A presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Marta Maria Azevedo, recebeu, ontem à tarde, comitiva liderada pelo governador Silval Barbosa (PMDB), acompanhado de parlamentares e produtores mato-grossenses. A intensão foi ampliar o diálogo sobre a situação da Terra Indígena Marãiwatsédé, homologada por decreto presidencial em 1998, como de posse permanente e usufruto exclusivo do povo Xavante.
A comitiva e a presidente da Funai expuseram seus pontos de vista sobre a situação de tensão que se encontra no local e consideraram positivo o estabelecimento do diálogo entre todas as partes como forma de mediar a situação. Foi ressaltada a importância de se buscar soluções alternativas, a fim de minimizar os prejuízos àqueles que se encontram na região, para proceder com tranquilidade no processo de desintrusão da terra indígena.
"Do ponto de vista da Funai, a gente acredita que, para não piorar a situação de violência e conflito, o que deve ser feito é consolidar o processo de desintrusão da terra indígena, feito por meio do diálogo com todos os grupos do povo Xavante, assim como com os não indígenas que estão lá dentro", afirmou a presidenta.
Assessores da Funai informaram que o planejamento da ação de desintrusão está sendo construído de forma conjunta com outros setores do governo federal, a fim de que seja mapeado o quadro de ocupação da área e articuladas todas as saídas possíveis para uma ação destencionada. O governador do Mato Grosso se colocou à disposição para contribuir nesta busca de soluções com o objetivo de minimizar os danos para ambos os lados, produtores e indígenas.
Marta Maria Azevedo afirmou ainda a necessidade de se firmar agendas conjuntas entre a Funai e o governo do Mato Grosso com o objetivo de planejar ações de desenvolvimento sustentável para as terras indígenas no estado.
A área que compreende a Terra Indígena Marãiwatsédé possui 165.241 hectares e está localizada nos municípios de Alto Boa Vista, Bom Jesus do Araguaia e São Félix do Araguaia, no estado de Mato Grosso. Ela era totalmente ocupada pelo povo Xavante até a década de 1960, quando a Agropecuária Suiá-Missú se instalou na região e iniciou um longo processo de degradação ambiental. Com a instalação, os Xavante acabaram confinados em uma pequena área alagadiça e foram expostos a inúmeras doenças.
Em 1966, os dirigentes da fazenda Suiá-Missú promoveram a transferência de toda comunidade para a Terra Indígena São Marcos, ao sul do estado, onde permaneceu por quase 40 anos. Naquele momento, além da perda da terra, o grupo foi atingido por uma epidemia de sarampo e cerca de 150 pessoas que pertenciam à comunidade de Marãiwatsédé faleceram.
Em 1980, a fazenda Suiá-Missu foi vendida para a empresa petrolífera italiana Agip. Durante a Conferência de Meio Ambiente realizada, em 1992, no Rio de Janeiro (Eco 92), a Agip foi pressionada a devolver aos Xavante a terra que lhes pertencia. A partir deste ano, a Funai inicia os estudos de delimitação e demarcação da TI Marãiwatsédé, mas antes de ser regularizada, a área sofre invasões em massa, dificultando o retorno dos índios após a sua legalização.
Marãiwatsédé foi homologada em 1998, por decreto presidencial, mas enfrentou diversos recursos judiciais de manutenção de posse. Descontentes, alguns indígenas começaram a retornar ao local de origem e, em 10 de agosto de 2004, entraram numa parte da terra que representa apenas 10% do território a que têm direito.
Recursos judiciais, porém, continuaram impedindo que eles recuperassem o restante de suas terras. Os ocupantes não índios conseguiram liminar da Justiça, garantindo a permanência em terra indígena, que gerou o desmatamento da área para a agropecuária. Mesmo na parte que conseguiram ocupar, os índios enfrentam até hoje sérios problemas com fazendeiros, madeireiros e posseiros.
Em agosto de 2010, uma decisão unânime dos desembargadores da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, reconheceu o direito dos Xavante à Terra Indígena Marãiwatsédé. Para o TRF-1 não há dúvida de que a comunidade Marãiwatsédé "foi despojada da posse de suas terras na década de sessenta, a partir do momento em que o Estado de Mato Grosso passou a emitir título de propriedade a não-índios, impulsionados pelo espírito expansionista de ´colonização` daquela região brasileira".
Em julho de 2011, em outra decisão, o Tribunal Regional Federal da 1º Região, em Brasília, garantiu a permanência das famílias de não índios na Terra Indígena Marãiwatsédé. No entanto, em junho deste ano, nova decisão do TRF-1 revogou a decisão anterior do mesmo tribunal, autorizando a retirada dos invasores.
Recentemente, em decisão proferida pela Justiça no último dia 4 de julho, o Ministério Público Federal determinou o prosseguimento da execução provisória, com a retirada dos não índios da TI Marãiwatsédé, e determinou à Funai a apresentação do plano de desintrusão da área, que se encontra em construção.