O dólar valorizado pressiona os preços no mercado interno, aumentando a inflação, e é ruim para quem vai viajar. Mas, em um ano em que é prevista retração do Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e serviços produzidos no país), o fortalecimento da moeda norte-americana pode dar algum fôlego às exportações e, por tabela, à própria atividade econômica. O dólar tem fechado acima dos R$ 3, e a previsão dos investidores ouvidos pela pesquisa Focus, do Banco Central (BC), é de que a moeda encerre 2015 cotada em torno de R$ 3,15.
A consequência disso, segundo o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, será as empresas focarem nas exportações. “Com o ajuste fiscal, forte retração no mercado interno, vai ter que buscar o externo”, avalia, prevendo aumento das vendas principalmente para os Estados Unidos. “As importações de todos os países da América da Sul (que compram do Brasil) estão caindo, pois suas exportações de commodities (produtos básicos com cotação internacional) estão recuando, em função da queda de preços”, explica, projetando que as vendas para os EUA crescerão de 15% a 20%.
Castro destaca que o mercado norte-americano é o mais promissor, no momento. Na Europa, a recuperação econômica é lenta. A China deve ter desaceleração do crescimento. “O único mercado consistente hoje são os Estados Unidos. Estão tendo recuperação da crise, e o Brasil está redescobrindo o mercado. Para a América do Sul, as exportações vão continuar caindo, qualquer que seja a taxa de câmbio. Para a Venezuela, houve queda de 47% nos dois primeiros meses do ano”, diz.
A própria equipe econômica do governo adota o discurso de que as vendas externas, com destaque para os Estados Unidos, são a alternativa ante a perspectiva de uma atividade interna fraca em 2015. Ao assumir o cargo, em janeiro, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Armando Monteiro, prometeu reaproximação comercial com os EUA e disse que o dólar mais alto estimularia as exportações. O ministro foi aos Estados Unidos em visita oficial, em fevereiro. Os dois países têm dialogado e já assinaram acordos com o compromisso de estreitar as relações comerciais bilaterais.
Na mesma linha, na última semana, o presidente do BC, Alexandre Tombini, disse na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado que o setor externo deve contribuir para a economia em 2015, já que o dólar em alta favorece as exportações. Ele previu que a balança comercial fechará superavitária este ano, apesar da queda nos preços das commodities. Segundo o Relatório Trimestral de Inflação, divulgado na última quinta-feira (26), a autoridade monetária projeta fechamento positivo em US$ 4 bilhões para a balança.
O dólar alto deixa os produtos brasileiros com preços mais atraentes no exterior. Na teoria, se forem fechados mais negócios de exportação, a indústria nacional vai produzir e empregar mais. Mas o movimento pode ser uma faca de dois gumes, já que muitos insumos usados pelas empresas são importados, e estão mais caros com a alta da moeda norte-americana.
Tiago Henrique Kuhn é gerente de exportações da Pak, empresa que cuida das operações de comércio exterior da fábrica paranaense de biscoitos Nutrisul S.A. Ele explica que o custo de produção dos biscoitos aumentou, porque a farinha de trigo, matéria-prima do produto, é importada. Os preços dos biscoitos tiveram de ser ajustados no mercado interno, mas, no exterior, o dólar em alta tem ajudado a pelo menos segurar os valores atuais.
“No patamar que está, a gente consegue manter as condições que tinha e, em um ou outro caso, até negociar”, comenta. Segundo ele, a ordem é investir nas exportações. O gerente conta que, no início do ano, a empresa participou de uma feira de alimentos em Dubai, com o objetivo de ampliar o leque de compradores para os biscoitos no exterior. “Com a participação, já estamos em negociação com pelo menos mais três mercados: Arábia Saudita, Moçambique e Mauritânia”, informa.