Em Mato Grosso, os assassinatos tiveram um crescimento de 18% de janeiro a setembro deste ano, em relação ao mesmo período do ano passado. Já os roubos, de acordo com indicadores da Polícia Civil, aumentaram em 29%. Das 14 regionais da Polícia, quatro delas apresentaram aumento da violência: Cuiabá, Várzea Grande, Rondonópolis e Sinop, os municípios mais populosos do Estado. Foram essas regiões que fizeram que os números de assassinatos saltassem de 721 em 2013, para 848 neste ano. Os roubos passaram de 10,8 mil para 13,9 mil. Já os furtos tiveram queda de 29 mil para 28 mil casos.
Entre as respostas para o aumento dos dados estão a impunidade, a falta de investigação dos crimes, sucateamento da polícia, falta de políticas públicas e o pior de tudo é que o crime compensa. O próprio secretário estadual de Segurança Pública, Alexandre Bustamante, reconhece o fato, assim como o coordenador do Núcleo Interinstitucional da Violência e Cidadania da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), o sociólogo Naldson Ramos da Costa. A impunidade tem levado aos bandidos uma sensação perigosa, a de que não vão pagar pelos crimes, portanto fazer uma “parada” uma “correria” vale o risco pelo dinheiro que vão ganhar em um assalto ou na execução de um credor.
“Os crimes de execução precisam ser investigados e essas pessoas punidas. A impunidade gera essa confiança e a polícia não está dando conta da sua missão de prevenir, reprimir e investigar crimes. Aliado a isso tem que se levar em consideração as poucas políticas públicas para levar a inclusão social, que também contribui para os índices de criminalidade”.
O secretário Alexandre Bustamante até dá exemplo de algo corriqueiro de como um ladrão pode se dar bem. Um marginal rouba um celular de alta tecnologia, um Iphone, por exemplo, e revende por R$ 500. Ele comete o mesmo crime umas 20 vezes e é preso por uma dessas ações, passa pouco tempo na cadeia e volta para as ruas. “Quanto ele ganhou com isso? Ele sabe que ninguém vai lá à delegacia para reconhecer com medo dele voltar na casa da pessoa, e volta mesmo. Antes de qualquer coisa é preciso mudar a lei penal. A polícia está prendendo, mas os bandidos não permanecem presos. O sistema prisional precisa funcionar e as pessoas têm que ter medo de ser presas”.
Ele destaca o caso de João Arcanjo Ribeiro e os condenados no caso do Mensalão e avaliou que todos que ganharam dinheiro de forma ilícita, apesar das prisões, o crime compensou. “Imagina um cara que assalta um banco aqui e leva R$ 3 milhões, ele pega 18 anos cumpre um sexto da pena, trabalha ele vai ficar dois anos preso. Você ganha R$ 3 milhões em dois anos? Não né, mas ele sim. O que o Arcanjo perdeu em dinheiro? E os condenados do mensalão?”.
Grupos de extermínio – nem todos os crimes, embora sejam apontados pela Polícia Civil com raízes no tráfico de drogas, têm de fato esta origem. O sociólogo suspeita da participação de grupos de extermínio – formados por integrantes da segurança pública – nesta matança. “O que vejo de novo nesse cenário em relação ao ano passado, mas não tenho como provar, é o aumento das execuções na periferia. Há rumores de que grupos de extermínio estariam eliminando jovens. Depois que dois jovens mataram um major começou uma série de mortes com certa frequência, mas não há como provar essa relação”.
Ele suspeita da movimentação de alguma organização criminosa que tem como alvo os jovens com ficha criminal elevada e por isso tem sido eliminados. Para o sociólogo, nem sempre quando um jovem viciado em entorpecentes é assassinado o crime ocorreu por dívidas ao traficante, mas por uma ação de “limpeza”. “Essas execuções e a presença de grupos de extermínio precisam ser investigadas também e chegar à autoria”.
Em relação ao aumento dos roubos, inclusive nas cidades de interior, ele acredita que seja fruto do próprio crescimento do Estado. Da mesma forma que o Estado cresce, as pessoas passam a comprar mais bens e a cobiça dos bandidos cresceu na mesma proporção. “Os crimes de roubo, furtos e arrombamentos, crescem na lógica de crescimento. A polícia investiga muito mal. Se o crime não for contra o sistema financeiro ou empresarial, não tem investigação nenhuma”.
Em Sinop, onde a criminalidade tem disparado, a delegada regional Maria Antônia Soares também afirma que o tráfico é a origem dos crimes. “Rouba-se e mata-se por drogas e as vítimas das mortes são os jovens e adolescentes. Temos feito cada vez mais apreensões de cargas maiores de drogas, já apreendemos 100 quilos, 600 quilos de entorpecentes como cocaína, pasta-base, maconha e ecstasy, porém nossa estrutura não acompanhou a demanda. Só temos uma delegacia, efetivo reduzido e nenhuma especializada”.
O delegado regional de Rondonópolis, Henrique Meneguelo, também viu a violência crescer na cidade e tem apostado em operações para a retirada de armas de fogo de circulação para reduzir os assassinatos. “Prendemos uma quadrilha de roubo de motos e conseguimos reduzir em 60% esse tipo de crime na cidade. Agora estamos com a operação Primavera. Não há um fator pontual para o aumento da criminalidade, mas o envolvimento com drogas tem sido motivação principal para a prática de crimes”.
Parceria com a população – o secretário de Segurança Pública acredita que a saída para o combate à violência não é apenas o policiamento ostensivo, mas a mudança na lei penal. Esta é principal solução, além do investimento no aumento no número de policiais e infraestrutura no interior. “O que podemos fazer é trabalhar as futuras gerações para evitar a violência no futuro. Levamos crianças para conhecer o Centro de Comando de Controle e os trotes caíram em 50%. A população precisa ser mais próxima da polícia, estreitar essa relação. O criminoso de hoje foi criança um dia”.
Ele comenta que Barra do Garças é uma cidade com índice de homicídio europeu, dois a três por ano. Contudo, assim como em países europeus, tem alto número de suicídios em relação a outras cidades do estado. “Talvez seja porque no passado a cidade teve um grande número de policiais e criou-se uma cultura, a maior presença inibe, mas não resolve, mas foi ficando assim até hoje”. Lucas do Rio Verde é citada como um exemplo de que quando a população se une para combate à violência surte efeito.
“Moradores passaram a usar apito quando percebem movimentação estranha na vizinhança. Quando o primeiro começa apitar, os outros fazem o mesmo e amedrontam o bandido. Um exemplo simples de quando a população começa a fazer a sua parte e deu resultados”. Bustamante ainda fez uma conta matemática para reafirmar a necessidade dessa parceria com a população no combate à violência. “Ano passado prendemos 25 mil pessoas, e já tinham 11 mil presos. São 36 mil e não prendemos todos que praticam crime. Joga aí mais 12 mil, são 48 mil pessoas roubando, tenho seis mil policiais. É desesperador demais. Vê quanto a polícia prende, quantos processados e quantos são efetivamente condenados. A gente prende 25 mil, são processados 10 mil e são condenados nem 2 mil. Não tem presídio”.