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Justiça suspende normativa da Funai em Mato Grosso e mais sete estado

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Redação Só Notícias (foto: assessoria)

A Justiça Federal suspendeu em Mato Grosso e mais sete estados os efeitos da Instrução Normativa 9, da Fundação Nacional do Índio (Funai), que alterou os critérios para a emissão de Declaração de Reconhecimento de Limites (DRL) por meio do Sistema de Gestão Fundiária (Sigef), gerido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Com a instrução, proprietários ou possuidores de terras poderiam emitir a declaração para áreas dentro do limite de terras indígenas ainda não homologadas pelo governo federal brasileiro.

O Ministério Público Federal (MPF) considera que a instrução viola direitos constitucionais dos povos indígenas, favorece a grilagem de terras públicas e agrava conflitos agrários. Ao todo, procuradores da República ajuizaram 28 ações judiciais na 1ª instância da Justiça Federal, pedindo a suspensão da IN 09, com 19 decisões judiciais favoráveis. Atualmente, além de Mato Grosso, a norma da Funai está suspensa por ordens judiciais no Pará, Amazonas, Acre, Roraima, Rondônia, Bahia e Rio Grande do Sul, o que, segundo o MPF, “garante a proteção de mais da metade das terras indígenas brasileiras”.

Em recursos à 2ª instância, o governo federal até agora conseguiu reverter três liminares no Mato Grosso do Sul e suspender duas, em Santa Catarina e no Ceará. Duas liminares foram negadas, nas subseções judiciárias de Dourados (MS) e Foz do Iguaçu (PR), e o MPF aguarda decisão sobre recursos nesses dois casos. Das 28 ações civis públicas ajuizadas sobre o tema em todo o país, seis ainda estão pendentes de apreciação, em Belém (PA), São Luís (MA), Carazinho (RS), Vilhena e Ji-Paraná (RO) e São Paulo (SP). Quatro das liminares deferidas já foram confirmadas por sentenças, em Santarém (PA) e Castanhal (PA), Rio Branco (AC) e Boa Vista (RR). Em uma das ações judiciais iniciadas pelo MPF, em Belo Horizonte (MG), houve declínio de competência.

O MPF sustenta nas ações judiciais que instrução normativa contraria o caráter originário do direito dos indígenas às suas terras e a natureza declaratória do ato de demarcação; cria indevida precedência da propriedade privada sobre as terras indígenas, em flagrante ofensa à Constituição; representa indevido retrocesso na proteção socioambiental; incentiva a grilagem de terras e os conflitos fundiários; entre outros problemas. As decisões judiciais obtidas determinam a manutenção das áreas indígenas ainda não homologadas no Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) e no Sistema do Cadastro Ambiental Rural (Sicar).

Os juízes federais que concederam liminares ao MPF têm apontado o desrespeito ao texto constitucional e a subversão da missão institucional da Funai. Em uma das sentenças, exarada no Pará, a Justiça assinala que “a Funai, de forma pouco usual, adota uma retórica em prol dos não índios, o que causa certa estranheza em razão de seu dever de garantir o cumprimento da política indigenista”.

Para a Justiça Federal, ao permitir que particulares recebessem declarações de propriedade sobre áreas já caracterizadas como terras indígenas, a Funai utilizou-se de sua própria “ineficiência” em concluir os processos de demarcação “para onerar os povos tradicionais, retirando deles a segurança jurídica de alcançar o direito originário às terras ocupadas por eles, por meio da homologação, o que lhes é garantido pela Constituição Federal”.

“A instrução normativa da Funai não resolve o problema original enfrentado pelos indígenas no Brasil nem o dos possuidores de lotes rurais, lentidão no processo de demarcação de terra indígena, pelo contrário, com a justificativa de proteger o direito de propriedade de particulares, fere o direito originário de posse dos índios. Ainda transfere o ônus da ineficiência para os povos indígenas”, diz uma das decisões.

Em abril de 2020, 49 procuradoras e procuradores da República de 23 estados assinaram recomendação que foi encaminhada ao presidente da Funai para que o ato administrativo fosse anulado. Com a negativa da Funai em cumprir a recomendação, o MPF precisou recorrer ao poder Judiciário.

Levantamento feito pela Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR/MPF) em junho do ano passado constatou que há quase 10 mil propriedades sobrepostas a terras indígenas que estão em diferentes fases de regularização ou em áreas com restrição de uso. O estudo foi encaminhado a procuradores da República em todo o país e subsidia a atuação no combate à grilagem e aos crimes ambientais em terras indígenas, bem como às violações dos direitos humanos desses povos.

A pesquisa foi feita pela Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise da Procuradoria-Geral da República, a pedido da 6CCR, e considerou dados extraídos do Sistema do Cadastro Ambiental Rural, vinculado ao Serviço Florestal Brasileiro, no período de 21 a 31 de maio de 2020. Ao todo, foram identificados 9.901 registros de propriedades no CAR cujos limites coincidem com territórios indígenas ou com restrição de uso, ou seja, áreas interditadas pela Funai para proteção de povos indígenas isolados, com o estabelecimento de restrição de ingresso e trânsito de terceiros.

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