O presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Márcio Meira, disse ter sido surpreendido pela decisão dos índios da etnia Ikpeng, do Xingu, de fazer reféns 12 servidores da instituição e técnicos que realizavam um estudo de impacto ambiental no Rio Culuene. Segundo ele, antes da viagem à região, a Funai solicitou aos líderes indígenas autorização para o trabalho no Alto Xingu, inclusive dos Ikpeng.
Em entrevista à TV Brasil, Meira afirmou suspeitar que os Ikpeng foram “manipulados” para tomar tal atitude. Ele não disse, no entanto, de quem teria partido a manipulação. “Nós suspeitamos, não temos certeza, que eventualmente até tenham influências ou manipulações que a gente não sabe [de quem partiu] para que esses índios tenham tomado essa atitude.”
A Funai fez um acordo com os guerreiros da tribo para que uma delegação de 40 representantes viesse neste fim de semana a Brasília negociar a liberação dos reféns. A previsão era que o grupo se reunisse com Márcio Meira amanhã, mas o encontro foi adiado porque os indígenas resolveram fazer uma assembléia para escolher os guerreiros que participarão das negociações.
O avião para transportar os Ikpeng da aldeia ao município de Canarana e o ônibus para a viagem a capital federal estão à espera dos índios.
O presidente da Funai disse que está em contato permanente com as lideranças dos Ikpeng. Ele descarta qualquer possibilidade de ir ao Alto Xingu negociar diretamente com os líderes enquanto os servidores da instituição e os pesquisadores forem mantidos reféns. “Essa é a posição do Ministério da Justiça”, ressaltou.
A aeronave que está no local levou medicamentos e mantimentos aos índios e reféns. Uma das pessoas retidas pelos Ikpeng é hipertensa e necessita de medicação de uso contínuo.
Os oito pesquisadores retidos realizavam um estudo de impacto ambiental sobre os efeitos que uma central hidrelétrica de pequeno porte, construída, segundo Meira, fora das terras indígenas, poderia causar à 14 etnias do Alto Xingu. “A Funai exigiu da companhia que construiu a hidrelétrica que fizesse um estudo detalhado para que a gente pudesse ter meios de compensar eventuais impactos que essa hidrelétrica causaria para as águas dos rios formadores do Rio Xingu”, disse ele.
Para a representante da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) em Brasília, Valéria Paye Pereira, é difícil haver qualquer influência externa na decisão tomada pelos Ikpeng. O problema, segundo ela, concentra-se no fato de o governo federal não consultar as tribos do Xingu no processo de construção de hidrelétricas.
De acordo com Valéria, as obras são danosas aos rios do Xingu, uma vez que “prejudicam suas nascentes, poluem suas águas e comprometem a pesca, principal base alimentar dos índios da região”. As hidrelétricas, explicou, interrompem o processo de procriação dos peixes (piracema), tornando mais escasso o principal alimento dos indígenas.