A desclassificação de crime doloso contra a vida para a modalidade de lesão corporal prescinde de sérios elementos de convicção, não podendo ser acolhida na pronúncia quando o conjunto probatório indica a ocorrência de dolo. Sob essa ótica, a Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso manteve decisão de Primeira Instância que determinou que um acusado de praticar homicídio tentado contra duas pessoas seja levado a julgamento pelo Tribunal do Júri da Comarca de Juína (Recurso em Sentido Estrito nº 80921/2008).
Nas razões recursais, o apelante aduziu, em resumo, que as provas e as evidências dos autos não autorizam a conclusão de que agiu com ‘animus necandi’ (intenção de matar), razão pela qual pleiteia a desclassificação do crime de homicídio tentado para lesões corporais (artigo 129, Código Penal).
Em contra-razões, o órgão ministerial manifestou-se pela confirmação, em sua totalidade, da sentença de pronúncia, em razão de tentativa de homicídio qualificado perpetrada contra duas pessoas (artigo 121, parágrafo 2º, incisos I e IV, com artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal).
No entendimento do relator do recurso, desembargador José Luiz de Carvalho, ficou comprovado que o recorrente, utilizando uma faca, desferiu golpe contra as duas vítimas, conforme boletim de ocorrência, exame de corpo de delito, bem como as declarações das vítimas. Na avaliação do magistrado, os depoimentos relataram os fatos de forma segura e coerente, demonstrando a culpabilidade do agente.
Conforme os autos, o recorrente confessou em Juízo que golpeou as vítimas com uma faca e essa confissão não foi isolada pelas demais provas dos autos. Ao contrário, na conclusão do relator, a versão foi corroborada pelos laudos periciais que comprovam a materialidade do delito. Além disso, o desembargador também observou que o crime só não se consumou em virtude de as vítimas terem corrido após serem lesionadas e, posteriormente, pela intervenção de terceiros, que vieram socorrê-las, tirando-as da cena do crime.
“Indubitável se verifica que o agente iniciou os meios de execução ao golpear a vítima e atingi-la no peito. Assim, não há também que se falar em desclassificação para o crime de lesões corporais, pois no caso em questão ficou de toda forma evidenciado o dolo, a intenção, do recorrente em matar a vítima”, salientou.
O desembargador José Luiz de Carvalho esclareceu ainda que o artigo 408 do Código de Processo Penal estabelece que a pronúncia deve se assentar em dois fundamentos principais: a existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, requisitos esses que, ao seu sentir, estão presentes no caso em tela e na sentença objurgada.
Também participaram da votação os desembargadores José Jurandir de Lima (1º vogal) e o juiz substituto de Segundo Grau Cirio Miotto (2º vogal). A Comarca de Juína está localizada a 735 km a noroeste de Cuiabá.