sábado, 20/abril/2024
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Desmatamento em Mato Grosso pode ajudar na integração lavoura-pecuária

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O pesquisador do Programa de Ciência Ambiental da USP e da Embrapa, Alexandre Coutinho, apresentou um estudo sobre a relação das queimadas e a expansão da atividade agropecuária no Estado do Mato Grosso, que registra a maior taxa de desmatamento do País. Segundo Coutinho, quando cruzados os mapas das queimadas e o mapa do uso do solo no Mato Grosso, fica claro que o avanço da pecuária e da soja está ocorrendo exatamente em cima de áreas aptas para as atividades.

O avanço da fronteira agrícola sobre a Amazônia esquentou o debate no 12º Congresso da Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural (Sober). O tema surgiu no painel sobre integração lavoura-pecuária. O professor da Faculdade de Economia da USP (FEA-USP) e ex-secretário de política agrícola no primeiro mandato de Fernando Henrique, Guilherme Dias, defendeu que o governo crie estímulos para incentivar a expansão do sistema integrado, com a agricultura de grãos e soja em rotação com a pecuária.

Dias destaca que esse sistema permite um aumento de produtividade da pecuária, que poderia crescer sem abrir novas áreas. Da mesma forma, também a área agrícola, especialmente para a soja, aumentaria, com a liberação de áreas já desmatadas pela pecuária.

Pelos cálculos do economista, seria possível aumentar a produção pecuária brasileira em 30% em 10 anos usando 21 milhões de hectares, menos da metade do total de pastos degradados do País (em torno de 50 milhões de hectares). No sistema de rotação, ficariam disponíveis cerca de 4 milhões de hectares para lavoura, o que permitiria atender a demanda de terras para a ampliação da produção de soja nesse período. “Seria um processo para frear a ocupação na fronteira agrícola e para melhorar o uso do solo no Brasil”.

Segundo Dias, com essa liberação de terras, diminuiriam os incentivos ao desmatamento que hoje ocorre na região Amazônica. “O sistema de ocupação na fronteira agrícola vem se mantendo no País nos últimos 100 anos, com agentes na região sendo estimulados a desmatar a floresta para ocupar a terra. A pecuária entra nas áreas amazônicas como forma de garantir a posse da terra, sem uma preocupação com produtividade. O invasor explora a terra sem nenhum cuidado e depois revende para agentes mais organizados, como pecuaristas tecnificados ou agricultores”.

O governo precisa desenvolver políticas públicas para desestimular esse processo de ocupação desorganizado e destruidor. Para ele, uma das saídas seria a integração lavoura-pecuária.

Na opinião do pesquisador, os dados mostram que a agricultura (principalmente a soja) se expande sobre áreas de pecuária, que por sua vez são empurradas mais ao norte.

Gervásio Castro de Rezende, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), disse durante o debate no painel sobre integração lavoura-pecuária da Sober que há uma confusão em relação ao tipo de vegetação que é considerada mata de transição. Ele criticou, por exemplo, quem chama a área de floresta de transição.

“Isso gera uma confusão. Parece que tudo é floresta amazônica. O crescimento agrícola no Mato Grosso acontece exatamente nessa zona de transição e não na floresta propriamente. Eu temo que a proteção à floresta amazônica se transforme em nova barreira protecionista contra a agropecuária brasileira.”

Coutinho destaca que seu levantamento confirma que o desmatamento está ocorrendo na chamada mata de transição e não na floresta tropical. Ele acredita que a maior parte da floresta não é propícia para a agricultura, mas que pode ser viável para a pecuária.

Como os incentivos para o avanço da pecuária, com a ajuda da produção de soja, estariam ainda ativos, o temor de pesquisadores e ambientalistas é a constante expansão dessas atividades. A integração lavoura-pecuária surge então como alternativa para manter o crescimento agrícola sem a necessidade de desmatamentos.

A Embrapa vem estudando esse sistema há 15 anos. Segundo Ivo César, pesquisador da Embrapa Gado de Corte, os estudos mostram que o sistema é muito rentável, mais do que a produção não integrada e que é mais sustentável. Ele ressalta, porém, que a tecnologia ainda não foi adotada mais amplamente no País porque existem resistências por parte dos pecuaristas, principalmente, que não querem correr riscos com lavouras, e também por falta de recursos para investir nas mudanças da propriedade.

O chefe da assessoria de gestão estratégica do Ministério da Agricultura, Elisio Contini, disse que o governo está preparando um programa de estímulo à integração lavoura-pecuária para exatamente quebrar essas resistências. O projeto já tem R$ 2 milhões destinados pelo fundo setorial do agronegócio. Os recursos estão sendo usados no primeiro momento na capacitação do produtor e dos extensionistas.

Segundo Contini, a idéia é que o programa também inclua plano de recuperação ambiental, a averbação das reservas legais e o subsídio do custo para iniciar o sistema. O objetivo é recuperar 20 milhões de hectares em pastagens degradadas.

O ponto mais importante para resolver o conflito entre conservação e conversão da floresta amazônica é definir os direitos de propriedade na região. A opinião é do pesquisador do Ipea, Ronaldo Seroa da Motta. Ele acredita que o governo deve interferir no sistema de ocupação da região, desestimulando a posse da terra pelo desmatamento. “O ideal é que o governo fizesse leilões públicos de terras para agentes econômicos organizados”, disse.

Em seu trabalho “Desmatamento na Amazônia: causas, custos e opções de política”, apresentado hoje no 12º no Sober, Motta compara o valor de deixar a floresta em pé com os ganhos possíveis com desmatamentos.

Segundo ele, considerando todos os ganhos com o uso da floresta, como projetos de ecoturismo e manejo sustentável, até ganhos potenciais que não podem ser capitalizados hoje, como o seqüestro de carbono ou recebimentos com a bioprospecção, seria possível obter US$ 108 por hectare de floresta. Desse total, porém, somente US$ 38 vão efetivamente para o bolso dos agentes econômicos, que exploram a Amazônia.

Em comparação, o estudo aponta que um arrendamento de terra para a pecuária gera no mínimo US$ 60 por hectare. Ou seja, é muito mais interessante para quem está na Amazônia desmatar, conclui Motta.

Ele acredita que com a regulação da propriedade na região diminuiria a corrida do desmatamento e seria possível organizar melhor a ocupação econômica da região.

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