Serão enterrados hoje os corpos dos dois mato-grossenses linchados na Bolívia. Os restos mortais de Rafael Marques Dias de Moraes, 27 anos, e Jefferson Castro de Lima, 22 anos, foram liberados aos familiares no final da tarde desta sexta- feira (17), após procedimentos de identificação por parte do Instituto Médico Legal (IML) de Cuiabá.
Os corpos apresentavam múltiplas fraturas e queimaduras, fruto da ação de pelo menos 200 pessoas, moradores de San Matías na Bolívia, que invadiram a delegacia da cidade na noite de terça-feira (14) e retiraram a dupla de dentro da cela. Desde as primeiras horas de sexta-feira, familiares aguardavam a chegada dos corpos em Cuiabá, fato que ocorreu na parte da manhã.
Para o pai de Jefferson, Francisco de Assis de Lima, 46 anos, é difícil compreender a crueldade vista na morte do filho e do enteado dele. "Que os trancassem em uma cela, até que dessem um tiro na cabeça de cada um, mas nunca fazer o que foi feito". Bastante abalado, ele sequer aceitou entrar na unidade para reconhecer o corpo do filho.
Lima, que trabalha na zona rural de Tangará da Serra, conta que o último dia em que viu o filho com vida foi exatamente no Dia dos Pais. "Encontrei com ele em dois momentos, ele me abraçou, foi tudo tranquilo, nem imaginei que ele iria para a Bolívia e aconteceria tudo isso".
Assim que soube da execução, por meio da televisão, decidiu vir a Cuiabá para liberar o corpo do filho e levá-lo até a cidade do interior, onde Jefferson nasceu. "Só saio daqui com o corpo dele para deixá-lo perto de mim". Bastante revoltado com a crueldade, o trabalhador rural afirma que pretende acionar judicialmente o governo boliviano, que tinha a custódia da dupla após as prisões.
No entanto, ele pretende se reunir com a família de Rafael para decidir os próximos passos. "De cabeça quente a gente faz muita besteira. É melhor esperar a poeira baixar, mas isso não pode passar em branco".
Para o primo de Rafael, Lucídio Roque da Costa, a intenção da família é dar, à medida do possível, um enterro digno para os dois. "Desde o primeiro instante começamos a procurar ajuda, informações, e percebemos que se fosse por nossa conta seria muito difícil. Ligamos para Brasília (DF), no Ministério das Relações Exteriores e também para o Consulado em Santa Cruz e nada caminhava". Rafael será enterrado em Várzea Grande, onde mora a família.
Os corpos foram trazidos por uma comitiva do Grupo Especial de Segurança de Fronteira (Gefron), formada por nove homens e chefiada pelo major Agilson Azizes Ferreira, encarregado de negociar o traslado com as autoridades bolivianas.
Eles tiveram que esperar cerca de 4 horas até que o único perito boliviano da região retornasse a San Matias. O servidor havia pedido demissão na semana passada e decidiu deixar a cidade, com destino a Santa Cruz. Apenas na noite de quinta-feira (16) é que os restos mortais chegaram ao Brasil, no IML de Cáceres.
A polícia boliviana reconheceu os problemas de insegurança na região da fronteira e nesta sexta-feira encaminhou dez policiais para reforçar o patrulhamento e se juntarem aos 12 que trabalham regularmente. A intenção é ainda aumentar o efetivo.
Já no Brasil, a Polícia Civil iniciou as investigações sobre a ida da dupla para a Bolívia. Um morador de Tangará da Serra, que pede para não ser identificado, afirmou que Jefferson a princípio não acompanharia Rafael, mas sim seu irmão, identificado como Jean faria a viagem. Acredita-se que eles tenham levado uma motocicleta roubada e foram presos após matarem 3 bolivianos e ferirem outros 2 durante algum desacerto na negociação do veículo. O resultado dos exames necroscópicos nos corpos dos brasileiros deverá ficar pronto em até dez dias.