O tráfico de drogas não compreende apenas a conduta de vender. É certo que ter em depósito, guardar e expor à venda também fazem parte do tipo penal. Com esse entendimento, a Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso negou provimento a Apelação Criminal interposta por um condenado por tráfico de drogas. O apelante interpôs o recurso requerendo, em síntese, sua absolvição por falta de provas da condenação pela Justiça de Jaciara. Ele fora condenado a cinco anos de reclusão e ao pagamento de 500 dias-multa, pena a ser cumprida em regime inicialmente fechado, pela prática do crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06.
Consta dos autos que após diversas denúncias anônimas de que havia R$ 8 mil em moeda falsa (notas de R$ 50) na residência do condenado, a Polícia Militar deslocou-se até o local e avistou R.M.C. dispensando pela janela 77 "petecas" de pasta base de cocaína. Na ocasião, foram apreendidos os entorpecentes e a quantia de R$ 95,00, além de diversos objetos sem origem e notas fiscais, supostamente oriundos da troca do produto ilícito por usuários. Outras duas pessoas foram presas por tráfico de drogas na mesma operação, uma que estava na casa e outra em local distinto.
Durante depoimento, o apelante e um amigo confirmaram ser os donos do entorpecente e que haviam pagado R$ 400 pelo montante que seria consumido pela dupla. Segundo a PM, no momento da prisão, eles estavam confeccionando embalagens individuais de pasta base de cocaína destinadas à venda. Foram apreendidas ainda diversas sacolas plásticas, tesouras e velas, objetos corriqueiramente utilizados por traficantes para confecção das "trouxinhas". O acusado desmentiu a versão policial e alegou que a Polícia agrediu tanto ele quanto seu primo para obrigá-los a confirmar que vendiam entorpecentes. A versão foi confirmada pela esposa do apelante.
Para o relato do recurso, desembargador Pedro Sakamoto, os elementos reunidos nos autos são suficientes para a condenação do apelante, sobretudo diante das declarações dos policiais que efetuaram a prisão e confirmaram, diante das circunstâncias do flagrante, que a droga encontrada se destinava à comercialização. "Oportunamente, assevero que, em conformidade com a pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, entendo que o testemunho policial, sobretudo quando convergente com as demais provas dos autos, possui idoneidade suficiente para embasar a condenação criminal".
Na decisão, o magistrado ressaltou que as diligências tiveram início em razão da suspeita de dinheiro falso em poder do apelante e, no decorrer destas, também foram colhidas informações acerca do comércio ilícito de entorpecentes. "Logo, constata-se que os policiais não agiram sem motivo aparente, uma vez que somente após a indicação sobre prática do ilícito penal pelo acusado é que realizaram a abordagem, que resultou na prisão em flagrante do recorrente", assinalou o desembargador, lembrando ainda sobre a apreensão de drogas e de outros objetos como invólucros plásticos, tesouras e velas, objetos destinados à preparação das "trouxinhas" de drogas.
Com base no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, o relator apontou que a prática de qualquer das condutas existentes é suficiente para a configuração do tráfico ilícito de drogas, "não sendo exigidos atos de venda propriamente ditos". Apontou ainda que a circunstância de ser usuário de drogas não o exime da responsabilidade criminal. "Lamentavelmente, os viciados utilizam o tráfico como meio para sustentar o vício".
O voto foi seguido pelo desembargador Gérson Ferreira Paes (revisor) e pelo juiz Rondon Bassil Dower Filho (vogal convocado).