Os municípios mato-grossenses registraram 8.521 assassinatos, latrocínios e lesões corporais seguidas de morte nos últimos oito anos. Os dados constam nos Anuários Brasileiros de Segurança Pública publicados desde 2005 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A média de crescimento do número de casos em Mato Grosso entre a primeira publicação e a última, lançada ontem, é de 30%. O último levantamento, referente a 2013, aponta que somente no ano passado foram 1.152 mortes envolvendo essas três situações no Estado. Entre 2012 e 2013 a média de aumento no número de casos em todo o país é de 1,1%, enquanto em Mato Grosso é de 10%.
O resultado do levantamento é sentido no cotidiano da Polícia Civil que atua nas investigações dos casos de homicídios. Titular da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), Silas Caldeira, frisa que o aumento da violência é perceptivo em todo o país e a forma como se faz segurança pública atualmente precisa ser repensada.
Pontua que os índices são reflexos da falta de crédito da população na Justiça, da confiança na impunidade, da desvalorização à vida e da demora do sistema público em dar uma resposta ao cidadão quanto à punição. Outro fator forte que contribui para o cenário é o alto consumo de drogas e a pouca estrutura das instituições.
Comenta que atualmente os homicídios não demonstram motivações e por qualquer desentendimento mata-se. “Identificamos que em muitos casos as vítimas são mortas por motivos banais, desentendimentos fúteis”.
O aumento do tráfico de drogas e o envolvimento cada vez maior com o uso de entorpecentes têm relação direta com os crimes de violência. Os casos investigados pela DHPP confirmam esta realidade. Professor do Departamento de Sociologia e Ciência Política da UFMT, Naldson Ramos, complementa que faltam políticas públicas para coibir o envolvimento de jovens com o mundo do crime. Pontua que enquanto os investimentos forem direcionados para a repressão, sem pensar em prevenção, a situação se repetirá todos os anos. “O que vemos hoje faz parte da política perversa que insiste em investir somente na repressão, mas não atua nos fatores indutores da violência”. Ramos destaca que segurança pública são todas as ações realizadas para garantir que o cidadão viva com segurança, envolvendo medidas que vão além do policiamento ostensivo.
Os trabalhos da Polícia e da Justiça são importantes e devem estar presentes sempre, mas sozinhos não resolvem o quadro que está instalado. A atuação dos dois entes precisa ainda ser melhorada para garantir credibilidade, aponta o sociólogo. Ele destaca que a taxa de esclarecimento de crimes sem testemunhas no país é muito baixo, na faixa de 5%. A maior parte dos casos envolve pessoas de baixa renda, que vivem em áreas periféricas. “Associado a isso temos a morosidade da Justiça, inquéritos concluídos sem provas materiais e terminam sendo arquivados. Tudo isso resulta em impunidade e descrédito”.
Como forma de prevenção e mudança efetiva do cenário, o delegado e o sociólogo frisam a necessidade de uma ampla reforma na maneira como o Poder Público faz as políticas voltadas para a segurança. “Os gestores precisam enfrentar os debates e visualizar a necessidade dessa mudança de uma maneira mais ampla”, diz Ramos.
As ofertas de lazer, cultura, esporte, educação, qualificação profissional, trabalhos de prevenção ao uso de drogas são apontadas como medidas protetoras, que evitam a inserção de crianças e jovens no mundo do crime. “Esse conjunto de fatores desenvolve a cidadania dessas pessoas e isso reflete em uma valorização à vida, cria conceitos sociais importantes”, conclui o sociólogo.
