Produtos mais valorizados no mercado externo e baratos para o consumidor local são realidades possíveis de equilibrar com a industrialização. Em Mato Grosso, a verticalização em algumas atividades econômicas apruma rápido. É o que se vê com a cadeia produtiva do milho, demonstrada nesta 2ª reportagem sobre a industrialização no Estado. A cada safra, a produção do cereal se aproxima mais da quantidade colhida de soja.
O que persiste é a diferença nos preços entre os 2 produtos. É comum no auge da colheita no Estado a cotação do milho se situar abaixo do valor mínimo (R$ 16,50/60 kg) estabelecido pelo governo federal. Falta de espaço para estocar o produto é outro problema, já que a colheita do milho sucede a da soja. A combinação preço baixo e frete caro para escoar o cereal por extensas distâncias até os portos favorece a industrialização da produção. Gradualmente volumes cada vez maiores do cereal são destinados às indústrias locais produtoras de etanol.
Na última safra (2016/2017) foram produzidas 30,451 milhões de toneladas de milho e 31,271 milhões (t) de soja, segundo o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea). Para a safra atual, o Imea indica colheita de 25,905 milhões (t) de milho e 31,789 milhões (t) de soja. Enquanto as lavouras batem recordes de produtividade, o preço do produto despenca no pico da colheita. Em meados de 2017 o preço do milho ficou abaixo de R$ 11 (saca de 60 kg), após alcançar cotação inédita de R$ 35 em 2016 devido à quebra de safra em várias regiões produtoras do país por falta de chuva.
A solução apontada por produtores e representantes de entidades ligadas ao setor produtivo é agregar valor ao grão, transformando-o em outros produtos. Por isso, cada vez mais o milho em grão é convertido em etanol. Este ano, o mercado de combustíveis terá adição de 200 milhões de litros de etanol de milho que poderão ser comercializados para fora do Estado, segundo o secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico (Sedec), Carlos Avalone.
No ano que vem, o volume aumenta para 600 milhões (l), que poderão ser destinados a outros mercados consumidores. Na safra 2016/2017, a produção total de etanol no Estado alcançou 1,078 bilhão de litros, incluindo 137,8 milhões (l) do biocombustível derivado de milho, conforme dados do Sindicato das Indústrias Sucroalcooleiras de Mato Grosso (Sindálcool).
Durante o último ano foram comercializados 674,442 milhões (l) de etanol hidratado em Mato Grosso, segundo a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Além do biocombustível, o resíduo vegetal proveniente do milho pode ser convertido em biomassa para geração de energia, observa o vice-presidente da Associação Brasileira de Produtores de Milho (Abramilho), Glauber Silveira. De acordo com ele, mais da metade da produção do grão em Mato Grosso foi direcionada ao mercado internacional.
Conforme dados do Imea, coletados junto ao Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic), foram embarcadas 18,275 milhões (t) de milho em 2017, volume equivalente a 60% da produção total de 30,451 milhões (t). Silveira afirma que em 2018 o Brasil importará 8 bilhões de litros de gasolina e no prazo máximo de 6 anos terá um deficit de 10 bilhões de litros de etanol. Outro estímulo à produção de etanol de milho, segundo ele, é o custo de produção, por ser mais barato que a fabricação do biocombustível derivado da cana-de-açúcar. “Fazer uma lavoura de cana custa mais caro que de milho”.
Silveira menciona estudos que atestam rápido retorno aos empreendedores que investem na produção de etanol derivado do cereal. “Hoje já tem indústria com rentabilidade grande. O Imea fez cálculos que mostraram o retorno rápido, em torno de 4 anos”. Ele lembra que investidores de indústrias recém-inauguradas já falam em duplicar a produção, como é o caso da FS Bionergia, em Lucas do Rio Verde (a 334 km de Cuiabá). “Isso mostra que tem viabilidade e gera oportunidades”.
Primeira usina especializada na produção de etanol exclusivamente à base de milho, a FS Bionergia produz 240 milhões (l) de etanol. Formada pela junção da norte-americana Summit Agricultural Group e da mato-grossense Fiagril, a companha prevê expandir a capacidade para atingir o dobro do volume de produção. Numa projeção audaciosa, o vice-presidente da Abramilho opina que as usinas sucroalcooleiras se tornarão “usinas flex”, tanto em Mato Grosso quanto em São Paulo, líder na produção sucroalcooleira. “Tem sobrado biomassa e os mercados do etanol e energia são grandes. Acredito que a produção de etanol de milho será uma grande explosão no Brasil”.
Além da planta da FS Bionergia, outras 4 indústrias estão em instalação nos municípios de Sinop, Nova Mutum, Diamantino e Campo Novo do Parecis, afirma o diretor do Sindálcool/MT, Jorge dos Santos. Atualmente a atividade sucroalcooleira em Mato Grosso é representada por 11 indústrias, sendo 10 produtoras de açúcar e 3 de etanol, que combinam cana e milho na produção do biocombustível. Apenas uma mantém produção de etanol exclusivamente a base de milho, que é a FS Bionergia. Nesse formato, mais 4 estão a caminho”, pontua Santos.
Ele confirma que o custo de produção sucroalcooleira é alto e o que setor enfrenta barreiras na legislação ambiental e na falta de crédito para expandir os canaviais. Cada hectare plantado custa R$ 7 mil. As indústrias ainda tentam se reerguer de uma crise que se arrastou por quase 6 anos. Para o executivo do sindicato das indústrias, o setor carece de alguma proteção por sua importância econômica. Gera 10 mil empregos diretos e 40 mil indiretos. “O impacto do etanol já foi bem sensível este ano. Foram processadas 700 mil toneladas de milho (para etanol) até 31 de janeiro. A safra se encerra em 31 de março”.
De acordo com o secretário da Sedec, Carlos Avalone, as indústrias produtoras de etanol de milho receberam ou estão com pedido de incentivo fiscal em processo de análise pelo governo. A concessão do benefício pode ser parcial ou integral e é garantida com base em algumas condições, explica ele. “Em 1º lugar tem fruição parcial do Prodeic, para compra de equipamentos e máquinas fora do Estado. Neste caso não pagam o diferencial de alíquota de ICMS”, detalha.
Ele explica que se o equipamento for comprado em São Paulo, por exemplo, o investidor pagará 7% de ICMS para o governo paulista. Quando o equipamento ultrapassar a fronteira mato-grossense, deverá ser recolhido 10% na barreira fiscal, mas a alíquota não será cobrada da empresa incentivada. “Essa é a 1ª parte do incentivo. Depois, quando termina a construção da indústria e vai começar a operar na produção de etanol de milho tem redução na base de cálculo”.
Avalone lembra que 90% do etanol mato-grossense são comercializados internamente, com redução na base de cálculo. A política tributária aplicada ao etanol em Mato Grosso permite que o biocombustível se mantenha como o mais barato do Brasil, conclui Avalone.