Setenta e cinco por cento do lixo urbano de Mato Grosso têm destinação inadequada e colocam em risco a saúde da população, aponta estudo inédito realizado pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). No ranking brasileiro, o Estado está em 4º lugar com o pior índice, atrás de Alagoas (96,9%), Roraima (89,8%) e Rondônia (96,4%). Mas, a própria Secretaria de Estado de Meio Ambiente confirma que a quantidade de resíduos sólidos urbano desviada para ruas, rios e lixões ultrapassa o percentual. Das 500 toneladas de lixo coletada por dia na Capital, por exemplo, 50% são restos de alimentos e 30% de outros materiais que poderiam ser reciclados.
Todos os dias, os mato-grossenses produzem 2.989 toneladas de resíduos sólidos, sendo que 20% não são coletados pelas prefeituras, as responsáveis diretas pelo serviço. Do montante recolhido, apenas 24,5% têm destinação correta os aterros sanitários, espaços apropriados, que preservam a área e oferecem tratamento aos resíduos sem colocar em risco a saúde das pessoas. Por dia, cada habitante em Mato Grosso gera 0,958 quilo de lixo, o 10º índice brasileiro mais elevado. A taxa estadual está abaixo do índice nacional, 1,08 quilo de resíduos sólidos gerado por pessoa, porém bem mais elevado do que há 20 anos.
O doutor em meio ambiente e professor da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Paulo Modesto, analisa que o mato-grossense quase dobrou a geração de lixo. O incremento foi de cerca de 418 gramas por dia desde a década de 90. Os hábitos de consumo de produtos, que passaram a dispor de mais embalagens, atrelado ao desperdício de comida, principalmente, acarretaram o aumento. A destinação de restos de alimentos, cascas de frutas, verduras e outros compostos representam hoje 50% do lixo gerado pelos cuiabanos e poderiam ser reciclados. Todo este material tem potencial para se tornar composto orgânico.
Outros 30% são materiais como vidro, metais e plásticos, que também poderiam ser reciclados. Apenas 20%, segundo Modesto, são realmente resíduos sólidos rejeitados e têm necessidade de ir para aterro sanitário. Em Cuiabá, somente de 3 a 4% do montante de lixo coletado é reciclado pela cooperativa de catadores.
Existem em torno de 700 catadores trabalhando irregularmente na ruas da Capital e que poderiam contribuir no processo de forma inteligente. “É possível avançar como Londrina (PR), a coleta seletiva é um exemplo, mas falta vontade política e investimento”.
Para Modesto, a universalização da coleta e a taxa pelo serviço também devem ser defendidas. Em Cuiabá, 30 toneladas de lixo deixam de ser recolhidas todos os dias pelos caminhões. O destino são lugares conhecidos da população, como córregos, rios, terrenos baldios, ruas, um perigo à saúde, pois além das substâncias tóxicas disponíveis em determinados materiais, há o chorume, o líquido gerado a partir do lixo doméstico.
Somente com 100% do que é produzido sendo coletado será possível tratar adequadamente o lixo, um item que nunca deixará de existir. Na opinião de Modesto, as pessoas precisam se sensibilizar e pensar em reduzir a geração de lixo.
Por mês, a Prefeitura de Cuiabá desembolsa R$ 1,5 milhão com a coleta de lixo terceirizada. A Companhia de Saneamento da Capital (Sanecap) é responsável pelo gerenciamento do aterro sanitário desde maio de 2010, por meio de convênio e no momento constrói uma segunda célula.
Precário
Noventa por cento dos municípios mato-grossenses destinam os resíduos sólidos urbanos para lixões a céu aberto, colocando em risco diretamente a qualidade de vida da população.
Apenas 13 têm Licença de Operação (LO), pré-requisito expedido pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) para funcionamento de um aterro sanitário. Mas, ainda com a LO, a maioria não coloca em prática o tratamento correto do lixo. Barra do Garças (a 509 km a Leste da Capital), por exemplo, abriu um aterro, mas por falta de estrutura operacional retornou ao processo antigo.
A analista ambiental e coordenadora de gestão de resíduos sólidos da Sema, Solange Cruz, relata que os municípios enfrentaram problemas na continuação do processo, por ausência de equipamentos e pessoal técnico especializado. Operar um aterro requer um projeto municipal de resíduos sólidos e metodologia de operacionalização, itens que estão longe da realidade de muitos municípios.
Nas outras 128 cidades, que nem chegaram ao passo da LO na Sema, um dos entraves seria a dificuldade em encontrar um terreno adequado para o aterro, que precisa ter lenço freático profundo, estar longe de aeródromos e córrego para evitar contaminação. O gás metano (CH4), por exemplo, é inflamável e pode provocar acidente se escapar por fissuras no solo.
O Plano Nacional de Resíduos Sólidos, sancionado no ano passado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, prevê que até 2014 todos os municípios destinem o lixo para aterros sanitários. Mas, a Sema formula política estadual no mesmo sentido com objetivo de antecipar a ação. “A destinação incorreta é muito maior que 75,5% e somente o que não é reciclado deve ir para o aterro sanitário”.