A Lei Magnitsky disparou em Brasília uma desenfreada sina que confirma a sabedoria da voz do povo de que “aqui se faz, aqui se paga”. E com a mesma moeda. Contra a aplicação da Lei e a suspensão dos vistos, não há a quem recorrer, a não ser a quem as aplicou. Tal como sentem os que deveriam estar na primeira instância da Justiça, e foram incluídas em inquérito na última instância, à revelia da cláusula pétrea que exige o juízo natural. E quando a Magnitsky se mostra apta a se estender à família do sancionado, não há como não lembrar a ameaça ao TC Mauro Cid, de que se não falar, o inquérito atingiria seu pai, sua mulher, sua filha maior. Na Magnitsky não houve devido processo legal nem amplo direito de defesa; o Departamento de Tesouro e o de Estado fizeram os inquéritos e aplicaram as penas. Aqui, cumprem um rito, misturando polícia, promotoria e juiz – com o mesmo resultado. Em ambos os países, o motivo é político. Um, defende a liberdade de expressão; o outro, diz ter salvado a democracia, embora tenha afogado a Constituição nas águas do arbítrio.
A Lei, sancionada por Obama, foi motivada pelo advogado russo Sergei Magnitsky, que foi preso, torturado e morreu na prisão. Serve para punir estrangeiros que fazem perseguições semelhantes. Aqui, o advogado Filipe Martins foi preso e posto em solitária para arrancar dele delação que justifique acusar Bolsonaro de golpista. Resistiu. Sofrendo pressão que Gilmar Mendes, há dois anos, chamou de “tortura”, Mauro Cid assinou colaboração premiada. Daniel Silveira está sendo tratado igual a um refém do Hamas. E, como Sergei, Clezão morreu na prisão, a despeito de pedidos da Procuradoria para ser tratado em casa. Sergei Magnisty denunciou corrupção no regime de Putin; aqui, são presos ou estão com tornozeleira os que criticam a apuração de eleições ou o “inquérito do fim do mundo”. Temos, pois, aqui, semelhanças a nos mostrar o por quê da aplicação da Lei em autoridades brasileiras.
Ministros do Supremo foram traídos pelos áulicos, com seus enganadores aplausos na mídia e nos auditórios; mais realistas foram os críticos. Houve até próximos, mostrando o caminho, como Marco Aurélio, Fux, André Mendonça. Não quiseram o caminho da mais inteligente das virtudes, a humildade que, na hipótese mais branda, indicaria anular o inquérito que começou sem Ministério Público e já tem seis anos, e mandar os do 8 de janeiro para a primeira instância, onde ações criminosas podem ser individualizadas, e aplicar a devida punição aos que vandalizaram o patrimônio público. Danos colaterais: a Magnitsky em Moraes pode arrastar seus apoiadores no Supremo. E, nas ruas, o grito “Fora Moraes” levou de reboque o “Fora Lula”. Agora Moraes avançou mais um passo, com a prisão domiciliar de Bolsonaro; pode provocar mais passos da Lei Magnistsky sobre seus apoiadores no Supremo.
A Lei Magnitsky não vai corrigir a crise de erros institucionais, porque isso cabe aos brasileiros; mas sacudiu de tal forma as responsabilidades e os brios, que até o medo imposto pelas prisões políticas foi varrido pelo vento norte e o povo saiu às ruas no domingo em quase todas as cidades brasileiras. No dia da prisão domiciliar, saiu de casa à noite em Brasília para se manifestar no grande centro cívico da Esplanada. Quis o destino – a sina – que a Cortina de Ferro soviética, foi rasgada por Ronald Reagan, republicano como Trump, que quer rasgar uma cortina cor de toga, que baixou sobre a boca dos brasileiros do Caburaí ao Chuí.