Claro que os inimigos externos devem ser combatidos. Mas nada mais corrosivo do que o inimigo interno, ele tem muitos disfarces, monta armadilhas iniludíveis. Pessoas e empresas vítimas do inimigo interno tomam decisões contra si mesmas, solapando suas próprias bases de apoio.
Um deles é a miopia do pânico. Trata-se de um processo que interrompe a visão de longo prazo pelo medo de situações anunciadas. Geralmente, os planos estratégicos são traçados dentro de cenários otimistas. E dificilmente as estratégias contam com a unanimidade dos envolvidos, sempre há catastrofistas, aqueles burocratas que acreditam que tudo deve ser previsto, garantido com antecedência. No momento em que as primeiras nuvens se delineiam, são esses que surgem, bradando felizes o seu "eu não disse"?
Se a empresa teve a sabedoria de mantê-los longe do poder, ela analisa os riscos e as oportunidades, faz as correções e continua seu rumo de longo prazo. Caso contrário, acontece o que estamos vendo em muitas organizações: aos primeiros sinais de redução do crescimento da economia do País, essas vítimas do inimigo interno simplesmente engavetam a visão que as orientava e comportam-se como se todas as bússolas estivessem desnorteadas. São as que, mesmo sem estar sofrendo os efeitos da crise, já estão mandando dinheiro para o exterior, acumulando dólares como se fossem garantia, esquecendo os planos de investimento, descartando-se dos colaboradores, aqueles mesmos seres humanos em quem depositavam todas as esperanças, o treinamento.
Porque, para o inimigo, o que vale é as toneladas produzidas, o número de produtos, o resto, dizem, é resto. Mas, se há algo que as organizações aprenderam durante os últimos vinte anos, é que nenhuma empresa é uma ilha e o que é material tem menos importância do que é imaterial. Não adianta produzir milhões de toneladas de produtos se eles não refletiam a essência da empresa e não agregam valor para o consumidor. É infrutífero ter o número "certo" de colaboradores eles não estiverem alinhados com a empresa. É inútil ser uma ilha de prosperidade boiando num mar de desgraças. Tudo aquilo que o inimigo interno denomina resto ou supérfluos é o que realmente interessa o que vai determinar se uma empresa vai estar presente no futuro, confirmem-se ou não as previsões pessimistas. Esse inimigo interno não só torce para que tudo dê errado como também trabalhe para isso.
As empresas com visão de longo prazo têm comportamento saudavelmente oportunista. Para elas, toda notícia é boa, pois abre oportunidades de novos negócios. Quando a crise passa, e todas as crises passam, e todas as crises passam, são essas as primeiras empresas a se reerguer, a ocupar os espaços deixados pelas outras, e o fazem num patamar ainda melhor. Os brasileiros, que já viram esse filme, sabem que os burocratas têm um poder de destruição muito maior do que os poetas. As empresas, assim como as pessoas, revelam-se mais nos momentos de crise do que na bonança.
Reinaldo do Carmo de Souza é professor na Universidade de Cuiabá – UNIC pelo Programa de Expansão Universitário – PEU.