Compras a longo prazo que começam na época das festas de final de ano e se estendem até junho, mês do Dia dos Namorados, movimentam o comércio mas também trazem consigo o outro lado ruim do consumo impulsivo feito, na maioria das vezes, sem planejamento: a inadimplência. Dados do Sistema de Informação e Apoio à Concessão de Crédito (Crediconsult) da Federação das Associações Comerciais de Mato Grosso (Facmat) revelam um aumento de 32% no registro de inadimplência no primeiro semestre de 2009 em comparação com o mesmo período do ano passado. A Facmat congrega 63 associações comerciais em todo o Estado e estes dados trazem as inclusões, exclusões e consultas no comércio varejista em Mato Grosso.
"A Facmat inclui as informações no banco de dados nacional através do Serasa, com quem tem parceria e elas trazem um panorama do grande varejo no Mato Grosso", explicou Manuel Gomes, superintendente da Federação. "O aumento do registro de inadimplentes no estado vai além do produto comercializado que não foi honrado no pagamento, significa ainda que os empresários estão buscando resgatar seu capital de giro".
Nos últimos cinco anos até o dia 30 de junho foram feitos cerca de 464.606 registros de inadimplência que representam R$ 238.724 milhões acumulados do movimento do comércio varejista. De acordo com o superintendente, há uma média de 1.100 registros incluídos diariamente em Mato Grosso. Em valores são cerca de R$ 235 que deixam de entrar no mercado e se acumulam na dívida dos inadimplentes. Manuel Gomes ressalta ainda que os índices de exclusão (pessoas que procuraram honrar seus compromissos) cresceram 8,98% neste primeiro semestre em comparação com o primeiro semestre de 2008. "É um universo ainda muito pequeno em relação à inclusão".
Inadimplência nacional – De acordo com o Indicador Serasa Experian a inadimplência do consumidor cresceu 10,4% entre janeiro e junho em todo o país na comparação com o mesmo período de 2008. O volume de dívidas não pagas, contudo, mostrou sinais de estabilização no fim do primeiro semestre. Os dados do Serasa mostram que a inadimplência perdeu força do primeiro para o segundo trimestre. Entre janeiro e março, houve elevação de 11,4% na comparação com o mesmo período em 2008, ainda refletindo os efeitos da crise. No segundo trimestre, contudo, houve um crescimento menor, de 9,4%.
Carlos Henrique de Almeida, assessor econômico da Serasa Experian, lembra que o nível das dívidas não pagas vinha aumentando antes da crise financeira internacional e se intensificou depois dela. "A forte expansão do crédito fez crescer o endividamento dos consumidores. Quando a crise começou, a inadimplência já era alta". Por outro lado, o abalo econômico-financeiro mundial provocou retração no crédito interno e isso contribuiu para um crescimento menor da inadimplência. Essa perda de fôlego ao longo do semestre é demonstrada pela variação mensal no Indicador Serasa Experian, que registrou queda de 2,1% em junho, ante maio. Na análise anual (junho de 2009 ante junho de 2008), a inadimplência das pessoas físicas aumentou 11%. A expectativa para o segundo semestre é queda na inadimplência, em decorrência das melhores condições da atividade econômica e do emprego.
Ranking – Na análise da inadimplência por segmento, bancos e cartões de crédito continuam a liderar o ranking de contas a receber. No primeiro semestre de 2009, as dívidas com bancos representaram 43,9% do Indicador Serasa Experian, ante 43,2% no mesmo período em 2008. Em seguida vêm cartões de crédito e financeiras, que representaram 36,8% da inadimplência das pessoas físicas, ante 32% na mesma comparação. Os cheques sem fundos aparecem na terceira colocação do ranking, com 17,5% de participação no período de janeiro a junho de 2009, abaixo dos 22,5% verificados no primeiro semestre do ano anterior.
Menos compras – Dívidas fora de controle que comprometem parte do orçamento durante um bom período do ano costumam refletir em retração nas compras o que pode ser observado no banco de dados do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) da Câmara de Dirigentes Lojistas de Cuiabá (CDL-Cuiabá). No comparativo entre os seis primeiros meses de 2009 e o mesmo período de 2008 houve um percentual negativo de 13,39%. De acordo com o presidente da entidade, José Alberto Vieira de Aguiar, a queda foi seqüencial em praticamente todos os meses deste ano, inclusive em algumas datas comemorativas importantes, a exemplo do Dia das Mães que apontou decréscimo de 3, 61% em relação a 2008.
O número de consultas ao SPC em junho deste ano comparado ao mesmo mês do ano passado pontuou menos 16,52%. Mas, ainda que o fechamento mês a mês tenha sido negativo, algumas melhoras sazonais foram observadas indicando aumento nas vendas do comércio varejista. "O Dia dos Namorados deste ano teve crescimento no número de consultas ao SPC/CDL Cuiabá de 8,95% e o comparativo de consultas entre os meses de maio e abril deste ano apontou incremento de 14,6% em maio".
No país o número de consultas aos 2.200 serviços centrais de proteção ao crédito (SCPCs) aumentou 0,5% em junho de 2009 em comparação com o mês anterior. Segundo a pesquisa Índice SCPC Nacional de Proteção ao Crédito da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), foi o segundo mês consecutivo em que se registrou aumento nas consultas. Na comparação com junho do ano passado, houve queda de 18,7%. No semestre, o número de consultas diminuiu 16% em todo o país.
"A crise no crédito foi forte, mas, nos últimos dois meses, começou a recuperação e a tendência é continuar nessa trajetória.com aumento das vendas no varejo", ressaltou Marcel Solimeo, economista da ACSP. Ele reforçou que o crescimento registrado em junho não é pequeno quando comparado ao mês anterior, porque há vários fatores que influenciam as vendas como feriados prolongados. A tendência de recuperação está atrelada à recuperação do crédito, aos prazos mais longos voltando ao mercado e a melhoria do emprego.
Planejamento – "Um bom consumidor tem que fazer sempre uma análise, um planejamento da renda disponível. É preciso ter em mente o que ganha, o que gasta com as despesas diárias e mensais e apenas 30% do que sobrar devem ser utilizados em gastos supérfluos. O restante deve ser guardado como uma forma de precaução", ensinou o economista Aurelino Levy Dias de Campos. Nas compras a prazo ele ressalta a necessidade de pesquisar preços, conhecer os valores do produto (à vista e parcelado) e pechinchar sempre. Segundo ele, quanto maior o número de prestações, maiores os riscos de se tornar inadimplente.
Excluir o nome da lista de cadastro de negativado não é tão simples, tudo vai depender do mérito da inclusão. "Se o consumidor realmente foi negativado por dívida contraída e foi notificado com a devida antecedência da existência dessa dívida, a saída para exclusão do nome e o pagamento da mesma. Se ele não reconhece a dívida, foi vítima de fraude ou ela já está paga, deve notificar a empresa que inseriu o nome e dar cinco dias pra exclusão. Caso isso não aconteça pode procurar a Justiça para ação de exclusão do nome e indenização por danos morais", informou o presidente do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), Geraldo Tardin.
Bons pagadores – Outras pesquisas do movimento do comércio varejista atestam que as pessoas têm procurado excluir as pendências e resgatar o crédito. Dados da Facmat mostram que há uma média de 19,3% de resgates a cada 30 dias. A cada 60 dias este índice sobe para 26,5% e chega a 44,8% em um ano. "Se não resgatar os créditos a pessoa não pode continuar comprando. Já a consulta é a ferramenta prévia que o empresário tem de se prevenir contra a inadimplência", informou Manuel Gomes.
Segundo ele, as consultas ao banco de dados do Crediconsult vêm tendo acréscimos na ordem de 9,63% de 2008 para 2009. "A quantidade de consultas realizadas não reflete diretamente o aumento nas vendas, mas sim oportunidades de crédito".