As montadores e os revendedores festejam o melhor 1º trimestre da História, em produção e vendas de veículos. Fica cada vez pior encontrar lugar para estacionar e para circular. Vaga não se encontra mais, em cidade alguma deste país, grande ou pequena. E a circulação está devagar, quase parando. Estar num carro é um exercício de paciência e um desafio para as coronárias. Ainda nesse feriadão de semana santa, o que se viu na ida e na volta, em grandes metrópoles, foram variantes de gigantescos congestionamentos, que alguns chamam estranhamente de trânsito – embora um engarrafamento seja justamente a inexistência de trânsito. Isso sem falar das chuvas, que paralisam as grandes cidades.
São Paulo é o retrato do que serão as demais metrópoles em breve tempo. Já eliminei a capital paulista de minha agenda de palestra, ainda que a maior parte do faturamento com essa atividade venha de lá. É que nunca se sabe se a gente vai chegar no horário ou vai conseguir voltar, quando se está numa marginal ou na Rubem Berta. Outro dia, no Rio, levei mais tempo para ir do Santos Dumont a Niterói do que na viagem de Brasília ao Santos Dumont – e não chovia. Em Porto Alegre, a dificuldade é sair dirigindo do aeroporto. Construíram um malsinado labirinto mal sinalizado para deixar o recém-chegado enlouquecido e sem vontade de seguir adiante. Em Brasília, que há 50 anos Lúcio Costa se gabava de ter planejado uma cidade sem cruzamentos nem semáforos, o inferno está estabelecido. Existe um carro para cada dois habitantes – 1 milhão e 300 mil carros – e não há mais lugar para estacionar. Então, estacionam nas vias de rolamento e impedem o restante de circular.
A maldição contra os motorizados não pára por aqui. Estão emitindo carteiras de habilitação como se imprimem jornais. E as pessoas sentam atrás do volante sem saber bem o que estão fazendo lá. Quando vou para a Globo ainda no lusco-fusco da madrugada, sou surpreendido por dezenas de fantasmas circulando. Carros com os faróis apagados, porque o condutor não tem a menor noção de que os faróis servem para o carro ser visto. Depois, tem o motorista que põe o braço para fora. Não é que ele queira sinalizar conversão à esquerda. Quer apenas refrescar o braço – não importa se vai ser ferido por um pedrisco jogado pelos pneus do carro em frente ou ferroado por alguma vespa assustada que se choque no carnudo obstáculo. Muitos trafegam com as luzes de estacionamento ligadas, indicando que estão parados; outros, sem neblina pesada, acendem os faróis auxiliares, ofuscando todo mundo, pela frente ou por trás.
Nas cidades civilizadas, pouca gente usa o automóvel, a não ser para passeio. Para ir ao trabalho, ou ao teatro, é o metrô ou o ônibus; os mais abonados vão de táxi. Aqui, no país emergente, os emergentes fazem questão de serem vistos dentro de um carro, por antiquado que seja. Reconheço que alguns nem querem ser vistos: usam a tal película proibida, que escurece tudo. Quando estou para entrar numa preferencial e um desses pára a meu lado, fico perdido, porque não consigo enxergar através dos vidros do carro dele e fico sem visão para tentar qualquer manobra. E o Detran não tira de circulação esse fulaninho egoísta. Alíás, como desejo ver fora de circulação o surdo que anda com altofalantes a todo volume, reproduzindo sons de virabrequim quebrado!