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De tanto e quanto

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Sinop começo do ano de 2005. O prefeito Nilson Leitão revela que costura financiamento no Ministério das Cidades via BNDES para construir rede e tratamento de esgoto em 40% da cidade. A obra – orçada em R$ 48 milhões – teria R$ 40 milhões do banco com contrapartida de R$ 8 milhões da prefeitura e seria executada pelo Consórcio Xingu (controlado pela construtora Gautama e participação da empresa Cogente, de Campinas). Mais detalhadamente: seria implantada uma rede coletora de 162.896,15 metros, estação de tratamento com capacidade para 7.666.000 litros/dia e 1,5 km de emissário. Esse projeto teria 7.566 ligações domiciliares no quadrilátero nobre da cidade.

Sinop, junho de 2005. Com base em relatórios da empresa RMS Engenharia, de Fortaleza, e da Funasa, que apontavam disparidade de preço no comparativo com outras, similares, a Câmara Municipal breca o projeto. A desconhecida RMS avaliou a construção em R$ 22,28 milhões tomando por base referencial idêntica obra numa cidade de igual porte no Ceará. A Funasa, – velha conhecida dos mato-grossenses – calculou que o esgotamento não passaria de R$ 23,97 milhões.

Sinop, novembro de 2005. A mesma Câmara Municipal que apontou o suposto superfaturamento da obra deu o sinal verde para Leitão tocar o bonde.

Sinop, 2006. O ano político manteve o projeto em banho-maria até novembro e o assunto ficou na galeria do esquecimento nos debates eleitorais. Com a papelada da Câmara Municipal, licitação para a obra vencida pelo tal consórcio e aprovação pela Secretaria do Tesouro Nacional Leitão correu ao BNDES e ficou no aguardo.

Sinop, março de 2007. Ao lado de outras autoridades locais, Leitão assina o contrato para a execução da obra.

Rio de Janeiro, abril de 2007. O BNDES passa a régua e Leitão é autorizado a botar a mão na massa.

Sinop, 17 de maio de 2007. A Polícia Federal cumpre mandado de prisão contra Leitão e o recambia para Brasília. A acusação: o prefeito teria recebido R$ 200 mil de propina da Gautama. A PF sustenta que o ex-secretário da prefeitura, Jair Pessine, teria recebido em Brasília, da Gautama, um envelope supostamente com a dinheirama, que estaria hospedado no mesmo hotel com o ex-chefe em Sinop e que teria voado juntamente com ele para Cuiabá pela TAM . Não houve flagrante para apreender o tal envelope. Ninguém viu Leitão receber o tal envelope e prefeito nega a acusação da propina.

Brasília, 21 de maio de 2007. Após ser ouvido pelo Superior Tribunal de Justiça e negar que haja ilegalidade na contratação do consórcio para executar a obra do esgoto Leitão é liberado e vai para Sinop.

Cronologia à parte, Sinop está à deriva e o prefeito é acusado de receber propina por uma obra que sequer começou e para a qual o BNDES e a prefeitura ainda não liberaram um centavo sequer.

A Operação Navalha muito bem honra o nome que lhe deram, pois fere a alma da mais importante cidade do Nortão e bota atrás das grades um homem público que moldou sua trajetória com dignidade no exercício dos mandatos que o povo sinopense lhe outorgou. Ficou um vácuo na ação policial por melhor que fosse a intenção da Polícia Federal, que resultou na dúvida, que teria que beneficiar o acusado.

Estranhamente nenhuma autoridade se manifestou em defesa de Sinop e os políticos cumprem um implícito e estranho pacto de silêncio. Ninguém na bancada federal grita nem move uma palha para tentar garantir a continuidade da liberação do financiamento pelo BNDES para o esgoto. Sinop está acima do prefeito e da suposta maracutaia de superposição de preço da obra. Ainda que coletivamente os detentores de mandatos fujam de Leitão como o diabo da cruz, todos teriam que se posicionar ao lado daquele município. Baseado nesse princípio a força representativa mato-grossense não poderia vacilar, e exercitando a verdadeira função política teria que brigar para que o financiamento fosse mantido, e se comprovada tal fraude, que o montante a mais se destinasse a aumentar a área prevista para o saneamento, sem prejuízo de condenação de culpados caso se comprovasse ilicitude nos valores contratados.

Se a Câmara Municipal tinha em mãos relatórios que apontavam para o superfaturamento, por que permitiu que Leitão contratasse a obra? Quer seja para condenação ou absolvição esse cenário bota no mesmo barco prefeito e vereadores, Secretaria da Receita Federal, Ministério das Cidades e BNDES.

A cronologia para se chegar à obra passou. Agora entramos em outra, a ordem cronológica do efeito sanfona, aquele que ora bota o caboclo na cadeia ora o joga no olho da rua, ora condena e execra ora absolve e pede perdão, como se os acusados fossem marionetes e não serem humanos com sentimento, família, honra e nome a zelar.

Lamento que a jovem liderança política de Leitão seja jogada à arena dos leões. Lamento tanto pelo constrangimento a que o prefeito foi submetido sem que houvesse materialidade ou prova testemunhal contra ele, quanto pelo estrago que a tal Navalha faz a Sinop.

Eduargo Gomes é jornalista em Mato Grosso

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