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Ter ou não ter

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No Brasil, não tem asilo os médicos cubanos; mas tem asilo Césare Battisti; tem e não tem asilo o senador boliviano. É um país esquizofrênico: no dia em que 1.771 médicos formados no exterior são submetidos a prova para revalidar o diploma, começam a chegar 4000 cubanos e outros estrangeiros do Mais Médicos, que não vão precisar fazer a prova mas, mesmo assim, podem tratar de pacientes brasileiros.

Se vieram com a intenção de escapar para a liberdade, os cubanos não terão asilo. O chefe da advocacia do governo disse que serão devolvidos, como foram os boxeadores do pan-americano. A fiscalização do trabalho fecharia empresa locadora de mão-de-obra que ficasse com 70% do salário do trabalhador no Brasil, mas o governo brasileiro não se importa de pagar o trabalho dos cubanos para a ditadura de Havana, através de uma coreografia que passa pela Organização Panamericana de Saúde. A lei brasileira considera trabalho escravo se o trabalhador não recebe salário integral, tem seus passos e horários de descanso limitados e é privado de direitos. Pobres cubanos! 54 anos de ausência de direitos, que vigoram até dentro das fronteiras brasileiras. "Existe um povo que a bandeira empresta/para cobrir tanta infâmia e covardia"(Castro Alves em Navio Negreiro).

Mas Césare Battisti, condenado na Itália por quatro homicídios em tribunais democráticos e em todas as instâncias, que teve asilo negado até na França, tradicional acolhedora de perseguidos políticos, permanece asilado no Brasil, mesmo depois de comprovado que entrou no país por falsificação em passaporte. Foi condenado pelo art 296 do Código Penal. Cometeu crime comum no Brasil. Faz dois meses que o Superior Tribunal de Justiça confirmou a condenação e oficiou ao governo brasileiro para enquadrá-lo no Estatuto do Estrangeiro, art 65, que prevê a expulsão de quem praticar fraude para obter a entrada ou permanência no país. Até agora, nada.

Nos últimos 15 meses, um senador boliviano estava asilado na embaixada do Brasil em La Paz. Não podia sair, porque o governo de Evo Morales não lhe dava salvo-conduto. Roger Molina se diz perseguido político; o governo boliviano diz que ele é um corrupto. Não tendo a mesma liberdade de Zelaia, de fazer da embaixada seu escritório político, o senador lá ficou, como numa prisão. O governo brasileiro nunca teve atitude com Evo Morales, que invadiu com soldados instalações da Petrobrás e ficou por isso mesmo. O embaixador interino, Eduardo Saboia, o mesmo que cuidou dos corinthianos presos, tomou a iniciativa e levou, escondido, o Senador até Corumbá. Uma aventura fora da lei, que poderia acabar mal. Não se sabe se o Itamaraty sabia mas não teve coragem de assumir a operação – talvez inspirada no filme Argo. O ministro Antônio Patriota teve a hombridade de assumir a responsabilidade e entregou o cargo para a presidente, que estava irritada por ter sido a última a saber. O advogado do governo já havia comunicado à presidente, em junho, da inconveniência de conceder asilo ao senador Molina. O embaixador interino explicou que foi uma ação humanitária. A ministra dos Direitos Humanos não se manifestou.

Percebe-se nesses três episódios que ideologia é mais forte que a lei. Quando isso acontece, não funciona a democracia nem o princípio de que todos são iguais perante a lei. Nos médicos, a desigualdade vem em dobro: a uns se exige a revalidadação do diploma; a outros, não. Uns recebem 10 mil; outros as sobras de uma ditadura. Quanto ao asilo, uns têm, outros não têm.

 

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