Conheci o Coronel do Exército José Meirelles primeiro pelo nome. Em 1976, ele teceu algum comentário político, e sofreu uma punição pela indisciplina. O Exército considerava qualquer fuga do raciocínio da caserna como uma traição política. Na verdade, a labuta de Meirelles contra a dureza do regime já vinha de ensaios anteriores. Conheci-o pessoalmente, na inauguração da rodovia Cuiabá-Santarém, a BR-163 cujo comando de construção foi dele. Era uma tira de terra de 1.100 km aberta no cerrado a partir de Rosário-Oeste até Santarém, no Pará. Fazia parte do projeto estratégico de ocupação da Amazônia brasileira, começando naquele caso, por Cuiabá. O nono Batalhão de Engenharia e Construção – 9º.BEC fora o executor da obra. Deveria acabá-la e ser transferido de Cuiabá, como quando viera do Rio Grande do Sul. Igual a Meirelles, o BEC nunca mais saiu de Cuiabá.
Meirelles era desde então um sonhador incorrigível. Coletou milhares de sementes de manga em Cuiabá para fazer mudas que povoariam as margens da nova rodovia, uma solidão amazônica. Por mais de uma vez pude conversar com ele a respeito da aventura de construir uma rodovia como aquela. Ele tinha a mania de embasar com filosofia todos os seus projetos. Concluiu a construção da rodovia e entrou para a vida pública. Teve vários cargos e em todos eles polemizou muito, com sua personalidade marcantemente social. Tivemos alguns embates quando prefeito de Cuiabá, mas também nos encontramos mais de uma vez em reuniões espíritas na casa do amigo comum, o jornalista Eugenio Carvalho, junto com dona Zulmira Meirelles, e com dona Nize Carvalho.
De lá pra cá nos cruzamos muitas vezes, a maioria de passagem. Mais recentemente nesse campo da filosofia espiritualista. Movido por alguns artigos que escrevi sobre crianças índigo e crianças cristal, ele elaborou uma cartilha que citei em artigo e depois distribuí e ainda distribuo para pessoas que solicitam. Nela, Meirelles diz que se sentiu provocado por mim e também porque queria compreender a modernidade dos seus netos, com quem estava com dificuldades de conversação. Na sua apostila ele me disse isso.
Conversamos bastante por e-mail. Nasceu entre nós uma nova fraternidade além daquela que nos uniu na Loja Maçônica Conquista e Integração, de Cuiabá, onde o visitei algumas vezes.
Meirelles não tinha vida social convencional. Suas aparições eram mais ligadas aos movimentos espíritas assistencialistas que ele e dona Zulmira conduziam. Deixou um legado de família muito forte e um perfil de decência e de caráter sem manchas. Sua convivência era suave, porém, provocativa. Encerrava as suas observações com um inevitável “comprende?”. Na política não foi compreendido porque o espírito de negócios de então e ainda vigente, contrariava a sua inquieta alma do jovem coronel mineiro que ousou questionar velhos dogmas do Exército. Prefeito de Cuiabá, esbarrou no espírito de negócios e saiu da política levando poucas ilusões. Um dia ele me disse: “não estou preparado para a política”. Na verdade, não estava mesmo. Estava à frente das velhas práticas políticas que mantem o poder. Espíritos inquietos sofrem muito. Suas mangueiras não vingaram no solo seco e ácido da Amazônia, mas seu espírito floresce junto com ele na sua nova e justa jornada espiritual.
Onofre Ribeiro é jornalista e ex-secretário estadual de Comunicação Social