"Estou curioso para saber o que é o tal REDD. Me entregaram um papel escrito REDD e carbono e eu nunca tinha ouvido falar". O sentimento do agricultor Élcio Alves, do assentamento Ena, em Feliz Natal, é o retrato da necessidade que motivou a realização da oficina para capacitação dos agricultores familiares em REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal), realizada em Lucas do Rio Verde. Vinte e cinco representantes de treze instituições se reuniram para conhecer um pouco mais sobre o assunto durante evento realizado pelo ICV (Instituto Centro de Vida) e o Sindicato dos trabalhadores Rurais de Lucas do Rio Verde.
Para conseguir entender o REDD foi necessário, primeiro, passar por alguns temas e conceitos-chave como, emissões de CO² (gás carbônico), efeito estufa e aquecimento global, e perceber como o desmatamento está intrinsecamente ligado ao quadro climático. "Hoje, o desmatamento é uma das principais fontes de emissões de CO² na atmosfera e isso reflete na agricultura, já que com mais CO² na atmosfera, mais calor, e isso altera várias coisas, inclusive o ciclo das chuvas", explicou Marcos Scaranello, analista de carbono florestal do ICV.
Para a agricultora Maria Maia as mudanças climáticas estão cada vez mais visíveis. "De 1981, quando eu me mudei para Mato Grosso, até agora, as coisas mudaram muito no clima, e esse ano está mudando mais ainda, as chuvas estão cada vez mais fora de época", retratou.
Outro ponto importante da oficina foi a discussão a respeito do pagamento por serviços ambientais. Por serem considerados gratuitos, já que derivam da natureza, esses serviços, até pouco tempo, não eram medidos nem valorados. Conceito que está mudand o.
Mas quem vai pagar e como compensar os agricultores familiares pelos serviços ambientais prestados? Segundo João Andrade, coordenador do programa Governança Florestal do ICV, já existem potenciais interessados e mecanismos em construção.
A partir desse nivelamento sobre o REDD, os representantes da agricultura familiar identificaram os potenciais benefícios que o mecanismo pode levar para as comunidades, como apoio e incentivo para alternativas sustentáveis e melhoria da qualidade de vida no local. Contudo, as atuais incertezas ligadas ao estágio em que se encontram as negociações nacionais e internacionais sobre o mecanismo levaram os agricultores a levantar, também, riscos e desafios que o REDD poderá trazer. Assim, elementos como a capacitação das associações em gestão de recursos, a assistência técnica ou o apoio à regularização da situação fundiária dos assentamentos foram considerados chave para o mecanismo ter o sucesso esperado.
Esse map eamento dos riscos, desafios e potenciais benefícios do REDD facilitou a participação à consulta sobre princípios e critérios que foi realizada no segundo dia da oficina em Lucas.
Para Vivian Franco, engenheira agrônoma do ICV que trabalha diretamente com os agricultores familiares, foi importante "orientar e socializar a informação do tema REDD e capacitar os agricultores para que eles elaborem um documento com princípios e critérios do coletivo".
Princípios e Critérios
Consciente da situação de riscos criada pelas indefinições atuais do contexto de REDD, a sociedade civil organizada criou um Comitê de Elaboração e Revisão dos Princípios e Critérios Socioambientais do REDD+ que recebe contribuições da sociedade através de uma consulta pública aberta até o dia 30 de abril.
Neste sentido, a oficina de REDD para agricultores familiares fez parte desta iniciativa e permitiu aos atores se posicionar sobre a primeira versão dos princípios e critérios. O documento elaborado nessa oficina será enviado para o IMAFLORA (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola) e poderá também servir para outras discussões como o atual processo de construção da lei estadual de mudanças climáticas.