Escrevo estas linhas entre uma xícara de café esfriando e o rascunho de um cardápio. A vida, percebo aos poucos, se parece muito com uma cozinha — ingredientes doces e amargos, temperos que curam e outros que ardem. Hoje quero compartilhar uma receita que venho elaborando na quietude dos meus dias: o alimento da cura.
Por muito tempo esperei desculpas que nunca chegaram, como quem aguarda uma sobremesa que não sai do forno. Ficava diante do vazio, ouvindo o eco do silêncio onde deveriam existir palavras. Até que entendi: algumas chuvas simplesmente não molham a terra seca, e insistir na sede é desperdiçar a água que carregamos dentro de nós.
Aprendi, na marra, que nem todos servem o amor no mesmo prato que nós. Oferecíamos vinho fino em taças de cristal e recebíamos de volta em copos descartáveis. Mas eis o segredo: a falta de educação alheia não precisa manchar nossa toalha de linho. Podemos continuar servindo a vida com a elegância que nos é própria.
Ah, as promessas… Receitas mágicas que nunca saíam do papel. Palavras lançadas ao vento como ervas que nunca temperaram o caldo. E os adeuses sem despedida — esses deixam um gosto amargo peculiar, como alimento estragado que precisamos cuspir para não adoecer.
Mas um dia, diante de panelas e temperos, entendi a verdade mais sábia: quem nos feriu não será o chef da nossa recuperação. Muitas vezes, eles nem sabem o sabor amargo que deixaram em nosso paladar emocional. A cura, essa receita secreta, precisamos cozinhar nós mesmos.
E que descoberta libertadora! Curar-se não é apagar memórias, mas transformar cicatrizes em novos temperos para a alma. A força não está em nunca se queimar no forno da vida, mas em aprender a usar as luvas da experiência.
Hoje sei que a cura tem o sabor da autenticidade. É um prato único, preparado com os ingredientes do autorespeito, o tempero do perdão próprio e o molho especial da reconstrução.
E ao final do banquete, descobrimos o mais belo dos sabores: o de renascer inteiros, luminosos, com cada experiência transformada em receita de coragem. Porque a vida, meus amigos, é a mais sábia das cozinheiras: depois de todo amargor, sempre nos serve a chance de um novo sabor.