O grupo acusado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e pelo Ministério Público Federal (MPF) de provocar o maior desmatamento já detectado pelo poder público na Amazônia só conseguiu atuar porque, além de tecnologia de ponta, tinha informação privilegiada fornecida por um integrante do próprio Ibama. O ex-gerente do órgão em Sinop alertava o grupo sobre as operações de fiscalização ambiental que seriam realizadas pela autarquia e, se os desmatadores tivessem bens apreendidos, liberava os bens por meio de fraudes, denunciou o MPF.
A denúncia por desmatamento e corrupção contra o ex-gerente, o mandante e financiador do esquema, de dois dos executores dos crimes e contra a esposa do ex-gerente do Ibama Sinop, que recebia os recursos obtidos com o desmatamento e atuava para dificultar o rastreamento desse dinheiro, faz parte de uma série de oito ações ajuizadas pelo MPF contra o grupo.
Na região de Sinop, o grupo desmatou três quilômetros quadrados de floresta. Em Altamira (PA), a devastação provocada pelo grupo chegou a 330 quilômetros quadrados de mata nativa.
A participação do ex-gerente do Ibama e da esposa foi descoberta pela força-tarefa da operação “Rios Voadores” durante o cumprimento do mandado de busca e apreensão na empresa do líder do grupo em Sinop.
No local foi apreendido comprovante de depósito bancário em nome da mulher do ex-gerente. Ela tem empresa cadastrada na Receita Federal cujo endereço de correio eletrônico está em nome do marido.
Por meio de interceptações telefônicas, a equipe de investigação comprovou que o grupo recebia informação privilegiada a respeito das fiscalizações, e atuava de acordo com esses alertas. “Certamente, esse tipo de informação só poderia vir de alguém do próprio órgão ambiental que possuísse cargo de chefia”, destaca a denúncia do MPF.
O ex-gerente do Ibama também ajudava o grupo criminoso cometendo ilegalidades na condução de procedimentos administrativos do órgão ambiental. Tratores, correntões e combustível apreendidos em ações de fiscalização, por exemplo, foram devolvidos ao grupo com base em decisão do ex-gerente não inserida no procedimento administrativo e não comunicada ao núcleo de instrução processual da autarquia, o que levou o MPF a denunciá-lo por sonegação de documento.
Alguns dos equipamentos ilegalmente devolvidos aos desmatadores voltaram a ser apreendidos em novas ações de fiscalização, pois novamente estavam sendo utilizados para a derrubada ilegal de floresta.
Somadas às ações ajuizadas após a operação, de junho deste ano, o MPF encaminhou à Justiça Federal em Altamira cinco denúncias criminais, duas ações civis públicas ambientais (uma delas com bloqueio de bens já decretado no valor de R$ 420 milhões) e uma ação civil pública por improbidade administrativa.
O grupo, segundo o MPF e o Ibama, é responsável pelo desmate, entre 2012 e 2015, de 330 quilômetros quadrados de florestas em Altamira, no Pará. A área é equivalente ao território de municípios como Fortaleza (CE), Belo Horizonte (MG) ou Recife (PE). O esquema conseguiu movimentar pelo menos R$ 1,9 bilhão.
Com um total de 24 acusados, as ações tratam de crimes de submissão de trabalhadores a condições semelhantes às de escravos, frustração de direitos trabalhistas, falsidade ideológica, invasão e desmate ilegal de terras públicas, provocação de incêndios, impedimento da regeneração de florestas, corrupção ativa e passiva, sonegação de documentos, formação de organização criminosa e lavagem de dinheiro, além de improbidade administrativa e responsabilização por danos ambientais.
Os acusados estão sujeitos a penas de até 238 anos de prisão, multas, pagamento de R$ 503 milhões em prejuízos ambientais, recuperação da área ilegalmente desmatada, demolição de edificações construídas em áreas irregulares, e proibição, por até dez anos, de acessar linhas de financiamento ou benefícios fiscais oferecidos pelo poder público.
As informações são da assessoria de imprensa do MPF.