A escalada do dólar ontem mostrou que a crise que assola o mercado financeiro nas últimas duas semanas ainda não acabou. O dólar subiu 4,71%, maior alta diária desde setembro de 2002, e foi a R$ 2,40.
A moeda americana não valia tanto diante do real desde agosto de 2005. Como o cenário ainda carrega muitas dúvidas, ninguém se arrisca a afirmar até onde a cotação pode ir. Desde o dia 10, quando o humor do mercado internacional começou a azedar, o dólar acumula valorização de 16,45%.
Nesse cenário de incertezas internas e externas, o câmbio é quem mais tem sofrido pressão. Compra de dólares por parte de estrangeiros que têm vendido suas ações na Bolsa tem tido peso importante na depreciação do real nos últimos dias. Junto a isso, investidores estrangeiros têm enxugado suas posições vendidas em dólar no mercado local e externo.
Por aqui, isso é verificado nos números que mostram o tamanho da posição vendida em dólar dos estrangeiros na BM&F (Bolsa de Mercadorias & Futuros). A diminuição dessa posição indica que os investidores passaram a acreditar menos na possibilidade de o real se valorizar. E vice-versa.
No começo de março, quando o real parecia não ter limites para se valorizar diante do dólar, as posições vendidas líquidas dos estrangeiros alcançaram US$ 13,76 bilhões. Na última segunda-feira, com a mudança brusca nas expectativas, essa cifra havia sido reduzida para US$ 5,75 bilhões.
“No curto prazo, o dólar tem tudo para testar um patamar acima do de hoje [ontem]”, diz Adauto Lima, economista do banco WestLB.
A grande preocupação do mercado se relaciona às futuras decisões do Fed (o banco central dos Estados Unidos). Analistas e investidores passaram a considerar que são expressivas as chances de o Fed seguir elevando os juros básicos americanos, que estão em 5% ao ano.
Ontem as operações no mercado internacional oscilaram devido aos dados sobre moradia e bens duráveis divulgados nos EUA, que não deram sinais claros aos investidores sobre o futuro dos juros no país.
Como a próxima reunião do Fed só acontecerá daqui a um mês, as próximas semanas tendem ainda a ser de grande volatilidade no mercado.
Os investidores estrangeiros nos últimos dias estão se desfazendo de ativos –ações, moeda e títulos da dívida– de emergentes para comprar papéis do Tesouro dos EUA, que têm passado a pagar taxas mais elevadas, como reflexo da expectativa de alta dos juros básicos americanos.
“O dólar a R$ 2,40 mostra desespero, um está indo atrás do outro, correndo para comprar moeda”, afirma João Medeiros, diretor de câmbio da corretora Pionner.
A equipe econômica do governo previa que um processo prolongado de alta dos juros americanos poderia levar o dólar a uma cotação entre R$ 2,30 e R$ 2,40 –mas o teto dessa projeção já foi atingido nos negócios de ontem.
Com o dólar nesse patamar, analistas começaram a discutir a hipótese de o Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) decidir manter a taxa básica inalterada, nos atuais 15,75%, em sua reunião na próxima semana. O dólar mais alto encarece as importações, elevando preços no Brasil.
“O dólar nesse nível diminuiu o grau de liberdade do Banco Central para definir a taxa básica”, diz Lima.
“Os exportadores estão segurando seus dólares, atentos à evolução do câmbio. Mas ainda é cedo para afirmar se a moeda vai seguir nesse nível”, diz Mário Battistel, diretor de câmbio da corretora Novação.