A diminuição da maioridade penal foi tema de audiência pública, hoje (3), no Senado. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcus Vinicius Furtado, e a procuradora da República, Raquel Elias Dodge, se manifestaram contra a proposta de redução da maioridade por considerá-la inconstitucional e ineficiente no combate aos crimes cometidos por adolescentes.
Na opinião dos dois debatedores, não é possível emendar o texto constitucional para retirar direitos individuais. Além disso, eles entendem que a Constituição "blinda" os adolescentes de punição penal pelo fato de terem ainda formação moral e física não concluída.
Furtado alertou que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê uma série de direitos aos menores de idade e de obrigações do Estado e da família que nunca foi implementada de fato. Na opinião do advogado, enquanto essas questões como direito a educação, lazer e proteção da família não forem resolvidas, não haverá embasamento para falar em diminuição da idade penal.
"Nós temos a sanção aos pais, por exemplo. As medidas pertinentes aos pais e responsáveis também não são aplicadas. Este Congresso criou um estatuto que não está sendo aplicado. Nós vamos modificar um sistema antes mesmo de implementá-lo totalmente?", perguntou o presidente da OAB.
Furtado também lembrou que o sistema penal brasileiro não objetiva apenas punir, mas também ressocializar e reeducar. Na avaliação dele, enquanto o Estado falhar em promover esses valores nas prisões, não poderá submeter os adolescentes ao sistema carcerário que existe hoje. "Se o sistema carcerário não funciona em relação ao adulto, muito menos em relação a uma pessoa em desenvolvimento", disse.
A procuradora da República Raquel Dodge declarou ser favorável ao aperfeiçoamento do ECA, especialmente no que se refere a tratar de maneira diferente os adolescentes que cometem crimes graves dos que cometem pequenos delitos. "Não é possível tratar da mesma forma o menor que comete crimes como homicídio e tráfico de drogas em grande escala o que comete um furto, por exemplo", ressaltou.
Para Raquel Dodge, é possível aumentar o rigor das medidas socioeducativas e o prazo de punição. Além disso, acha que os pais e adultos que corrompem menores de idade também deveriam ser tratados com mais rigor pela lei. Ela, no entanto, não concorda com a redução da maioridade penal, ressaltando que a opção dos constituintes de 1988 foi uma legislação que aprofunda as garantias sociais e não a persecução penal dos adolescentes. Para a procuradora, modificar esse foco seria contrariar a essência do texto constitucional.
Um dos principais defensores da reforma do ECA, o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), alegou que a sociedade não pode esperar até que todas as medidas de proteção social previstas no estatuto sejam implementadas para conferir se elas darão resultado na diminuição da criminalidade. O senador propõe a manutenção da idade penal em 18 anos, mas defende que, nos casos de crimes hediondos, os adolescentes, a partir dos 16 anos, possam ser responsabilizados criminalmente se o juiz da Vara da Infância entenda que tenha discernimento da gravidade do ato que cometeu.
Aloysio Nunes discorda do parecer que considera a redução da idade penal inconstitucional. Na opinião do parlamentar, a própria legislação já trata o adolescente, de 16 anos de idade, como adulto em diversas situações relevantes. "Apesar do adolescente ser uma pessoa ainda em fase de formação, a própria lei brasileira e a Constituição brasileira admitem que, em determinadas circunstâncias, ele pode exercer atos da maior relevância na vida civil e na vida pública", disse.
A Comissão de Constituição e Justiça do Senado promoverá mais duas audiências públicas nas próximas segundas-feiras para debater o tema. Juristas e especialistas no assunto deverão ser ouvidos antes que a comissão analise a proposta do senador Aloysio Nunes e outras referentes à redução da maioridade penal.