Ação inédita impetrada pela Defensoria Pública de Barra do Garças pode ser a saída para milhares de brasileiros que vendem e negociam veículos que acabam não sendo transferidos para o nome do novo proprietário. Um mandado de segurança garantiu ao cidadão V.C.S. a renúncia da propriedade de seu veículo. A partir de então, impostos e outras taxas referente à motocicleta, inclusive multas, não poderão mais ser vinculadas ao seu nome.
O morador do município de Barra do Garças procurou a Defensoria Pública naquela comarca alegando que, há vários anos, não possui mais a motocicleta Honda CG 125 que, todavia, continua registrada em seu nome, constando multas e impostos. Porém, ele não sabe informar onde e com quem possa estar o referido veículo. O ex-proprietário também disse não dispor de prova documental ou testemunhal no sentido de que haja vendido, emprestado, ou de qualquer forma transferido a posse ou propriedade do bem.
Ao ser atendido pelo defensor público Milton Martini, interpelado quanto ao desejo ou não de continuar figurando como proprietário da motocicleta, V.C.S. prontamente respondeu negativamente. Então foi orientado a formalizar tal manifestação, mediante escritura pública declaratória.
Firmado o documento, sempre sob orientação do defensor, ele apresentou requerimento ao chefe da 3ª Ciretran, em Barra do garças, pleiteando a exclusão do seu nome como proprietário da motocicleta. Passados quase 20 dias, sem qualquer manifestação do órgão de trânsito, foi, então, impetrado um mandado de segurança para fazer valer o direito do cidadão de não querer mais ser proprietário do veículo.
Martini sustenta que "a Lei Federal (Código Civil) garante esse direito ao proprietário, de renunciar à propriedade e aos direitos a ela inerentes" e o silêncio da autoridade apontada como coatora (Ciretran) constitui violação a esse direito líquido e certo.
Segundo o defensor público, muitas pessoas enfrentam problemas semelhantes. Hoje, para efetuar a baixa de um veículo no sistema do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) exige-se a ocorrência (de furto ou roubo, por exemplo) ou que seja apresentada uma parte do veículo que contenha o número do chassi. "Isto só é possível se o proprietário estiver com o bem em sua posse", explica Martini.
Entretanto, para a renúncia de propriedade, a lei não impõe condição alguma e o Estado não as pode criar ou impor ao cidadão. Segundo a Constituição Federal, é garantido o direito de propriedade, e a mesma CF assegura, em seu artigo 5º, inciso II, que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".
"O impetrante não visa exclusivamente a obtenção da renúncia da propriedade do veículo, mas sim, por vias transversas, a declaração judicial de que não é mais proprietário do mesmo e, por conseguinte, isentar-se de qualquer responsabilidade sobre o bem", destaca trecho da decisão concedida pelo juízo da Terceira Vara Cível de Barra do Garças.
Conforme Milton Martini, a iniciativa é inédita e inovadora já que não se tem notícia de caso semelhante submetido ao Judiciário brasileiro, e "esse novo fundamento poderá servir de norte para resolver incontáveis situações assemelhadas existentes em todo o país, até agora sem solução", finaliza o defensor público.