O revés no mercado de carne bovina, com a suspensão das importações do produto in natura pelos Estados Unidos, tende a ser superado apenas em 2019. Consultores econômicos avaliam que esta nova crise sobre a cadeia produtiva contribui para pressionar para baixo os preços da arroba do boi. Para a indústria, o reflexo pode ser de limitação na oferta de animais para o abate e o aumento na ociosidade. Consequentemente, cresce o endividamento de criadores e das indústrias.
Um novo embargo à carne bovina brasileira foi anunciado na quinta-feira (22) pelo governo norte-americano, após o próprio Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) suspender cautelarmente as exportações de 5 dos 13 frigoríficos brasileiros habilitados para as vendas. Dos 5 suspensos, 1 está em Mato Grosso, localizado em Paranatinga (a 373 km de Cuiabá) e pertencente à Marfrig. Outras duas plantas frigoríficas da empresa foram atingidas, sendo uma em São Gabriel (RS) e outra em Promissão (SP). Também foram suspensas temporariamente as exportações dos frigoríficos JBS, em Campo Grande (MS), e Minerva, em Palmeiras de Goiás (GO).
Na lista dos 15 frigoríficos suspensos, mais 1 está em solo mato-grossense, na cidade de Barra do Garças, pertencente à JBS. A decisão foi tomada após o Serviço de Inspeção Sanitária dos Estados Unidos emitir documento no dia 14 de junho com relatos de não conformidades constatadas em reinspeção de produtos desses frigoríficos. Ao realizar a amostragem de contêineres contendo a carne brasileira foram apontadas como inconformidades a presença de fragmento de osso em carne desossada, coágulo sanguíneo na carne e abscesso.
O “caroço” ocasionado provavelmente por vacina contra febre aftosa só não é retirado no abate se for profundo na musculatura, como esclarece a Superintendência do Mapa em Mato Grosso. Estudo realizado pela consultoria TCP Latam, divulgado nesta sexta-feira, aponta os desafios enfrentados pela cadeia industrial de carne bovina desde as Operações da Polícia Federal (PF), em referência à Carne Fraca e à Lava Jato, que implicaram o maior grupo frigorífico do mundo, a JBS. Toda a cadeia da carne foi afetada devido à concentração do mercado frigorífico, aponta a consultoria.
De conversas travadas com pecuaristas, frigoríficos, transportadores, curtumes e fabricantes de insumos como ração e medicamentos, a TCP Latam concluiu que tanto indústrias quanto pecuaristas se deparam com o crescimento do endividamento. Neste cenário, o crédito reduz, a inadimplência acelera, as recuperações judiciais aumentam, a ociosidade dos frigoríficos sobe e o preço da arroba do gado retrai.
Conforme o diretor de Investimentos e de Estudos Econômicos da TCP Latam, Ricardo Jacomassi, em condições normais para esta época do ano a arroba do boi gordo deveria estar acima de R$ 135, mas atualmente chega a R$ 115. “Os pecuaristas estão numa fase de fazer o escoamento do gado, a saída do boi velho para dar entrada ao novo. Jacomassi questiona qual será a capacidade da indústria de superar as dificuldades financeiras nos próximos meses.
Na avaliação do vice-presidente do Sindicato das Indústrias Frigoríficas de Mato Grosso (Sindifrigo), Paulo Bellincanta, o setor se depara com uma sucessão de obstáculos. O atual embargo adotado pelos Estados Unidos não poderá ser compensado com a inserção de mais produtos em outros mercados, por exemplo. “(A exportação) Não era muita, ainda, mas muito significativa. Foi uma das barreiras mais longas para ser derrubada e a expectativa era muito boa a médio prazo”. Contudo, ele considera que não há risco de outros países seguirem essa linha do governo norte-americano e tentarem retaliações.
De acordo com Jacomassi, a cadeia produtiva de carnes vai levar pelo menos 18 meses para se reestruturar. A reordenação da atividade demandará esforços privados e públicos, como uma política de fomento para os pequenos e médios frigoríficos, avalia. Profissionalização da gestão, regras de transparência e compliance, além de reestruturação operacional e financeira são medidas que podem ser adotadas para auxiliar na retomada sustentável do crescimento do setor.
Para tentar reverter o embargo norte-americano à carne brasileira após 10 meses de retomada deste mercado, considerado uma “vitrine” para o produto brasileiro, o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, afirmou que irá aos Estados Unidos na próxima semana. “Assim quando comemoramos a liberação da nossa carne para exportação aos EUA (após 17 anos de negociações), (…) lamentamos o embargo temporário de 13 plantas brasileiras – sendo que preventivamente já havíamos suspendido 5 delas -, que estavam habilitadas para o país norteamericano”, declarou o ministro, por meio de redes sociais.
“Então, quero tranquilizar a todos que continuaremos lutando por essa importante fatia do mercado, com toda atenção que o assunto merece. Iremos visitá-los para prestar todos os esclarecimentos necessários”, complementou. Ele observa que o Brasil é o maior concorrente mundial dos EUA no comércio de carne bovina. O ministro assegurou que todas as medidas corretivas para atender as exigências que os norte-americanos fazem já estão sendo tomadas. Segundo ele, o objetivo continua o mesmo: garantir o mercado existente e ampliar as exportações de 7% para 10% num período de 5 anos.
Mato Grosso comercializou 2,135 mil toneladas de carne bovina aos Estados Unidos entre janeiro e maio. A retomada das vendas desde agosto de 2016, realizada por 2 frigoríficos do Estado habilitados pelo Mapa, gerou uma receita comercial de US$ 8,693 milhões, o dobro do faturamento registrado há 18 anos. Antes dos norte-americanos restringirem a entrada da proteína bovina no país pela 1ª vez, há 17 anos, Mato Grosso chegou a exportar, no mesmo intervalo de 5 meses, volume equivalente a 1,961 mil toneladas pela quantia total de US$ 4,933 milhões.
Os valores são referentes ao ano de 1999 e apurados na plataforma eletrônica Agrostat do Mapa, que disponibiliza estatísticas do comércio exterior do agronegócio.