A três meses do referendo, em que a população decidirá sobre a venda de armas de fogo e munição no Brasil, a grande maioria dos brasileiros defende a proibição do comércio desses produtos. É o que revela pesquisa do Datafolha realizada no dia 21 de julho com 2.110 pessoas em 134 municípios.
Oito em cada dez brasileiros (80%) defendem a proibição. Outros 17% afirmam ser contra esse impedimento. A margem de erro é de dois pontos percentuais. Apenas 3% não souberam responder à pergunta do Datafolha, idêntica à que será feita no referendo do dia 23 de outubro: o comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?
Caso o “sim” seja a resposta da maioria, o comércio desses produtos ficará proibido. Se o “não” ganhar, a comercialização continuará permitida, mas permanecerão em vigor todas as restrições ao porte e à compra de armas de fogo previstas no Estatuto do Desarmamento, como comprovar aptidão psicológica para o uso e justificar a necessidade da arma.
Será a primeira vez que acontecerá um referendo no país e, também, que se faz um referendo sobre esse tema no mundo. O voto será obrigatório para maiores de 18 anos e menores de 70 anos.
Há mais mulheres no grupo a favor da proibição. Entre elas, 85% dizem ser contra as armas, contra 75% dos homens.
No Nordeste brasileiro, 84% dizem que a venda de armas de fogo deve ser proibida, o maior índice do país. Em oposição, no Sul essa taxa cai para 71%, a menor.
Quanto maior a escolaridade do entrevistado, menor seu apoio à proibição. No ensino fundamental, 16% se dizem contra a limitação. No ensino médio, são 17%. E, no nível superior, são 22%.
O número de pessoas que afirma possuir uma arma de fogo em casa se manteve estável nos últimos seis anos. Em 1999, 8% dos brasileiros disseram ao Datafolha que alguém na residência tinha uma arma. Agora, são 9%.
A partir de hoje fica liberada a propaganda paga para a defesa dos dois lados. Mas a falta de regulamentação deve adiar seu início. Com mais informação, a expectativa é que caia o número de pessoas que dizem não ter conhecimento do referendo (24% dos entrevistados pelo Datafolha).
O diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino, acredita que é provável que ocorra nas próximas semanas uma aproximação dos índices de quem é contra e de quem é a favor à proibição após o início da propaganda gratuita.
“Até agora, o grupo contrário à venda de armas obteve maior destaque na mídia nacional. Com tempos iguais para defender seus argumentos na TV, há uma tendência a nivelar as opiniões. Mas três meses é um período muito curto para uma reversão de números tão distantes (80% contra 17%)”, avalia Paulino.
Em busca do voto de um terço da população brasileira que diz estar mal informada ou não ter conhecimento do referendo, os dois grupos (prós e contras) passarão a estudar a seguinte questão: por que as mulheres e os nordestinos se dizem mais contrários à venda de armas de fogo?
Para a antropóloga carioca Jacqueline Muniz, professora da Universidade Cândido Mendes, parte da resposta pode estar no papel de mediação incorporado pelas mulheres na sociedade brasileira. “Elas tendem a buscar métodos mais pacíficos de resolução de seus problemas e de conflitos familiares”, afirma.
Em relação ao predomínio de opiniões contrárias à venda de armas de fogo no Nordeste, Muniz busca uma resposta na história. “O povo nordestino experimentou um abuso do poder e mecanismos repressivos de imposição da vontade da elite com o coronelismo, que sempre praticou o uso da força, por vezes com armas. O referendo é a oportunidade de garantir direitos, se libertar.”
Já o sociólogo Cláudio Beato, do Centro de Estudos em Criminalidade e Segurança Pública da Universidade Federal de Minas Gerais, vê uma maior receptividade à venda de armas no Sul como um reflexo da sociedade agrária. “Além disso, há indústrias de armamentos no Sul, o que deve influenciar a opinião pública.”