Nos últimos 8 anos foram registrados 53 acidentes aéreos em Mato Grosso que resultaram na morte de 232 pessoas. O número de mortos corresponde a 25% dos falecidos neste tipo de acidente em todo o Brasil, no mesmo período. No país morreram 916 pessoas, em 585 acidentes registrados de 1999 até o final de 2007.
O maior número de acidentes em Mato Grosso acontece com aeronaves pequenas, utilizadas principalmente na atividade agrícola. Segundo uma fonte ouvida pela reportagem, 50% dos tragédias no Estado são provocados pelo uso de combustível irregular. “Um dos grandes problemas é que aeronaves que não são homologadas para operarem com álcool, mas operam com este combustível”, afirma a fonte.
O uso de combustível irregular é, por sinal, o conteúdo do primeiro boletim emitido pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), este ano. Trata-se do “Alerta de Vôo”, um informativo que começou a ser publicado para avisar pilotos sobre segurança e a prevenção de acidentes. No primeiro alerta, a Anac chama atenção para a possibilidade de o tripulante de uma aeronave com motor convencional utilizar outro combustível e não a gasolina de aviação prevista no manual do fabricante.
A agência destaca que durante investigação, o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) descobriu que uma aeronave com motor convencional foi abastecida com querosene de aviação e não gasolina.
A investigação é referente ao acidente com uma aeronave Cirrus SR22, que decolou do aeroporto de Jacarepaguá (RJ), com destino a Santa Catarina. Durante a subida, a aeronave perdeu potência e caiu em cima de um prédio. Os quatro ocupantes da aeronave morreram. Em vários relatos de acidentes em Mato Grosso, a perda de potência do motor está presente.
Além do abastecimento irregular, outros problemas são apontados por pessoas que trabalham com aviação em Mato Grosso. Nesta lista ainda estariam o alto risco da aviação agrícola, a pouca experiência de alguns pilotos que são contratados por um custo mais acessível pelas empresas, a operação em pistas irregulares nas fazendas, a deficiência na manutenção das aeronaves e a falta de fiscalização por parte da Anac.
Problemas mecânicos – Um relatório de Divulgação Operacional da Divisão de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Dipaa) da Anac, disponível no site da agência, relata um acidente em Mato Grosso provocado por problemas mecânicos. De acordo com a Agência, estes relatórios são divulgados com o objetivo de prevenir futuros acidentes.
O relatório é sobre perda de controle em vôo. A aeronave era utilizada para aplicação de defensivos agrícolas em Alto Garças, quando, durante a realização de uma curva para retorno à área de aplicação, o piloto perdeu o controle do aileron.
A aeronave continuou em curva pela esquerda até colidir com o solo com a ponta da asa esquerda, provocando danos generalizados em várias partes e componentes. O piloto sofreu lesões leves.
Na análise do acidente, o Dipaa aponta que o piloto estava com parte de sua habilitação válida, mas com seu certificado IFR (vôo por instrumentos) vencido. Foi encontrado, no exame dos destroços, o parafuso de fixação da haste do aileron partido e fora das especificações do fabricante. O parafuso era de dimensões menores que o original, vindo a cisalhar por não resistir ao excesso de esforços.
A Divisão faz recomendações de segurança e neste caso alerta as oficinas de manutenção de aeronaves aeroagrícolas sobre a importância da utilização de material previsto pelo fabricante nos serviços de manutenção e reparo da aeronave e aos pilotos quanto a importância de acompanharem os serviços realizados na aeronave pela manutenção e de se realizar inspeções antes de cada vôo, principalmente em superfícies de comando.
Pilotos envolvidos em acidentes em Mato Grosso também não tinham habilitação. É o caso, por exemplo, de um acidente ocorrido em março de 2005. A aeronave Cessna decolou de Rondonópolis, com destino à Fazenda Xapuri, cerca de 35 minutos de vôo a Oeste, região do Pantanal Mato-grossense. Havia muita nebulosidade baixa, com formações de chuva isoladas em toda a rota. O piloto, que não possuía habilitação para o vôo em condições IFR (vôo por instrumentos), fez o plano de vôo visual e aguardou algumas horas para obter melhores condições, porém decolou com uma passageira ainda sob condições marginais de visibilidade. Após cerca de dez minutos de vôo, a aeronave colidiu com o solo, ficando totalmente destruída. Os dois ocupantes faleceram. Outro caso semelhante aconteceu com a aeronave particular EMB-710 D (Carioca), prefixo PT-RLI. Em dezembro de 1999 ela decolou de Vila Rica, com destino a Goiânia, com cinco pessoas a bordo. A pessoa que pilotava não estava habilitada para voar e a aeronave não era homologada para o vôo IFR. Após 1h20 de vôo, passou a enfrentar uma tempestade. Testemunhas disseram ter avistado a aeronave sair da camada de nuvens a baixa altura e em seguida colidir com o solo. Os cinco ocupantes faleceram.
Outra irregularidade foi detectada no acidente em novembro de 2003. Uma aeronave que decolou de uma pista da Fazenda Porteira Velha, em Colniza. O piloto não era habilitado. A bordo havia mais quatro passageiros. O objetivo do vôo era realizar uma semeadura de pasto em uma área próxima a uma floresta. Além do piloto não habilitado, a aeronave havia sido adaptada irregularmente para esse tipo de aplicação, tendo sofrido alterações em sua aerodinâmica. Ao realizar uma passagem baixa, ocorreu a colisão da asa esquerda com uma castanheira, o que ocasionou a perda de controle e a queda vertical na floresta. Os cinco ocupantes faleceram.
Em 2007 foram registrados 93 acidentes aéreos no país, número superior ao registrado nos últimos 10 anos. O número destes acidentes só tinha sido maior antes de 1997. Em 1996, por exemplo, foram registrados 187 acidentes, o maior número desde 1992, quando foram registrados 141.
Já em relação ao número de mortos, com o acidente do Boeing da Gol no dia 29 de setembro de 2006, que caiu em uma fazenda em Peixoto de Azevedo, Mato Grosso foi disparado o Estado com o maior índice. Naquele acidente morreram 154 pessoas. Naquele ano, em todo o país, 215 pessoas morreram.
Em 2007 o número de mortos foi maior ainda, totalizando 270. Somente no acidente do Boeing da TAM, em Congonhas, morrem 199 pessoas. Os dados são da Anac e do Cenipa.