“No reino da liberdade as leis devem ser obedecidas porque têm em si
mesmas o fundamento da sua legitimidade, e não porque representem a vontade
do titular de um poder dominador.”
(L. F. Coelho)
A vergonhosa manipulação dos poderes constituídos em nome de interesses
políticos localizados, de grupos ou individuais não é uma prática recente no
Brasil, tampouco incomum. Não raro, ela é utilizada como recurso que,
invariavelmente e fragorosamente afronta a Constituição Federal. O caso de
Rondônia pôs a nu, mais uma vez, a necessidade premente da fiscalização
externa sobre o Poder Judiciário. Observa-se ali, que qualquer juiz em
exercício no país pode eventualmente favorecer a interesses escusos e
particulares por meio de obtenção ou não de benesses materiais ou
imateriais. Pode, como fez o magistrado em questão, preservar o ilícito e
com isso, fomentá-lo ainda mais, já que ele está investido de um poder,
quase incontestável. Pode, enfim e a qualquer hora rasgar em particular ou
em público a Carta Magna brasileira.
A proibição da veiculação de matéria jornalística do programa
“Fantástico”, da Rede Globo de Televisão em que houve um registro gravado de
cenas de extorsão por parte de deputados contra o governador Ivo Cassol
reforça a tese corrente no seio das autoridades jurídicas constitucionais
brasileiras de que, sob a égide da impunidade, há em curso, um crescente
movimento anti-constitucional de cerceamento à liberdade de informação que
vislumbra o retorno da censura aos meios de comunicação, o que é
inconcebível no Estado de Direito.
A sociedade brasileira hoje não pode mais prescindir da importante e
concreta contribuição que a imprensa tem oferecido nos últimos anos às
autoridades. Seja no desvendamento de esquemas de corrupção ativa e passiva,
na revelação de desvios de recursos públicos e outros crimes, seja
veiculando denúncias várias, sua fundamental participação registrando esses
fatos sociais é visível e aprovada por todos os segmentos sociais. Afinal
este é o seu papel. Amordaçar a imprensa é fazer calar a liberdade. É
retroceder da civilização à barbárie. É desrespeitar o cidadão no seu
direito à cidadania.
Não há como permitir que um poder esteja acima de tudo e de todos, sendo
que sua estrutura, seu funcionamento e seus integrantes são sujeitos à
falhas e desvios. Casos como este só reforça a tese da necessidade de se
fiscalizar o exercício de uma função pública cujas decisões atingem
diretamente o cidadão e a sociedade. Se há posições divergentes quanto ao
tema, há que se discutir em profundidade sua viabilidade. O que não se pode
permitir é que a lei não seja cumprida em virtude de peças estragadas de uma
engrenagem vital para um país, que é o seu sistema de leis. O caso em si,
que mancha e desmoraliza o Judiciário é argumento poderoso para retomarmos o
debate. Pois o sistema democrático não é linear e estático e requer
fiscalização constante e regular para que exatamente a liberdade de todos
seja preservada e respeitada em detrimento de decisões isoladas e mesquinhas
e autoritárias que o ferem e o distorcem.
André Xavier é jornalista em Cuiabá
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