A 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso manteve a condenação de um soldado da Polícia Militar pela prática do crime de tortura e fixou pena definitiva de três anos e seis meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado. O crime é tipificado no artigo 1º, inciso II, da lei 9.455, de 07 de abril de 1997. Na análise do recurso de apelação criminal (processo nº. 80754/2007), os magistrados que participaram do julgamento deram provimento parcial ao recurso interposto pelo policial apenas no sentido de afastar as sanções dos crimes de abuso de autoridade e de violência arbitrária, absorvidos pelo tipo penal da tortura.
A pena inicial, de três anos de reclusão, foi aumentada para três anos e meio porque o crime foi cometido por um agente público, o que eleva a pena de 1/6 a 1/3, segundo o relator do recurso, desembargador Juvenal Pereira da Silva. Ele explicou que na doutrina a tortura recebeu autonomia e foi alçada à condição de conduta principal.
Informações contidas nos autos revelam que o soldado submeteu um homem à tortura (intenso sofrimento físico), com emprego de violência, como forma de aplicar um castigo pessoal. O PM alegou que a vítima tinha intenção de seqüestrar uma criança de uma creche no município de Juara. Contudo, ele agrediu a vítima porque eles tinham desentendimento pessoal, já que o PM agressor devia direitos trabalhistas à vítima.
O laudo pericial realizado na vítima revela que as lesões encontradas sugerem espancamento com múltiplas lesões de formatos diferentes, produzidas por instrumentos contundentes. Na região do olho direito, as lesões se tornaram bastante concentradas. Nas plantas dos pés, foi encontrado edema inflamatório severo. Ele apresentou também uma mancha roxa mais severa na região infra-axilar direita. Os peritos concluíram que havia evidências de crueldade.
Em depoimento, a vítima disse que o PM apontou revólver e disse que iria matá-la. O homem contou que levou chutes, foi algemado e recebeu diversos golpes na cabeça com um pedaço de pau, fazendo com que ele desmaiasse. Ele também levou chutes no rosto. O soldado teria ainda pulado com os dois pés em cima da barriga e das costelas dele, além de ter batido com o cacetete na sola dos seus pés. Duas outras testemunhas confirmaram ter visto o PM agredir a vítima.
Em sua defesa, o policial alegou ter agido no estrito cumprimento do dever legal. Contudo, de acordo com o magistrado, a atuação em estrito cumprimento de dever legal pressupõe que se persiga a realização do interesse público relevante. Para tal, o encarregado de cumprir a determinação legal somente poderá valer-se de meios permitidos pela ordem jurídica e de modo que lese o menos possível o interesse dos particulares. “Em especial, deve-se atentar à necessidade de não violar os direitos fundamentais, a não ser na medida expressamente permitida pela Constituição Federal”, salientou o desembargador.
Segundo apurado nos autos, o agente público agiu na contramão da lei, já que o Estatuto Penal exigia-lhe conduta contrária. Em decisão de primeira instância (comarca de Juara), o soldado já havia perdido o cargo. Também fora decretada interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.
Também participaram do julgamento a juíza substituta de 2º grau Graciema de Caravellas (revisor) e a desembargadora Shelma Lombardi de Kato.