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Setor de inteligência da Polícia Civil aponta que golpistas agem dentro dos presídios em Mato Grosso

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Para fortalecer e organizar a criminalidade, melhorar a conta bancária de facções, pagar dívidas, comprar drogas e viabilizar uma diversidade de esquemas aos quais chamam de “tretas”, bandidos, de dentro de presídios de Mato Grosso, estão aplicando, por telefone, pelo menos quatro tipos de golpes diferentes já identificados pelo setor de inteligência e delegados da Polícia Civil local. Os golpistas pegam de surpresa vítimas daqui e de fora também. São pessoas desavisadas que, além de levar muito susto, acabam perdendo dinheiro com isso. Essas ligações são feitas também de presídios de fora do Estado para cá.

Toda informação divulgada sobre isso, conforme a Polícia, é um aviso a mais, uma mensagem subliminar que diz: não caia nesta cilada. Estes golpes são enquadrados como estelionato. Uma vez comprovados, o presidiário acumula condenação. Mas, na maioria das vezes, são de difícil comprovação.

A dona de casa Giane Vanessa Alves, 36, de Cuiabá, não se considera uma pessoa desligada. Mas, mesmo assim, por pouco, não acaba sendo mais uma vítima deste tipo de estelionato. No início do ano passado, ela recebeu uma ligação. “Um homem me disse por telefone que eu tinha sido contemplada pela operadora Vivo, com um prêmio de R$ 30 mil. Como eu sempre participo dessas promoções de operadoras, achei que tinha mesmo ganhado”, detalha Giane, lembrando da fraude. Ela continua contando que o homem a mandou ir até o banco mais próximo. “Eu fui. Quando cheguei lá, ele falou que não era para eu contar para ninguém e me pediu para eu olhar minha conta e ver o saldo que teria um depósito de R$ 30 mil e para sacá-lo precisaria repassar de imediato R$ 200 em um envelope. Só que olhei meu saldo e não tinha nenhum tostão. Falei para ele: minha conta está zerada. Ele respondeu assim: mas passa os 200 somente que vão entrar os 30 mil”.

Nisso um cliente do banco, que estava na fila, chamou a atenção dela, desconfiando que era golpe. Ele avisou à Giane. Foi só aí que ela começou a ficar desconfiada. “Já desconfiada, falei para o homem que não estava entendendo o que ele queria, ele repetiu várias vezes, mas falei que eu não entendia. Então ele chamou outra pessoa, alegando que eu ia conversar com o supervisor, um gerente seu. O outro que voltou ao telefone falava estranho, falava gírias e ouvi várias vozes ao fundo, meio abafadas, tive medo de desligar, porque ele falava assim: fica tranquila que alguém lá fora vai te ajudar a fazer o depósito. Lá fora onde? – pensei. Seria lá fora do banco. Com medo, desliguei o telefone e entrei no carro. Fiquei com a sensação de estar sendo seguida, um sufoco. Quando cheguei em casa, meu marido não acreditou no que eu tinha feito, perguntou como que eu caio em uma cilada dessas”, relata Giane, que, depois do susto, ficou morrendo de raiva

A jornalista Fernanda Leite, 31, já tinha ouvido falar desses golpes e, quando recebeu a ligação suspeita, “fez de boba” para ver até onde o estelionatário ia. “Falou que era um primo distante que estava chegando. Mas como minha família não tem união eu saquei que tinha coisa. Falou assim: oi prima, adivinha quem é. Respondi: prima? Ele disse sim. Emendei como se fosse um tal de Mário, que não existe, que eu inventei. Ele confirmou que sim, que era o Mário, meu primo, que mora distante. Perguntei se ele já estava vindo. Ele disse que sim, que já estava em Rondonópolis, e que o carro dele tinha quebrado por isso precisava de dinheiro. Falou assim: o mecânico aqui cobrou 2 mil para arrumar. Daí, quando chegar aí, eu peço à mamãe para depositar e te pago, prima”, conta Fernanda. Nessa hora, ela revelou que já sabia de tudo. “Ok primo, canalha … sem vergonha… tá achando que eu sou besta idiota… eu sei que você é alguém tentando me dar o golpe”. O estelionatário desligou. Ela recebeu mais duas ligações como esta.

 

O terceiro golpe que tem sido aplicado por presidiários é o do sequestro. Aleatoriamente, ligam para alguém e informam que estão com a esposa, ou marido, ou filho, ou algum parente. Tentam a sorte no estilo “se colar colou”. Porém, por causa da violência urbana, muitas vítimas caem a princípio, acreditam no sequestro e chegam a entrar em desespero. A psicóloga Maria Cavalcanti, 48, recebeu uma ligação dessas. Chegou a ir até à faculdade da filha, de 19 anos, mas comprovou que ela estava estudando, no laboratório, por isso não respondia o celular. O pai da moça, que é separado de Maria, foi avisado do sequestro e também ficou desesperado. Neste golpe, é comum colocarem uma pessoa para simular o falso sequestro.

De todos os quatro desses golpes, este é considerado o mais cruel. O delegado Gustavo Colognesi Belão, da Delegacia de Roubos e Furtos de Rondonópolis, investigou três casos em 2016 na cidade. Em um deles, registrado em julho de 2016, detentos da Penitenciária Mata Grande ligaram para familiares de pacientes internados em estado grave. “Eles se passam por médicos ou enfermeiros, por exemplo, informam sobre o agravamento do quadro clínico do parente e explicam que precisam garantir uma intervenção imediata, que o plano de saúde cobre mas demora para liberar. Alegando ainda que o paciente não teria saúde para esperar a liberação, sugerem que a família transfira de imediato o dinheiro necessário para a conta de um hospital, o que é mentira, e depois que plano cobrir garantiria ressarcimento”, exemplifica o delegado. Segundo ele, os relatos das vítimas que caem são semelhantes. “Contam com o amor familiar, o desespero, para aplicar o golpe. Aproveitam-se de pessoas idosas ou sensíveis, abalam o psicológico de quem atende o telefone e usam o dinheiro, caso consigam completar o golpe, para fortalecer o crime”, comenta Colognesi.

Quanto a este golpe, atualmente a Polícia Judiciária Civil de Mato Grosso tem investigações em andamento nas cidades de Cuiabá, Cáceres e Rondonópolis. Em Cuiabá, são pelo menos seis novos casos registrados a cada mês. O delegado José Carlos Damian, da 2ª Delegacia do Carumbé, já havia alertado, em reportagem neste jornal, que esta modalidade de crime hoje financia o crime organizado em todo o país e seus autores, na maioria das vezes, seguem impunes.

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