a doméstica. Assim, a taxa média geral por 100 mil habitantes mascara um pouco a realidade. Passou de 19,2 para 25,4. Todavia, o crescimento dessas taxas demonstra que a escalada deste tipo de violência continua em nossa sociedade. Entre os homens o aumento foi de 39%, entre as mulheres de 21,9% e no geral foi de 32,3%.

Para a OMS – Organização Mundial de Saúde, quando a taxa de homicídios em uma sociedade ou localidade excede de 10 mortes por 100 mil habitantes estamos diante de uma epidemia, como acontece com outros tipos de doenças. Nesta concepção o Brasil há muito sofre desta epidemia, muito mais grave do que a grande maioria das doenças que também tanto afetam o povo brasileiro como a dengue, a tuberculose, o câncer, as doenças dos aparelhos circulatório e respiratório, as diversas formas de câncer, enfim, tudo o que tão bem conhecemos dentro de mais uma tragédia que é o caos da saúde pública brasileira.

Esta tragédia afeta de uma forma particular e mais intensa determinados grupos e categorias sociais. Segundo dados do MAPA DA VIOLÊNCIA, 2011 do Instituto Sangari e Ministério da Justiça, coordenado pelo pesquisador Júlio Jacob Waiselfisz, tornados público no final de fevereiro último em SP, os negros correspondem a dois terços dos assassinatos no Brasil, apesar de que este grupo racial representa em torno de pouco mais de 40% da população brasileira, ou seja, a possibilidade de um negro ou mulato ser vítima de homicídio é diversas vezes maior do que de um branco. Entre 2005 e 2008 enquanto a taxa de homicídios entre os brancos caiu em 22,7%, entre negros aumentou em 12,1%. Este diferencial entre brancos e negros na Paraíba é de 1.083%, ou seja, mais de dez vezes; em Alagoas de 974,8% e em onze outros estados acima de 200%.

Outro segmento que também é afetado de forma cruel nesta tragédia são os jovens entre 15 e 24 anos. A taxa de homicídio entre jovens era de 30 por 100 mil habitantes em 1980 e passou para 52,9 em 2008, aumento de 76,3%, situação pior do que em vários países que durante décadas estiveram em guerra civil como Colômbia, Angola ou na América Central.

Para finalizar esta reflexão, em 2008 foram registrados 46.154 óbitos de jovens, dos quais 33.770 foram por assassinato, ou seja, os homicídios representam 73,1% das mortes nesta faixa etária. Como em 2008 ocorreram 50.113 homicídios, os jovens eram 67,4% desta triste estatística e a maioria desses jovens e demais vítimas são negros e pobres. Esta é uma tragédia que ocorre de forma silenciosa e insidiosa, um verdadeiro genocídio que está ocorrendo em nosso país, mas que não tem a cobertura e o estardalhaço que as demais tragédias conseguem, nem mesmo as lágrimas de crocodilo derramadas pelos nossos governantes e pelas elites do poder essas vítimas e suas famílias conseguem ter.

Juacy da Silva, professor universitário, mestre em sociologia, colaborador de Só Notícias
[email protected]

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