Representantes das regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul defenderam a ampliação da base de tributos do Fundo de Participação dos Estados (FPE) em uma audiência pública realizada no Senado. A sessão objetivou contribuir com o anteprojeto de novo pacto federativo em elaboração pela Casa Legislativa e teve a participação do secretário adjunto da Receita da Pública da Secretaria de Fazenda de Mato Grosso (Sefaz), Marcel Souza de Cursi, e dos secretários de Fazenda do Paraná, Luiz Carlos Hauly, e de Minas Gerais, Leonardo Mauricio Colombini Lima, representando suas respectivas regiões.
Na ocasião, Cursi defendeu que o FPE passe a ser composto por todas as receitas administradas pela União, e não somente pela arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Segundo ele, isso oportunizaria aos estados mais segurança na previsão e execução dos orçamentos.
Cursi argumentou que, em 1988, o IR e o IPI representavam 76,2% da arrecadação tributária da União. Em 2010, passou para 45,5%. Já os impostos e as contribuições não compartilhados com estados e municípios representaram 54,5% da arrecadação tributária da União, ou seja, houve um decréscimo de 68,5% no IR e IPI, em comparação com os impostos e as contribuições não partilhadas.
De acordo com o secretário adjunto da Sefaz, 16% das receitas totais da União eram distribuídas com os demais entes federativos em 1988. Atualmente, apenas 8,5% são compartilhados com estados e municípios.
Por outro lado, os representantes dos estados divergiram em relação aos novos critérios de repartição dos recursos do FPE. Marcel de Cursi defendeu o critério distributivo, o qual leva em consideração aspectos socioeconômicos, ou mesmo o misto, o qual envolve a manutenção dos valores repassados aos estados e recursos proporcionais ao crescimento da receita líquida da União. Já o secretário do Paraná defendeu o modelo equitativo, o qual possui como premissa a relação entre a receita líquida e o número de habitantes.
Em 2010, o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu que as normas atuais de distribuição do FPE somente valerão até 31 de dezembro de 2012, sob o argumento de que os critérios de rateio contrariam a Constituição Federal por não promoverem o equilíbrio socioeconômico entre as unidades da Federação.
Atualmente, adota-se o critério distributivo, ou seja, os estados com renda per capita mais baixa recebem maior fatia de recursos. Há 18 projetos de lei complementar em tramitação no Congresso Nacional com sugestões de novos critérios.
A revisão do pacto federativo também envolve a repactuação das dívidas dos estados com a União. Na audiência pública, os representantes das três regiões defenderam a revisão do indexador utilizado para corrigir os valores das dívidas e os juros aplicados. O secretário de Minas Gerais sugeriu a alteração dos juros que hoje variam em torno de 18% ao ano para 2% ao ano. Entretanto, somente seriam beneficiados pela redução os estados que investissem a diferença de valor pago à União em infraestrutura.
Quanto ao índice utilizado para corrigir as dívidas, os representantes mostraram-se favoráveis à troca do IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna, calculado pela Fundação Getúlio Vargas), medido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O argumento é que o IGP-DI acumula alta em relação ao IPCA.
Outro assunto da audiência foi a reforma do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) proposta pela União. A reforma tem como principal medida a redução das alíquotas interestaduais do ICMS, sob o argumento de minimizar a "guerra fiscal" entre os estados.
O secretário do Paraná posicionou-se favorável à redução das alíquotas a 4% e cobrança do imposto no destino das mercadorias. Já Cursi e Leonardo defenderam que é possível haver uma redução das alíquotas interestaduais, mas não a 4%, desde que a União garanta compensação de receita aos estados que eventualmente tiverem perda de arrecadação.
O adjunto da Sefaz defendeu a redução de 12% para 7% e de 7% para 4%, dependendo dos estados de origem e de destino das mercadorias, desde que seja recomposta a base de tributos do FPE, repactuadas as dívidas dos estados com a União e repartido o ICMS do comércio eletrônico entre estados de origem e de destino das mercadorias.
Na audiência pública, os representantes defenderam também a convalidação dos benefícios fiscais do ICMS concedido pelas unidades da Federação sem aprovação do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).
A concessão unilateral de tais benefícios tem sido objeto recorrente de questionamentos judiciais. "Por isso, a importância da convalidação das normas para o restabelecimento da segurança jurídica e da manutenção dos acordos celebrados, que pode ocorrer por convênio do Confaz ou por alteração constitucional", explicou Cursi.
O adjunto da Sefaz ressaltou ainda que, caso a decisão do STF seja sumulada, sem que haja previsão para convalidação, as empresas não possuirão patrimônio líquido para saldar as dívidas tributárias, pois o valor concedido de benefícios já foi repassado ao preço dos produtos.
Nesse contexto, outra questão que precisa avançar, simultaneamente à convalidação, é o quórum do Confaz para aprovação dos benefícios fiscais propostos pelos estados. A atual legislação exige que as concessões sejam decididas por unanimidade das unidades da Federação.
Contudo, a convalidação é um dos temas em que não há consenso e, por isso, os estados da região Centro-Oeste defendem a flexibilização do quórum para aprovação de alguns temas. Na audiência, Cursi defendeu ainda que matérias que não interfiram na receita de outros estados, como isenções internas para órgãos públicos e anistia a multas de empresas, não necessitariam de apreciação pelo Confaz.
A audiência pública foi realizada pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) em conjunto com a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e a Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo do Senado (CDR) do Senado para contribuir com os trabalhos da Comissão Especial do Pacto Federativo, criada em 15 de março devido a ponderações frequentes de senadores sobre o desequilíbrio federativo no Brasil. A previsão é que os trabalhos sejam concluídos em setembro deste ano.