Após a denúncia do Felca, fui em busca de uma definição do neologismo adultização, pois o verbete ainda não está em dicionário nem no corretor digital. Seria um eufemismo para pedofilia? Depois da prisão de um certo Hytalo Santos, encontrei, no caderno de Direto & Justiça, do Correio Brasiliense, conceito de João Ataíde, especialista em direito digital: Expor ou induzir crianças e adolescentes a papéis próprios do mundo adulto, muitas vezes de caráter sexualizado. Isso se manifesta nas redes sociais por meio de roupas ou poses erotizadas, coreografias com conotação sexual, induzindo menores para o mundo adulto. Essa última parte me despertou a memória. Por que só redes sociais? A verdade é mais ampla: “nas redes sociais e TV”. Sim, na televisão – e muito antes de existir rede social. Lembro do programa “infantil” da Xuxa, que começou na TV Manchete, em 1983.
O vice-presidente da Manchete, o Jakito, me contou que fora assistir à gravação do programa e viu a apresentadora enroscando-se num lápis fálico e dizendo às crianças que ele é todo redondinho, durinho… Jakito suspendeu a gravação e Xuxa foi chamada pela Globo. Lá, se tornou “A Rainha dos Baixinhos”. O que é um baixinho? Baixinho não é uma criança, mas um adulto de pouca estatura. O título já era revelador. Um bispo do Rio alegou que deseducava crianças. Xuxa respondeu que não viera para educar, mas para divertir. O sucesso do Xou da Xuxa estimulou animadoras similares em outras emissoras. E fez nova moda infantil.
Minha mulher e eu passeávamos numa praça em Bilbao, em 2008, quando ela notou algo diferente nas meninas. “Agora percebi: elas estão vestidas como meninas; não como adultas sensuais, como virou hábito no Brasil”. Eu era editor regional da Globo em Brasília, e um ex-segurança da Presidência me procurou, com fotos sensuais de sua filha de uns 10 anos. Queria que eu a recomendasse para a produção do Xou. Fui até rude com ele e não vou registrar aqui a resposta que lhe dei. A adultização ainda não tinha ganhado nome, mas já existia e se expandia. Malhação começou em 1995, adultizando adolescentes, segundo tenho ouvido, porque nunca vi a série. Cartilhas de Secretarias de Educação e do próprio MEC avançaram em assuntos que deveriam ficar a critério dos pais e a precocidade foi baixando para aquém da adolescência. Com isso, problemas de idade adulta passaram a afligir crianças e adolescentes.
As escolas fizeram sua parte. Certo dia, há uns dez anos, minha mulher não conseguia ouvir as pacientes no posto de saúde ao lado de uma escola pública, por causa de grande algazarra. Foi então saber o que acontecia. Os meninos estavam vestidos de menina e as meninas com roupa masculina. Minha mulher fotografou e a diretora da escola exigiu que fossem apagadas as fotos, reconhecendo que fazia algo não consultado aos pais. Era uma aula prática de introdução à ideologia de gênero – outro dos meios que o marxismo cultural usa para enfraquecer os valores da cultura ocidental, covardemente usando crianças. E é bom lembrar o óbvio: a proteção principal das crianças é em casa, na família.
Passaram-se 40 anos até se descobrir a adultização que rouba os encantos naturais do amadurecimento lento, gradual e seguro. Denúncias de Damares e Antônia Fontenelle caíram no vazio da mídia. Mas, com o Felca, não mais que de repente surgem projetos-de-lei para proteger a infância. Às pressas, como se fosse para esconder algo mais importante, o chamado ECA Digital foi aprovado na Câmara. Deveria ser ampliado para ECA Eletrônico. A culpa é das redes sociais? Ou é um truque para censurar as redes, como é o sonho do governo? O Estatuto da Criança e do Adolescente já é lei suficiente para isso; o Código Penal tem o art. 218, que pune ato libidinoso com menor e o 232, que sanciona que expuser menores a vexame ou constrangimento. E por que só querem combater “adultização” nas redes sociais, que aprenderam na TV, com a nova cultura já enraizada no Brasil? Enfim, pelo menos se expõe o mal, embora com outros objetivos.