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O percurso perigoso da pesquisa

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Aureir A. Brito é professor e mestrando do Programa de Pós-graduação em Estudos Linguísticos e Literários (PPGLetras), do campus da Unemat Sinop.

As marcas do percurso universitário tendem a nos fazer bloquear o que nos levou até aquele lugar. Elas se caracterizam por um ritual de esquecimentos – as atividades cotidianas, leituras, escrita, tempo de aula, etc. E hoje penso que isso me levou a bloquear as condições que me conduziram à universidade, bem como, a continuidade desse percurso parece ainda algo a ser desvelado. E é isto que proponho aqui: desvelar as naturalizações desse percurso para mostrar os sentidos provocados pela existência do Programa de Pós-Graduação em Letras na Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT) campus de Sinop.

Ao desvelar esse percurso, faço surgir questões agudas aos olhos do leitor: onde estão os outros? Cadê os meus colegas, muitas vezes amigos, dos ensinos fundamental e médio? Cadê os meus colegas da graduação nos cursos de pós-graduação? Eles queriam isso? É desejo de todos querer fazer um curso de graduação e pós-graduação? Se queriam ou não, a impossibilidade de todos realizarem esse percurso é apreendida por nós, muitas vezes, como “incompetência”, “falta de vontade” etc. No entanto, o que nos mostra a realidade é que há um funil de seleção entre essas instâncias públicas de ensino; principalmente, nos mostra que há uma lacuna intencional entre o básico e o superior.

Percebo essa condição afuniladora de entrada, permanência e continuidade do percurso universitário como uma intenção das formas de poder que detêm a máquina do Estado. Não se trata apenas dos políticos, mas principalmente dos setores econômicos que os patrocinam, ou seja, quem esses políticos realmente representam. E essa engrenagem Estado-Mercado não tem início somente agora; é a condição de existência do próprio sistema de produção nos últimos dois séculos.

A intenção desses setores, majoritariamente, é formar profissionais para o mercado de trabalho, agregando valor aos que concluem seus cursos, e, para isso, é necessário dividi-los nesse processo também: quem conclui um curso, quem nem começa, quem não conclui, quem faz pós-graduação, são divididos e seus trabalhos têm valores (não necessariamente preços) sociais distintos – agregados pelas pessoas que mantêm a universidade pública, muitas vezes aquelas que nunca puseram os pés numa.

Desse modo, não é por que o Estado seja malvado ou bonzinho que há ensino e divisão social por meio disso. Não seria diferente em Sinop-MT: desde sua implantação, a UNEMAT tem cursos baseados nessas demandas sociais – desde retroalimentar a educação básica, por meio das licenciaturas, até as engenharias, para a expansão urbana como forma de continuidade do percurso do processo colonizador. A escolha desses cursos, a metodologia contábil do Estado, são essencialmente intencionais. Deixo a pergunta ao leitor: mas é intenção de quem, e funciona para quem?

Aprendemos que os heróis não somente contam a própria história. É necessário que outros a contem, para ter validade social, para se impor com força a narrativa dominante – aquela dos que detêm o poder. Vejo nisso um potencial redentor nas pesquisas, principalmente, na pós-graduação. Aí eu nomeio como perigos da pós-graduação a essa narrativa dominante. Temos à nossa disposição elementos para analisar e desvelar, e isso tende a desarmar as narrativas dominantes.

Por pressuposto, ao demonstrar os resultados de uma pesquisa, o pesquisador não conforma a realidade narrada pelas formas de poder impostas: ele tende a seguir o percurso material do seu objeto (onde ele aparece, onde não aparece, quem o esconde, por que o esconde); e isso é perigoso às formas de poder. Gosto de pensar esse perigo, e isso me mobiliza a tratar a pós-graduação como um instrumento dos trabalhadores que mantém a universidade pública.

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