O Pronto-Socorro Municipal de Cuiabá atendeu 7.964 vítimas de acidentes de trânsito entre os meses de janeiro e novembro de 2009. No ano anterior, o número de procedimentos foi de 8.592, apontando a constante violência do trânsito na Capital. Dados parciais do Instituto Médico Legal (IML) mostram ainda uma realidade mais triste. De 12 de julho a 23 de dezembro foram 128 mortes provocadas por acidentes de todas as naturezas no trânsito.
A falta de respeito às leis, alta velocidade, motoristas embriagados, infra-estrutura viária precária, inchaço do tráfego e pouco efetivo para fiscalização são algumas das razões para o cenário de violência enfrentado na cidade.
Pedestres, motoristas e motoqueiros vivem em uma verdadeira disputa por espaço, que resulta em atropelamentos e colisões, quase sempre com mortos e feridos. Há 7 anos como agente de trânsito da Secretaria Municipal de Trânsito e Transporte Urbano (SMTU), Eric Zambrim afirma que a falta de educação é coletiva, entre condutores e pedestres, é responsável pelo cenário atual.
Dos 128 óbitos apontados pelo IML, 26 foram registrados como vítimas de atropelamentos. Os acidentes com motos também são frequentes e constantemente presenciados pelos agentes de trânsito Zambrim e Rodrigo Rosa, que fiscalizam a avenida Getúlio Vargas, na região da Praça da República. "Todos os dias tem alguém caído", comenta Rosa.
Os motociclistas protagonizam os atendimentos no PSMC. Dos 7.964 atendimentos, 5.434 vítimas foram motoqueiros, a exemplo de Alex Souza Alvarenga, 23, que sofreu uma colisão há 4 meses e ainda hoje se recupera das sequelas do acidente provocado por uma caminhonete, conduzida por um motorista que não parou para prestar socorro. Alex teve traumatismo craniano e, consequentemente, paralisia facial, além de um problema de audição. Ele conta que saia do trabalho às 7h de um sábado e se recorda apenas de passar por um quebra-molas da avenida Miguel Sutil. Depois disso, a memória mais recente do motociclista é de acordar 2 dias após no Pronto-Socorro, onde permaneceu internado por 4 dias. "Me contatam que a caminhonete me atingiu, mas eu não lembro de nada".
Para o mototaxista Ismael Rodrigues, 70% dos motoristas não respeitam as motocicletas ou não prestam atenção no trânsito, provocando os acidentes. Ele comenta ainda que uma coisa é dirigir outra coisa é tirar Carteira de Habilitação. "Tem gente que passa na prova, mas faz tudo errado no dia-a-dia".
A falta de formação adequada dos motoristas e motociclistas também é apontada por Zambrim para uma das causas do grande número de acidentes. Ele entende que as aulas deveriam ser mais amplas, com noção real de como proceder diante do trânsito.
Rosa acrescenta que o número de veículos nas ruas teve um aumento muito grande, inchando o trânsito cuiabano, ao mesmo tempo em que não houve uma ampliação da malha viária. "A única obra expressiva que vemos é a construção da avenida das Torres, porém são dezenas de carros saindo todos os dias das concessionárias". O agente comenta que a aglomeração dificulta ainda mais o tráfego, irrita motoristas, além de aumentar a chance de acidentes.
Zambrim destaca ainda que atitudes que parecem ser inofensivas, têm grande representatividade nas ocorrências de trânsito. Ele reforça que falar ao celular enquanto dirige é uma das principais infrações e que a atitude pode resultar em graves acidentes. Diante dessa situação, o Denatran tem uma resolução que transforma a penalidade de média para gravíssima, em relação ao motorista flagrado ao telefone enquanto dirige.
O taxista Manoel Izaque dos Santos, 57, lembra que o trânsito é perigoso e é preciso ter cada vez mais cuidado. Há 31 anos atuando nas ruas da Capital, ele reforça a ideia da falta de educação dos condutores, especialmente sobre a falta de sinalização e excesso de velocidade. "A pessoa está com pressa e acha que ela é a única que tem prioridades e as coisas não funcionam assim. Tem que haver respeito com todos".
Mesmo sabendo que não é correto atender ligações de telefone enquanto dirige, Izaque conversa um pouco no celular e desliga comentando sobre a infração. Cometer pequenos delitos no trânsito é uma prática comum entre a maioria dos que estão nas ruas, mesmo diante da consciência do que é certo e errado, como no caso do motorista João Martins, 57, que tentava atravessar a Getúlio Vargas fora da faixa de pedestre. Ele reconheceu que o certo era ir até o local permitido para travessia, mas justificou que tomava cuidado para não ser atropelado.
Sobre o dia-a-dia a frente do volante, João vê o trânsito como violento e destaca a falta de respeito. "Temos que ficar atentos com o que ocorre. É preciso cuidar de nós e dos outros".