O Supremo Tribunal Federal declarou ser inconstitucional a lei estadual 7.604/2001, que instituiu o Sistema Financeiro de Conta Única de depósitos judiciais no Tribunal de Justiça de Mato Grosso. A lei destina ao Poder judiciário o lucro das aplicações financeiras dos depósitos efetuados pelas partes. A decisão ocorreu por maioria, em Ação Direta de Inconstitucinalidade (ADI) proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil, a pedido da seccional da entidade em Mato Grosso.
Em abril de 2002, o então presidente da OAB/MT, Ussiel Tavares, encaminhou requerimento ao Conselho Federal da OAB em Brasília, que tem legitimidade para figurar no pólo ativo da ADI no Supremo.
"A Conta Única permite ao Poder Judiciário usar o dinheiro do particular, depositado em juízo, para investimento no mercado financeiro. E a maior parte dos lucros vai para o Funajuris", protestou, na época, o presidente da OAB/MT, Ussiel Tavares. De acordo com ele, a lei prevê que a parte vencedora do litígio receba apenas a correção equivalente aos juros da poupança, ficando o restante do lucro da aplicação para o Poder Judiciário.
O artigo 10 da lei considerada inconstitucional pelo STF diz que "as receitas provenientes da aplicação desta lei serão transferidas ao Fundo de Apoio ao Judiciário – Funajuris , que as manterá em contra específica denominada Poder Judiciário/Rendimentos Conta Única".
No entendimento do STF, houve vício formal de iniciativa, já que as leis foram propostas pelo Judiciário estadual, que não tem legitimidade para tanto. E houve ainda vício formal pela invasão de competência da União, única que pode legislar sobre direito civil e processual.
Lei de MT é uma pérola de extravagância, diz ministro
Conforme o ministro do STF, Marco Aurélio, relator da ADI 2855, a lei aprovada pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, que cria a Conta Única é "uma pérola em termos de extravagância" porque o Judiciário estaria se beneficiando dos depósitos à disposição da Justiça. "Parece que o Judiciário está de pires na mão", criticou.
"O que tem o Judiciário em termos de participação com o que é depositado? Que receita é essa que decorre do patrimônio de cidadãos que estão em litígio?" questionou o ministro.
Segundo ele, não fossem os vícios formais das leis, ainda assim haveria conflito "escancarado" com o sistema consagrado pela Constituição. "Não pode o Judiciário pegar uma carona na controvérsia que está em juízo para ter receita", concluiu Marco Aurélio.
Nessa mesma linha, a ministra Cármen Lúcia classificou como "grave" a produção de leis estaduais que destinam ao Judiciário os valores decorrentes das aplicações de depósitos judiciais feitos pela populaçã o. Para ela, se a Constituição Federal veda aos juízes, no artigo 95, receber custas ou participação nos processos, o Poder Judiciário – composto por juízes – não poderia receber o lucro decorrente das aplicações de depósitos judiciais. "Na verdade é uma expropriação, um quase confisco", definiu Cármen Lúcia.
Além de Mato Grosso, a decisão do STF atingiu leis estaduais do Rio Grande do Sul e do Amazonas, que também criaram Conta Única de depósitos judiciais no Poder Judiciário.