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Só desta vez

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Alexandre Garcia

Bolsonaro na cadeia é considerado um marco final da exceção. O fim de um período de vale-tudo, em que ficaram de lado o devido processo legal, o juiz natural, o amplo direito de defesa e até a Constituição. Parte do jornalismo abandonou sua raiz crítica e fingiu que cobria o caso em pleno estado democrático de direito. Na página de opinião de O Globo da quinta-feira, está a explicação, na coluna de Malu Gaspar: “Findo o julgamento, está na hora de o Supremo voltar ao seu quadrado, ser mais contido, ter mais comedimento…o Tribunal, Alexandre de Moraes em especial, foi além de suas atribuições – e, tudo bem, porque foi por “boa causa”, mas agora chega.” 

No dia seguinte, a página de opinião do mesmo jornal volta o assunto, em coluna de Pablo Ortellado, com o título Fim do Ciclo: “Com a condenação de Bolsonaro e dos generais, encerramos o ciclo de resposta institucional ao golpismo. O Supremo assumiu poderes extraordinários que esperamos ter(sic) sido excepcionais e transitórios. Está na hora de encerrar os inquéritos contra as mobilizações antidemocráticas e de conferir transparência ao processo, para que a sociedade possa avaliar o que foi feito.”

Assim, às claras, jornal e jornalistas confessam que conviveram com a exceção, mas agora chega. Era só para aquela vez, como a censura da Ministra Cármen Lúcia, votando pela liminar que bloqueou Brasil Paralelo só até passar a eleição. O artigo de Malu Gaspar relembra o ativismo do Supremo: “Decisões monocráticas de ofício, sem ouvir previamente o Ministério Público, prisões preventivas por meses sem acusação formal, a morte na cadeia de um réu que poderia ir para casa com tornozeleira, a manobra que transferiu à turma e tirou do plenário o julgamento do ex-presidente, serão sempre apontadas como máculas no processo.”  Ortellado escreve que nem sabe quantas contas digitais foram bloqueadas – censuradas – e enfim, reconhece que o Supremo era, a um tempo, vítima, investigador e juiz. Agora também é executor. O artigo em O Globo concluiu, sem dizer, com uma confissão: “O ciclo judicial que se encerra precisa dar lugar a um novo ciclo de restauração da normalidade democrática”. Ah, é? Então apoiaram uma suspensão da normalidade democrática e agora, depois do estupro, vamos restaurar a virgindade da Constituição?

Como escreveu Malu Gaspar, o Supremo recebeu um salvo-conduto. Dos presidentes do Senado, da mídia, dos que queriam se livrar de Bolsonaro. E agora que se livraram, o caminho fica mais aberto para a crítica aos escritórios de advocacia de esposas e parentes de ministros do Supremo, assim como as ligações com financiadores de eventos, como o Master, com participação de ministros do STJ – como Malu citou na sua coluna. No Supremo, livraram-se de Bolsonaro, mas perderam o salvo-conduto. Graças ao jornalismo cúmplice da exceção é que o ciclo vicejou desde 2019. Se a mídia tivesse cumprido seu verdadeiro papel, de crítica em defesa da lei e da Constituição, não teríamos tido “ciclo de exceção”. Tal como se pode dizer do ciclo de exceção militar, que começou com o apoio quase total da média da época. Aquele foi para tirar o Brasil do comunismo. Esse, para tirar o Brasil de Bolsonaro. Foi só daquelas vezes.

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